O surgimento dos Estados liberais, que hoje predominam no Ocidente, resgatou uma forma de organização da máquina estatal nascida na Grécia Antiga. Nela, para evitar a concentração de poder nas mãos do governante, a instituição sobre a qual floresceu a civilização foi dividida em Três Poderes. Assim, o poder de um governante, outrora absoluto, recebe uma série de contrapesos para frear possíveis impulsos autoritários e antidemocráticos que podem ameaçar a existência do próprio Estado. No entanto, o perfeito equilíbrio dessa balança é uma utopia e, ao longo da história, ela tem pesado para um dos pratos, em determinados momentos.
Na esteira da transformação pela qual passavam as nações, entre os séculos XVIII e XIX, a figura dos governantes, portanto do Poder Executivo, permaneceu forte. Os reis e imperadores ainda ditavam a história e eram os rostos que representavam seus países. Os primeiros presidentes de recém-fundadas repúblicas começavam a desenhar as plantas de potenciais nações iluministas. Nesta seara, podemos destacar de D. Pedro II a Abraham Lincoln, nos Estados Unidos, passando pela longeva rainha Vitória no Reino Unido e pelo alemão Otto von Bismarck, considerado o maior estadista do século XIX.
No século XX, por outro lado, foi a vez de o Poder Legislativo ganhar força, após a consolidação do Princípio da Legalidade e da importância das leis. Discussões e decisões que moldaram sociedades foram feitas nos parlamentos, para o bem e para o mal. No Brasil, por exemplo, o Congresso exerceu papel fundamental tanto no Golpe de 64, quanto na redemocratização e, em seguida, na formação da Nova República a partir de 1988. Já na Europa, após o declínio do poder dos reis e o fim de ditaduras, novos governos parlamentaristas emergiram em diversos países. Deputados e senadores ascenderam midiaticamente, seus rostos e vozes passaram a ocupar o horário nobre nos noticiários da televisão.
Fenômeno midiático semelhante parece evidenciar, agora no século XXI, uma pendência da balança dos Três Poderes para o prato do Judiciário. A visibilidade do Judiciário aumentou consideravelmente desde 2012. Esse aumento pode ser creditado ao fato do Poder Judiciário estar lado a lado do Executivo e Legislativo governando o país, decidindo sobre a aplicação das leis e sua validade. Os cidadãos estão mais atentos à atuação da Justiça, principalmente pelo protagonismo que este poder vem tomando nas esferas públicas. O Supremo Tribunal Federal é o melhor exemplo desta tendência, com julgamentos sendo transmitidos e discutidos em tempo real, na TV e na internet, e ministros e juízes angariando admiradores e detratores. As decisões judiciais ganharam ainda mais relevância no ordenamento jurídico brasileiro, fazendo com que o estudo dos precedentes se torne obrigatório para qualquer operador, de todas as áreas do Direito.
Na área tributária, esta análise do passado é ainda mais importante, dado o tempo em que vigora a legislação atual: nosso Código Tributário Nacional foi aprovado ainda nos anos 1960, no governo Castelo Branco. Apesar das inúmeras alterações que o Congresso aprovou desde então para modernizar o CTN, não há lei complementar que evite por completo sua caducidade. Mais de meio século tornaram-no defasado, principalmente, se considerarmos o impacto dos novos meios tecnológicos nas atividades de controle do Fisco. É neste cenário que o Poder Judiciário, por meio de suas decisões, está tentando “adequar” o CTN à realidade do século XXI. As decisões judiciais passam a ter uma relevância enorme no ordenamento jurídico brasileiro e, consequentemente, o estudo dos precedentes se torna obrigatório para todo operador de qualquer área do Direito. O acompanhamento constante dos precedentes é inevitável para o meio jurídico, hoje.
Outro fato que reforça a importância dos precedentes se deve, justamente, à atualização legislativa. O Código de Processo Civil, aprovado em 2015, veio para modernizar a legislação processual que estava em vigor desde 1973. O novo CPC concede ainda mais relevância aos precedentes e sua eficácia vinculante, seja pregando a uniformidade, estabilidade, integridade e coerência da jurisprudência, seja garantindo que juízes a sigam e divulguem os precedentes utilizados em suas decisões. Os precedentes só podem deixar de ser seguidos se forem considerados superados ou houver uma distinção do caso concreto em relação a eles. A elaboração de um novo CTN é necessariamente óbvia, enquanto isso, os precedentes ditam a decisão final.
A existência isolada destes três pilares — fortalecimento do Poder Judiciário, envelhecimento do Código Tributário Nacional e as características do novo Código de Processo Civil — já é suficiente para demonstrar a importância e a atualidade do estudo dos precedentes tributários. Ao somar esses fatores, o resultado se torna ainda mais evidente: não há dúvidas de que o país está caminhando para a construção de uma nova escola de Direito Tributário, na qual o exame aprofundado das decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça terá importância igual – ou até maior – do que a análise da legislação fiscal.
Quem viver verá!
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