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Da tempestividade do depósito de pedido de patente dividido durante a fase recursal do pedido de patente original

O princípio da legalidade é, portanto, violado pelo artigo 32 da instrução normativa 30/13, que estabelece que o final de exame de um pedido de patente ocorreria com o indeferimento independentemente de um recurso administrativo com efeitos devolutivo e suspensivo ter sido manejado.

13/5/2019

1. Introdução

A matéria originalmente revelada em um pedido de patente pode ser livremente decomposta através do depósito em um ou mais pedidos de patente divididos. Porém, para um pedido de patente dividido ser aceito, a Lei da Propriedade Industrial (LPI) – lei 9.279/96 –, determina que tal depósito deve ocorrer até o final de exame do pedido de patente original.

Esse final de exame ocorre, por exemplo, com a decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que o indefere. Entretanto, se essa decisão é impugnada por um recurso administrativo com efeitos suspensivo e devolutivo, o final de exame é postergado para a decisão do INPI que decide tal recurso.

Por essa razão, o depósito de pedido de patente dividido durante a fase recursal do pedido de patente original é tempestivo visto ter ocorrido antes do final de exame deste.

Logo, o artigo 32 da instrução normativa 30/13 editada pelo INPI, por estabelecer que o final de exame de um pedido de patente, para fins de aceitação de pedido de patente dividido, ocorre com a decisão de indeferimento independentemente de um recurso administrativo ter sido interposto, viola o princípio da legalidade.

2. Pedido de patente dividido 

A partir de uma única pesquisa, um inventor pode concomitantemente criar, por exemplo, três inventos – denominados A, B e C – que, em um primeiro momento, pareçam estar tecnicamente interligados.

Buscando obter proteção por patente para tais inventos, o inventor deposita um único pedido de patente para esses inventos já que o artigo 22 da LPI, privilegiando o princípio da eficiência, autoriza o depósito de um único pedido de patente para um grupo de inventos desde que ligados por um único conceito inventivo:

Art. 22. O pedido de patente de invenção terá de se referir a uma única invenção ou a um grupo de invenções inter-relacionadas de maneira a compreenderem um único conceito inventivo.

Por conceito inventivo único, ou unidade de invenção, entende-se que as diversas invenções reivindicadas apresentam uma relação técnica entre si representada por uma ou mais características técnicas especiais que são as mesmas ou correspondentes para todas as invenções reivindicadas” – item 3.99 das diretrizes de exame de pedidos de patente (bloco I), instituídas pela resolução 113/13 do INPI.

Durante o exame do referido pedido de patente, o INPI pode entender que os inventos A, B e C não estão interligados por um único conceito inventivo e, ato contínuo, exigir a reformulação do quadro reivindicatório de modo que a patente seja concedida conferindo proteção para apenas um único invento.

Caso o inventor concorde com a opinião do INPI, a alternativa é limitar o pedido de patente a apenas um dos três inventos e depositar dois pedidos de patente divididos, um para cada um dos outros dois inventos.

Isso porque o artigo 26 da LPI autoriza a divisão de um pedido de patente em dois ou mais pedidos de patente, de ofício ou a requerimento do depositante:

Art. 26 - O pedido de patente poderá ser dividido em dois ou mais, de ofício ou a requerimento do depositante, até o final do exame, desde que o pedido dividido:

I - faça referência específica ao pedido original; e

II - não exceda à matéria revelada constante do pedido original.

Parágrafo único - O requerimento de divisão em desacordo com o disposto neste artigo será arquivado.

A respeito de pedido de patente dividido, impecável é o ensinamento do professor DENIS BORGES1:

Algumas vezes, os pedidos podem conter material que exceda a um só conceito inventivo ou modelo de utilidade, ou conter matéria relativa a mais de uma prioridade. Há, na verdade, mais de um invento.

Tais pedidos podem ser divididos em dois ou mais até o final do exame seja a requerimento do depositante; seja em atendimento a exigência feita pelo INPI. Este último só poderá impor o desdobramento no caso de falta de unidade inventiva. O depositante poderá requerer sempre a divisão, salvo se a divisão implicar em mutilação ou dupla proteção da invenção ou modelo.

Em suma, em um pedido de patente dividido, é possível formular livremente as reivindicações, inclusive novas, desde que nos limites da matéria revelada no pedido original.

Os pedidos de patente divididos terão a data de depósito do pedido de patente original e o benefício de prioridade2 deste, se for o caso, bem como estarão sujeitos a pagamento das retribuições correspondentes (artigos 273 e 284 da LPI).

3. Regras para o depósito de pedido de patente dividido. 

Para um pedido de patente dividido ser aceito, três regras previstas no artigo 26 da LPI devem ser atendidas: (i) fazer referência específica ao pedido de patente original; (ii) ser depositado até o final de exame do pedido de patente original; e (iii) não exceder à matéria revelada no pedido original.

Caso não sejam cumpridas, o pedido de divisão será arquivado (§ único do artigo 26 da LPI), mas não sem oportunizar ao depositante a defesa prévia5 em respeito aos princípios do contraditório e da ampla defesa (artigo 5º, inciso LV, da CRFB/1988 e artigo 2º, caput, da Lei do Processo Administrativo (LPA) – lei 9.784/99).

4. Recurso administrativo perante o INPI e seus efeitos. 

De acordo com artigo 212, caput, da LPI, a regra é a possibilidade de interposição de recurso administrativo contra as decisões proferidas pelo INPI:

Art. 212 - Salvo expressa disposição em contrário, das decisões de que trata esta Lei cabe recurso, que será interposto no prazo de 60 (sessenta) dias.

Para pedidos de patente, as exceções a essa regra são: (i) decisão que defere pedido de patente (artigo 212, §2º6, da LPI); (ii) decisão que arquiva definitivamente pedido de patente (artigo 212, §2º, da LPI) independente do motivo; e (iii) decisão que nega provimento a recurso (artigo 2157 da LPI).

No âmbito do INPI, os pedidos de patente são decididos por sua Diretoria de Patentes (artigo 12, inciso I, do decreto 8.854/16) e os recursos administrativos contra as decisões dessa diretoria são decididos pelo Presidente do INPI (artigo 212, §3º, da LPI) de acordo com opinião técnica da Coordenação-Geral de Recursos (artigo 15, inciso I, do decreto 8.854/16):

Art. 12. À Diretoria de Patentes, Programas de Computador e Topografias de Circuitos Integrados compete:

I - examinar e decidir os pedidos de patentes de invenção e de modelo de utilidade, na forma da lei 9.279, de 14 de maio de 1996, tendo em vista as diretrizes de política industrial e tecnológica aprovadas pelo Governo federal;

Art. 15. À Coordenação-Geral de Recursos e Processos Administrativos de Nulidade compete:

I - examinar e fornecer subsídios técnicos para decisão do Presidente do INPI nos recursos e processos administrativos de nulidade, interpostos na forma da legislação vigente de propriedade industrial, e emitir parecer sobre a matéria técnica suscitada;

 

4.1. Efeito devolutivo.

O parágrafo 1° do artigo 212 da LPI ordena que o recurso administrativo contra decisão da Diretoria de Patentes do INPI – por exemplo, decisão que indefere pedido de patente – seja recebido com efeito devolutivo pleno:

§ 1° - Os recursos serão recebidos nos efeitos suspensivo e devolutivo pleno, aplicando-se todos os dispositivos pertinentes ao exame de primeira instância, no que couber.

Essa devolutividade obrigatória do recurso administrativo interposto perante o INPI confere a possibilidade de revisão pelo próprio INPI, mais especificamente sua Coordenação-Geral de Recursos, de toda a matéria discutida no âmbito do processo administrativo, inclusive aquela não impugnada pelo interessado em seu recurso.

Tanto é assim que a Coordenação-Geral de Recursos não apenas revê a decisão impugnada proferida pela Diretoria de Patentes, mas sim continua o exame de mérito do pedido de patente ou até mesmo efetua um novo exame.

Esse fato é reconhecido pelo próprio INPI em pareceres técnicos emitidos durante a fase recursal nos termos do artigo 2148 da LPI:

Com base nas modificações apresentadas no quadro reivindicatório, manifestação da requerente e anterioridades D1-D5, segue-se um novo exame do presente pedido.

(PI0720337-3 - Despacho 9.1 notificado na RPI 2386 de 27.09.2016)

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Pelo aqui demonstrado, o instrumento do Recurso Administrativo ao Indeferimento existe para garantir aos depositantes um segundo fórum de análise técnico-administrativa dos pedidos. Portanto, é pré-requisito que o novo exame seja efetuado em sua plenitude para possibilitar a identificação de eventuais erros e/ou omissões ocorridos anteriormente na aplicação da legislação pertinente. Somente nestas condições é que o expediente do Recurso pode cumprir seu intento. Por estas razões, a tese da Recorrente sobre a seletividade do exame em fase Recursal é incorreta, valendo a instrução da devolução plena.

(PI0007937-5 - Despacho 111 notificado na RPI 2288 de 11.11.2014)

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No segundo exame técnico do recurso, com base nas alegações apresentadas foi verificada a necessidade de formulação de exigências de acordo com o artigo 214 da referida LPI, no sentido de contornar as objeções ao provimento do recurso.

(PI0305972-3 - Despacho 111 notificado na RPI 2361 de 05.04.2016)

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O segundo exame colegiado em fase de recurso, com base nas alegações da recorrente, realizou novas buscas por anterioridades e formulou novas alegações referentes aos artigos 8º, 11 e 25 da LPI.

(PI0117332-4 - Despacho 111 notificado na RPI 2349 de 12.01.2016)

Em suma, o recurso administrativo contra decisão do INPI que indefere pedido de patente não acarreta em uma simples análise da decisão recorrida, mas sim na continuação do exame de mérito do pedido de patente ou até mesmo em um novo exame.

É inegável, portanto, que a interposição de um recurso administrativo contra decisão de indeferimento faz com que exista, além de uma fase de exame de primeira instância, uma fase de exame de segunda instância, que é a fase recursal, na qual o pedido de patente continua a ser examinado pelo INPI.

 

4.2. Efeito suspensivo.

O efeito suspensivo de um recurso, por óbvio, provoca o impedimento da produção imediata dos efeitos da decisão que se deseja impugnar até a decisão final do recurso. Outro não poderia ser o reiterado entendimento do e. STJ:

1. No processo administrativo disciplinar, “não sendo concedido efeito suspensivo ao recurso administrativo ou ao pedido de reconsideração, não há irregularidade na aplicação da pena de demissão imposta após regular processo administrativo disciplinar” (RMS 17.839/SP, rel. min. Arnaldo Esteves Lima DJ 13/03/2006). (STJ, MS 21120 / DF, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, ministro BENEDITO GONÇALVES, Data do julgamento: 22/2/18)

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3. O recurso administrativo é recebido, via de regra, apenas no efeito devolutivo, o que permite a execução imediata da decisão tomada no processo administrativo. (STJ, MS 14425 / DF, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, ministro NEFI CORDEIRO, Data do julgamento: 24/9/14)

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4. É regular a aplicação da penalidade disciplinar nos casos de não atribuição de efeito suspensivo a recurso administrativo. Nesse sentido: MS 14.372/DF, rel. ministra Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, DJe 30.8.2011; RMS 17.839/SP, rel. ministro Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 13/3/06; MS 14.404/DF, rel. ministro Haroldo Rodrigues (Desembargador convocado do TJ/CE), Terceira Seção, DJe 15.6.2011. (STJ, RMS 35325 / PE, T2 - SEGUNDA TURMA, ministro HERMAN BENJAMIN, Data do julgamento: 26/2/13)

O objetivo da suspensividade do recurso é preservar os interessados dos imediatos efeitos de uma decisão que ainda está sendo questionada no âmbito administrativo em respeito ao princípio da segurança jurídica.

Quando o recurso é recebido no efeito suspensivo, tem-se prejudicada a fluência do prazo prescricional, e segundo o doutrinador HELY LOPES MEIRELLES9 isto ocorre porque “durante a tramitação do recurso interno (com efeito suspensivo), o ato recorrido é inexequível, não rendendo ensejo a qualquer ação judicial, e, não havendo ação, não pode haver prescrição”.

No sistema de patentes brasileiro, o recurso administrativo interposto em face de decisão proferida pelo INPI é, obrigatoriamente, recebido com efeito suspensivo de acordo com o disposto no artigo 212, parágrafo 1º, da LPI:

§ 1° - Os recursos serão recebidos nos efeitos suspensivo e devolutivo pleno, aplicando-se todos os dispositivos pertinentes ao exame de primeira instância, no que couber.

Logo, por corolário lógico, a interposição de recurso administrativo impede que a decisão administrativa do INPI recorrida – por exemplo, uma decisão que indeferiu um pedido de patente –, produza normalmente os seus efeitos até a decisão administrativa se tornar final no âmbito administrativo.

Esse é justamente o entendimento da procuradoria federal do próprio INPI consubstanciado no PARECER/INPI/PROC/CJCONS/02/08:

O parágrafo primeiro do dispositivo transcrito identifica os dois principais efeitos decorrentes da interposição de recursos: o suspensivo e o devolutivo pleno. Pelo primeiro, impede-se que a decisão recorrida produza efeitos desde logo, somente podendo produzi-los depois da avaliação do recurso e do respectivo trânsito em julgado dessa decisão, ou seja, suspende a eficácia da decisão recorrida, porquanto desprovida de plena e imediata executoriedade. Pelo segundo, toda a matéria impugnada é remetida a órgão diverso daquele que prolatou a decisão original para uma nova apreciação. Transfere-se o poder de julgar. (...)

Tanto é verdade que o prazo prescricional de cinco (5) anos para ajuizar ação judicial visando a reverter decisão de indeferimento do INPI (artigo 22510 da LPI) começa a fluir justamente com a notificação da decisão sobre o recurso administrativo, que é final e irrecorrível na esfera administrativa (artigo 21511 da LPI).

Isso ocorre porque as decisões de indeferimento foram suprimidas e substituídas pela decisão final do recurso que manteve o indeferimento e encerrou o processo administrativo do INPI.

É indene de dúvidas, portanto, que uma decisão do INPI só gera efeitos nas seguintes hipóteses (i) quando não há possibilidade de ser impugnada por meio de um recurso administrativo ou (ii) quando não é impugnada por meio de um recurso administrativo – seus efeitos só são produzidos a partir do dia seguinte ao último dia do prazo para interposição de recurso.

5. Final do exame de pedido de patente.

A partir de uma interpretação meramente literal e isolada do artigo 37 da LPI, poder-se-ia pensar que o final de exame ocorre com a decisão de deferimento ou indeferimento:

Art. 37. Concluído o exame, será proferida decisão, deferindo ou indeferindo o pedido de patente.

Como “na busca da justiça, não se pode ser escravo da letra da lei e muito menos se apegar à interpretação meramente gramatical12, a interpretação sistemática da LPI aponta que o final de exame não acontece com o indeferimento de um pedido de patente se tal decisão é impugnada por um recurso administrativo.

Isso porque, a interposição de um recurso administrativo contra decisão do INPI que indefere um pedido de patente é, nos termos do artigo 212, §1º, da LPI obrigatoriamente recebido com efeitos suspensivo e devolutivo pleno, o que gera dois importantes desdobramentos:

·            um novo exame do pedido de patente é realizado na fase recursal razão pela qual o processo de exame é composto por duas fases, a saber: a fase de exame de primeira instância e a fase de exame de segunda instância, que é a fase recursal; e

·            a decisão recorrida tem a sua eficácia suspensa de modo que deixa de produzir os seus efeitos até que seja publicada uma decisão final acerca do recurso administrativo.

Daí conclui-se, por corolário lógico, que se foi manejado um recurso administrativo contra indeferimento, obviamente o final do exame do pedido de patente é prorrogado para a decisão acerca desse recurso, que pode manter o indeferimento (isto é, negar provimento) ou deferir o pedido de patente (ou seja, dar provimento) uma vez que esta decisão é final e irrecorrível administrativamente (artigos 212, § 3°13, e 21514 do da LPI).

Afinal de contas, o exame de um pedido de patente só pode, de fato, ser considerado encerrado com uma decisão que definitivamente termina esse exame. Enquanto não ocorrer a coisa julgada administrativa, isto é, a decisão do INPI puder ser revertida através de recurso a ser manejado pelo depositante, é evidente que o final de exame ainda não ocorreu.

Em suma, como o final de exame de um pedido de patente é prorrogado para a decisão que decide um recurso administrativo contra decisão de indeferimento, inexiste dúvida de que, durante a fase recursal, o depósito de pedido de patente dividido é tempestivo.

Isso porque o artigo 26, caput, da LPI determina que para um pedido de patente dividido ser aceito o seu depósito deve ocorrer antes do final do exame do pedido de patente original.

6. Ato normativo do INPI viola o princípio da legalidade. 

O poder para editar atos normativos conferido a alguns entes da Administração Pública, da qual faz parte o INPI, deve ser exercido de forma compatível com a Lei sob pena de violação ao princípio da legalidade (artigo 37, caput15, da CRFB/88 e artigo 2º, caput16, da LPA).

A Administração Pública fica subordinada às prescrições emanadas do Poder Legislativo e, por conseguinte, um ato normativo administrativo sempre deve respeitar os parâmetros fixados por lei – isto é, jamais deve modificá-los ou superá-los – na medida em que é inferior à lei, tal como aduzem as melhores doutrinas:

GILMAR FERREIRA MENDES17

Embora possa parecer uma tautologia, nunca é demais afirmar que a Administração Pública está jungida pela legalidade, que é princípio essencial ao Estado de Direito. Por esta razão a quase totalidade das constituições modernas explicita o princípio da legalidade como postulado fundamental do Estado.

Pode-se dizer, do princípio da legalidade em relação ao Estado de Direito, que “é justamente aquele que o qualifica e que lhe dá identidade própria”, pois ele representa a submissão do Estado à lei.

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DIÓGENES GASPARINI18

O princípio da legalidade significa estar a Administração Pública, em toda a sua atividade, presa aos mandamentos da lei, deles não se podendo afastar, sob pena de invalidade do ato e responsabilidade de seu autor. Qualquer ação estatal sem o correspondente calço legal ou que exceda ao âmbito demarcado pela lei é injurídica e expõe-se à anulação. [...]

Valendo-se de sua competência para criar atos administrativos normativos, o INPI editou a instrução normativa 30/13 com o artigo 32 que estabelece que o final de exame de um pedido de patente ocorreria, por exemplo, com o indeferimento independentemente de um recurso administrativo com efeitos devolutivo e suspensivo ter sido manejado:

Art. 32 Para os efeitos dos artigos 26 e 31 da LPI, considera-se final de exame em Primeira instância, a data do parecer conclusivo do técnico quanto à patenteabilidade, ou o trigésimo dia que antecede a publicação da decisão de deferimento, indeferimento ou arquivamento definitivo, o que ocorrer por último.

Com efeito, não é necessário tecer grandes comentários para chegar a óbvia conclusão de que esse dispositivo é ilegal. Como esclarecido no item 5, a partir de uma interpretação sistemática da LPI, o final de exame não ocorre com a decisão de indeferimento quando um recurso administrativo com efeitos devolutivo e suspensivo é interposto, mas sim com a decisão acerca desse recurso.

Assim sendo, a LPI autoriza o depósito de um pedido de patente dividido durante a fase recursal administrativa do pedido de patente original, isto é, enquanto estiver pendente de decisão o recurso administrativo interposto contra decisão de indeferimento.

O INPI aparentemente se esqueceu que, por força do princípio da legalidade, deve executar o seu poder de regulamentar de forma compatível com a Lei e criou óbice para a aceitação de um pedido de patente dividido, indo de encontro com a LPI e, portanto, o referido princípio de forma indubitável é violado.

 

 

7. Entendimento do Poder Judiciário.

A legalidade do artigo 32 da instrução normativa 30/13 do INPI ainda não foi diretamente questionada junto ao Poder Judiciário. Todavia, algumas decisões do INPI que arquivaram pedidos de patente divididos com fulcro nesse artigo foram contestadas perante o Poder Judiciário.

Até o momento, as pesquisas de jurisprudência apontam que há apenas um acórdão acerca desse assunto que foi proferido pelo e. Tribunal Regional Federal da 2ª Região – processo 0133370-81.2015.4.02.5101.

A partir da leitura do v. acórdão, o e. TRF2 parece confirmar que o final de exame de um pedido de patente não ocorre com a decisão de indeferimento do INPI quando um recurso administrativo é interposto visto que tal recurso possui efeito devolutivo pleno e efeito suspensivo, mas sim com a publicação da decisão do recurso administrativo, que é final e irrecorrível administrativamente:

É certo que, nos termos do dito preceito, das decisões de que trata a Lei de Propriedade Industrial, caberá recurso, que será recebido nos efeitos suspensivo e devolutivo pleno.

Disso se extrai que todas as questões objeto do apelo administrativo serão devolvidas para o reexame do juízo ad quem, além de a decisão não poder ser executada, até a decisão do recurso.

Apesar disso, foram mantidas as decisões do INPI que arquivaram os pedidos de patente divididos uma vez que, segundo o v. acórdão, contra a decisão do INPI que indeferiu o pedido de patente principal não foi interposto um recurso administrativo, mas sim foram requeridos pedidos divididos:

No caso, entretanto, não se trata de um pedido de revisão do ato impugnado, característica própria do recurso, mas, sim, de pedido de divisão de patente, que não pode se travestir de ato impugnado. Antes, afigura-se como uma inovação, vale dizer, um “desmembramento” do pedido de patente originário, sujeito aos mesmos requisitos e a todas as etapas processuais a que se submete um pedido normal, inclusive e consequentemente, às mesmas condições quanto a sua regularização.

Em que pese os embargos de declaração opostos, o e. Tribunal manteve sua oposição.

8. Conclusão.

Segundo o artigo 37 da LPI, o final de exame ocorre com a decisão de indeferimento. Porém, como os recursos administrativos, por força do artigo 212, § 1º, da LPI, possuem efeitos suspensivo e devolutivo, esse final de exame é postergado para a decisão do INPI que decide tal recurso, que é final e irrecorrível na esfera administrativa (artigo 215 da LPI).

Logo, o depósito de pedido de patente dividido durante a fase recursal do pedido de patente original é tempestivo na medida em que o artigo 26 da LPI determina que tal depósito deve ocorrer antes até o final de exame do pedido de patente original.

O princípio da legalidade é, portanto, violado pelo artigo 32 da instrução normativa 30/13, que estabelece que o final de exame de um pedido de patente ocorreria com o indeferimento independentemente de um recurso administrativo com efeitos devolutivo e suspensivo ter sido manejado.

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1 BARBOSA, Denis Borges. Uma Introdução À Propriedade Intelectual. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 433.

2 A prioridade consiste em garantir que um inventor de um pedido de patente depositado em um país membro da CUP possa, no prazo de até doze meses, depositar um pedido de patente em outro país membro da CUP sem que esse segundo pedido de patente seja afetado por fatos ocorridos entre a data do primeiro depósito do pedido de patente (no país original) e a data de seu depósito.

3 Art. 27 - Os pedidos divididos terão a data de depósito do pedido original e o benefício de prioridade deste, se for o caso.

4 Art. 28 - Cada pedido dividido estará sujeito a pagamento das retribuições correspondentes.

5 A defesa prévia é a peça de defesa dos direitos do interessado para subsidiar a busca da verdade real dos fatos e delimitar inclusive a fase probatória do processo administrativo. Tem a serventia de se opor à pretensão ou apuração pela Administração, fazendo com que o ativismo da parte adversa possa até mesmo eliminar possíveis dúvidas de fato ou de direito existentes pela Administração Pública no suporte fático em contenda.

6 § 2° - Não cabe recurso da decisão que determinar o arquivamento definitivo de pedido de patente ou de registro e da que deferir pedido de patente, de certificado de adição ou de registro de marca.

7 Art. 215 - A decisão do recurso é final e irrecorrível na esfera administrativa.

8 Art. 214. Para fins de complementação das razões oferecidas a título de recurso, o INPI poderá formular exigências, que deverão ser cumpridas no prazo de 60 (sessenta) dias.

Parágrafo único. Decorrido o prazo do caput, será decidido o recurso.

9 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 42. ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2016, p. 808.

10 Art. 225 - Prescreve em 5 (cinco) anos a ação para reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial.

11 Art. 215 - A decisão do recurso é final e irrecorrível na esfera administrativa.

12 STJ. RESP: 8823/RJ, relator: ministro Garcia Vieira, DJ 03/08/1992

13 § 3° - Os recursos serão decididos pelo Presidente do INPI, encerrando-se a instância administrativa.

14 Art. 215 - A decisão do recurso é final e irrecorrível na esfera administrativa.

15 Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

16 Art. 2o A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

17 Mendes, Gilmar Ferreira e Branco, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 7. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2012.

18 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 61.

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*Bernardo Marinho Fontes Alexandre é sócio advogado do escritório Dannemann Siemsen.

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