O art. 555 do CPC elenca os pedidos provisórios cabíveis nas ações possessórias. Considerando que as ações possessórias de força nova seguem o rito comum após a fase inicial em que se defere ou não a liminar possessória e que as ações de força velha adotam o rito comum desde o início, ou em se tratando de litígio coletivo após a audiência de mediação, temos que outros pedidos de natureza provisória podem ser cumulados com a liminar possessória.
O CPC no art.555 preceitua que, in verbis:
Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos;
II - indenização dos frutos.
Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada para:
I - evitar nova turbação ou esbulho;
II - cumprir-se a tutela provisória ou final.
Dos pedidos elencados no artigo ora comentado verificamos provisoriedade nos constantes no parágrafo único. Ambos se referem a medidas provisórias, isto é, medidas que podem ser tomadas já quando o magistrado analisa e decide o pedido de liminar.
Tereza Arruda Alvim, Maria Lúcia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogério Licastro Torres de Mello esclarecem que são medidas de apoio que visam impedir novos atos de violação da posse:
“Dentre as medidas destinadas a coibição de novos atos de violação da posse e à concretização da tutela provisória ou final concedidas na ação possessória, inclui-se a cominação de multa periódica , em caso de reiteração dos atos lesivos à posse, o desfazimento de modificações lesivas à posse para fins de asseguração do resultado prático da tutela possessória provisória ou final, de modo a se restituir o bem objeto do esbulho ou da turbação ao seu estado anterior à violação da posse , além de quaisquer outras providências que o órgão jurisdicional reputar necessárias, dado que o rol do art.555 do NCPC não é taxativo.1”
Pode o autor fazer uso da faculdade prevista no parágrafo 2º do art.327, o qual preceitua que, in verbis:
Art. 327. É lícita a cumulação, em um único processo, contra o mesmo réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão.
(...)
§ 2º Quando, para cada pedido, corresponder tipo diverso de procedimento, será admitida a cumulação se o autor empregar o procedimento comum, sem prejuízo do emprego das técnicas processuais diferenciadas previstas nos procedimentos especiais a que se sujeitam um ou mais pedidos cumulados, que não forem incompatíveis com as disposições sobre o procedimento comum.
Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery esclarecem que:
“Quando houver previsão de ritos diferentes para as ações que se pretende cumular, será admissível a cumulação desde que o autor opte por imprimir o rito comum a todos eles, renunciando à especialidade de um dos pedidos. Todavia, fica expressamente autorizado pelo CPC o uso de técnicas processuais diferenciadas que façam parte do próprio procedimento especial, desde que não sejam incompatíveis com o procedimento comum.”
Nesse caso pode-se falar em outros pedidos de natureza provisória além da liminar possessória. Humberto Theodoro Junior esclarece que:
“As ações de manutenção e de reintegração de posse variam de rito conforme sejam intentadas dentro de ano e dia da turbação ou esbulho, ou depois de ultrapassado o dito termo. Na primeira hipótese, tem-se a chamada ação possessória de força nova. Na segunda, a de força velha.2”
Note-se que, no que diz respeito à ação de força nova, o rito comum será adotado após a fase em que será decida pela concessão ou não da liminar. Nesse sentido o esclarecimento de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery:
“Isto não se constitui, entretanto, em óbice sério ao nosso alvitre, porque o procedimento especial das ações possessórias ocorre tão somente pela audiência prévia de justificação e a possibilidade de o juiz conceder ou não a liminar.3”
Adroaldo Furtado Fabrício4 faz a mesma observação:
“O procedimento das possessórias é o comum, com a inserção da fase inicial voltada ao trato específico da tutela provisória. Vencida essa etapa, retorna-se ao rito comum.”
O art. 5565 preceitua a aplicação subsidiária do rito ordinário, isto é, no que não for rito especial das possessórias. Vemos dessa forma que na ação de força nova, após a decisão de deferimento ou não da liminar, aplica-se o rito comum. Na ação de força velha aplica-se o rito comum desde o início. Se se tratar de litígio coletivo, após os procedimentos do art. 5656, aplicar-se-á o rito comum.
Dessa forma, uma vez que o procedimento passa a ser disciplinado pelo rito comum, pode-se admitir a concessão da tutela antecipada com fulcro no art. 294 e ss. do CPC, desde que após, a finalização da fase regida pelo rito especial da possessória.
Ponto que merece destaque é que a liminar possessória é uma espécie de tutela de evidência. Em outros termos, o perigo da demora não precisa ser demonstrado para a obtenção da liminar, basta demonstrar que a parte interessada tem direito a estar na posse do bem. O Código em nenhum momento faz menção ao perigo da demora como requisito para a concessão da tutela constantes no art.561, in verbis:
Art. 561. Incumbe ao autor provar:
I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação de reintegração.
Assim, a tutela do art. 300 do CPC tem aplicação nas possessórias, desde que na fase do procedimento que é regida pelo procedimento comum. O mesmo se aplica à tutela de evidência desde que satisfeitos os requisitos do art. 311 do CPC. Nesse sentido Cassio Scarpinella Bueno:
“Há mais, contudo mesmo para a tutela jurisdicional da posse, o procedimento especial ora em estudo é reservado para os casos em que o pedido respectivo é formulado até ano e dia da turbação ou do esbulho descrito na petição inicial, a chamada ‘posse nova’. Depois deste prazo, o procedimento a ser observado, mesmo que visando a tutela jurisdicional da posse ( ‘a posse velha’), é o comum ( art.558). Não há nenhum óbice em tais casos, contudo, para que o autor, diante dos respectivos pressupostos, formule (e lhe seja concedido) pedido de tutela provisória, observando-se o disposto nos arts.294 a 311.7”
Em nosso sentir, no que diz respeito à tutela da posse, o perigo da demora é um plus , isto é, algo a mais a ser considerado para a concessão da tutela antecipada possessória. Não é requisito essencial para a concessão da referida tutela. Para isto, basta a parte demonstrar os requisitos do art. 561 estão satisfeitos para que a liminar seja concedida em qualquer fase do processo. Note-se que a liminar também poderá ser concedida com base no art. 300 e no art. 311 do CPC, desde que satisfeitos os requisitos necessários e de que a ação já esteja na fase em que será regida pelo procedimento comum e que os requisitos do art. 561, I,II e IV sejam atendidos. Entendemos que nessa fase processual o inciso III do art. 561 deixa de ser fundamental para a concessão da tutela por não se tratar mais do regime de ação de força nova. Dessa forma os requisitos elencados no art. 300 e 311 do CPC são um plus a ser considerado na concessão da medida.
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1 ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa;LINS DA CONCEIÇÂO, Maria Lúcia; SILVA RIBEIRO, Leonardo Ferres da; TORRES DE MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 2ª Ed.São Paulo: RT.2016. P.1013.
2 THEODORO JUNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. V.II. 53ª Ed. Rio de Janeiro: Forense.2019.P.128.
3 NERY JUNIOR, Nelson; ANDRADE NERY, Rosa Maria de. Código de Processo Civil Comentado. 17ª Ed. São Paulo: RT.2018.P.1567.
4 FURTADO FABRÍCIO, Adroaldo. Comentário ao art.931 In: ARRUDA AVIM, Teresa et al (coord.). Breves Comentários ao Novo Código de Processo Civil . São Paulo: RT, 2015.P.1460.
5 Art. 566. Aplica-se, quanto ao mais, o procedimento comum.
6 Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até 30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2o e 4o.
§ 1o Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§ 2o a 4o deste artigo.
§ 2o O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça.
§ 3o O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer necessária à efetivação da tutela jurisdicional.
§ 4o Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório.
7 SCARPINELLA BUENO, Cassio. Manual de Direito Processual Civil. 4ª Ed. São Paulo: Saraiva.2018.P.566.
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*Archavir Mário Donelian é mestrando em Direito Processual Civil pela PUC-SP.