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Teoria do adimplemento substancial e o contrato de seguro

Num primeiro momento, não há como definir uma forma exata para a aplicação da teoria do adimplemento substancial, ante a imprescindibilidade da detida análise do caso concreto, pois é preciso cautela na apreciação dos casos.

30/7/2019

Sabe-se que os contratos, como materialização dos variados negócios jurídicos existentes e ainda como um dos mais importantes personagens do direito civil, estão presentes de forma constante na vida do homem, seja na locação de um imóvel, seja na compra de um bem, ou até mesmo na aquisição de um seguro. 

Partindo dessa premissa, torna-se evidente, a cada dia que passa, a necessidade de se procurar meios para preservar as relações contratuais, no sentido de se aproveitar tudo o que foi investido, seja em relação ao tempo ou em relação aos custos financeiros despendidos naquele determinado negócio. Isso porque, é essencial no âmbito civil que todas as questões sejam esclarecidas, em especial para que seja construído um pensamento jurídico constante, a fim de evitar riscos nos negócios. 

Nos contratos de seguro não é diferente. Sobretudo porque aqui existe o prêmio, que é um dos mais importantes elementos para a sua constituição, sendo ainda considerado a principal obrigação do segurado. 

E, diante dessa afirmativa, podemos, por meio de uma abordagem singela, destacar alguns pontos relativos à importância do pagamento do prêmio, bem como ao cumprimento da boa-fé e a função social dos contratos nas relações contratuais securitárias.

Nesse toar está a teoria do adimplemento substancial, que teve sua origem basicamente no direito inglês, com início marcado em meados do século XVIII, e o primeiro caso com aplicação efetiva da teoria ocorreu precisamente em 1779, onde figuravam como partes litigantes Boone e Eyre. Após, a teoria foi ganhando espaço em outros países, especialmente na Itália, onde a teoria possui expressa previsão no Art. 1.445 do Código Civil1.

No Brasil, em que pese a ausência de legislação expressa sobre a aplicação da teoria do adimplemento substancial, há fortes e estruturais embasamentos para sua aplicação. 

De início, em relação aos princípios da boa-fé objetiva e da função social do contrato, temos que ambos são considerados como cláusulas gerais de todos os contratos, motivo pelo qual é impraticável tratar de adimplemento substancial sem se ater a tais preceitos. 

No Código Civil, tais princípios foram explorados em todo o texto legal, no entanto, especificamente em relação aos contratos em geral, estão claramente previstos nos artigos 421 e 422. 

Seguindo essa premissa, pode-se dizer com segurança que a base de todas as relações contratuais está no fato de que uma parte se obriga perante a outra a guardar a máxima lisura e probidade durante todo o tempo que perdurar o contrato, inclusive na sua execução. 

De fato, a boa-fé objetiva inspira toda a teoria dos contratos, de modo que as partes não podem se comportar de forma que comprometa a finalidade e o resultado adequado do negócio jurídico. Isso significa que deve haver confiança nas relações. 

Lado outro, e de igual importância, está o princípio da função social do contrato, que delimitou Pablo Stolze e Rodolfo Pamplona : “é um princípio jurídico de conteúdo indeterminado, que se compreende na medida em que lhe reconhecemos o precípuo efeito de impor limites à liberdade de contratar, em prol do bem comum”. 

A partir de tais manifestações acerca desses dois princípios fundamentais da teoria geral dos contratos, constata-se que de fato são cláusulas basilares e, praticamente, os dois mais importantes requisitos para a aplicação da referida teoria. 

Isso significa que no caso concreto, para que a teoria do adimplemento substancial seja aplicada, o devedor inadimplente deve estar perante a relação contratual de boa-fé e ainda não deve agir de modo que prejudique a finalidade do contrato. 

Mas afinal, o que seria a teoria do adimplemento substancial aplicada nos contratos de seguro? Sem mais delongas, referida teoria é baseada no fato de que mesmo que o segurado não tenha cumprido totalmente a sua obrigação de pagar o prêmio perante a seguradora, tal fato não resultará na extinção do contrato, pois será considerada, nessa hipótese, a quantidade de parcelas já pagas durante a vigência do contrato e, por consequência, a relação contratual será mantida. 

Ocorre que a aplicação da referia teoria não pode ocorrer de forma indiscriminada, mas sim baseada nos requisitos já sedimentados nos entendimentos jurisprudenciais. 

O artigo 757, caput, prevê que pelo contrato de seguro, o segurador se obriga, mediante o pagamento do prêmio, a garantir interesse legítimo do segurado, relativo à pessoa ou a coisa, contra riscos predeterminados. Inclusive, a base do contrato de seguro está no fato de que os segurados devem estar adimplentes quando da ocorrência de algum sinistro, caso contrário estará configurado um desequilíbrio contratual. 

Ademais, conforme dito, o pagamento do prêmio é a principal obrigação do segurado no contrato de seguro, logo, o prêmio, propriamente dito, é um dos elementos essenciais do referido negócio. 

Portanto, conclui-se que num primeiro momento, não há como definir uma forma exata para a aplicação da teoria do adimplemento substancial, ante a imprescindibilidade da detida análise do caso concreto, pois é preciso cautela na apreciação dos casos, a fim de que todos os princípios norteadores dos negócios jurídicos e contratos em geral, especialmente nos securitários, sejam respeitados e detidamente analisados frente às particularidades apresentadas, evitando-se assim a prolação de decisões que causem o desequilíbrio da relação contratual. Essa análise minuciosa e individualizada serve para garantir a preservação dos fundamentos basilares e especialmente do mutualismo, que rege as relações securitárias.

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1 TARTUCE, Flávio. Teoria do Adimplemento substancial na doutrina e na jurisprudência. 2015. Disponível aqui. Acesso em 17 jan. 2017. 

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*Tarcilla Pereira Faria é sócia advogada da Jacó Coelho Advogados.

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