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Das ilegalidades cometidas pelos entes municipais na instituição/cobrança da contribuição para custeio do serviço de iluminação pública (CIP/COSIP)

A previsão constitucional da CIP/COSIP tem por fundamento o art. 149-A (incluído pela emenda constitucional 39/02), o qual, em virtude da generalidade da redação promovida pelo constituinte, tem sido objeto de verdadeiro “estelionato legislativo”.

15/5/2019

Primeiramente, no arcabouço do ordenamento jurídico pátrio, verifica-se que a hoje intitulada Contribuição de Iluminação Pública – CIP/COSIP  se alicerça na emenda constitucional 39/02, possuindo como finalidade o custeio da iluminação pública dos municípios e Distrito Federal. 

A previsão constitucional da CIP/COSIP tem por fundamento o art. 149-A (incluído pela emenda constitucional 39/02), o qual, em virtude da generalidade da redação promovida pelo constituinte, tem sido objeto de verdadeiro “estelionato legislativo”, isto porque os municípios têm promovido a distorção dos conceitos previstos no caput para ampliar, inconstitucionalmente, as destinações de sua arrecadação vinculada.

Art. 149-A Os Municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição, na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública, observado o disposto no art. 150, I e III.   (Incluído pela emenda constitucional 39, de 2002).

Parágrafo único. É facultada a cobrança da contribuição a que se refere o caput, na fatura de consumo de energia elétrica. 

É notório, a partir da análise do art. 149-A, que a Constituição buscou conferir certo grau de liberdade aos municípios/DF ao viabilizar, em seu silêncio absoluto, que as leis municipais e distritais instituidoras definam o fato gerador, base de cálculo, alíquotas e contribuintes, não havendo margem para o legislador infraconstitucional dispor acerca da espécie tributária a ser utilizada para a cobrança (contribuição), bem como a vinculação da arrecadação para o custeio do serviço. 

É neste último ponto que se vislumbra a inconstitucionalidade cometida pelos entes federativos competentes, uma vez que os mesmos ampliam as diretrizes e limitações ditadas pela Constituição Federal, especificamente no que concerne às hipóteses de utilização dos recursos advindos da supracitada contribuição constitucional, como por exemplo, “a instalação, melhoramento, expansão e modernização da rede de iluminação pública municipal”, ao que temos como paradigma o município de Ibicoara/BA . 

Tais utilizações são absolutamente vedadas, pois o legislador constituinte, ao se referir ao custeio de um serviço, usou a palavra “custeio” no corriqueiro sentido que a legislação financeira tem dado ao vocábulo, qual seja, o sentido de manter, financiar um serviço já existente. 

Por este ângulo, o § 1º do art. 12 da lei federal 4.320/64 (recepcionada pela CF/88) classifica como despesa de custeio “as dotações para a manutenção de serviços anteriormente criados, inclusive as destinadas a atender a obras de conservação e adaptação de bens imóveis”. 

Neste sentido, a discussão acima apresentada é de tal importância que se encontra, atualmente, pendente de julgamento em recurso extraordinário com repercussão geral 666.404-RG, no STF, em que se discute a possibilidade, ou não, de se utilizar a destinação da arrecadação da contribuição para custeio do serviço de iluminação pública (COSIP) para a instalação, melhoria ou expansão do serviço de iluminação pública, senão vejamos: 

ILUMINAÇÃO PÚBLICA. CUSTEIO DE MELHORAMENTO E EXPANSÃO DA REDE. ARTIGO 149-A DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. AFASTAMENTO NA ORIGEM. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA. Possui repercussão geral a controvérsia relativa à constitucionalidade da cobrança, por Municípios e Distrito Federal, de contribuição de iluminação pública VISANDO SATISFAZER DESPESAS COM MELHORAMENTO E EXPANSÃO DA REDE.

(STF - RG RE: 666404 SP - SÃO PAULO, Relator: min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 28/11/13, Data de Publicação: DJe-032 17/2/14). 

Ante o exposto, em que pese a pendência de julgamento do RE 666404/SP, em sede de repercussão geral, pelo STF, afigura-se que os fundamentos para a inconstitucionalidade da utilização dos recursos provenientes da CIP/COSIP para instalar, melhorar ou expandir o serviço existente, são substanciais, em respeito ao texto constitucional e à legislação ordinária federal, sendo legítima a vinculação da cobrança apenas para a manutenção da rede de iluminação pública comum do município, em atendimento ao fiel significado do vocábulo “custeio”.

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1 O custeio da iluminação pública municipal ou distrital era anteriormente cobrado através da espécie tributária Taxa. Contudo, o Supremo Tribunal Federal, com fundamento na impossibilidade de indivisibilidade e especificidade editou a súmula 670 em 24/9/03 com o seguinte teor: “O serviço de iluminação pública não pode ser remunerado mediante taxa”, possuindo como referência legislativa o art. 145, II da CF e precedentes o RE 233332, RE 231764 e o AI 231132 aAgR. Posteriormente, em 20/03/2015, a súmula 670 foi convertida na Súmula Vinculante 41, com igual teor. Desta forma, em que pese ter sido considerada ilegal a cobrança por meio de Taxa, a EC 39/2002 possibilitou aos Municípios e DF a cobrança através de Contribuição – CIP/COSIP.

2 Lei Municipal 259/17: Art. 1° - Fica instituída no Município de Ibicoara a Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública – CIP, prevista no art. 149-A da Constituição Federal. Parágrafo único – o serviço previsto no caput deste artigo compreende a iluminação de vias, logradouros e demais bens públicos de uso comum, além da instalação, manutenção, melhoramento e expansão da rede de iluminação pública municipal. Art. 9° - (...) Parágrafo único – O contrato a que se refere este artigo deverá, obrigatoriamente prever repasse até o 15° dia do mês subsequente ao da arrecadação pela concessionária ao Município, admitida, a retenção dos montantes necessários para a liquidação de quaisquer obrigações relativas ao fornecimento de energia elétrica para o serviço de manutenção da Iluminação Pública, incluindo-se a melhoria e a ampliação das instalações elétricas, bem como os encargos financeiros destinados a suprir a expansão e modernização do sistema de iluminação pública.

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*Igor Bastos de Almeida Dias é advogado tributarista da MoselloLima Advocacia.

 

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