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Defesa jurídica do cirurgião plástico

Em regra, os atos do médico desenvolve-se como sendo obrigação de meio, ou seja, o profissional da saúde deve utilizar todo o seu conhecimento e meios existente na medicina para tratar o paciente, sem vincular-se ao resultado de obter a cura.

12/4/2019

O instituto jurídico da responsabilidade civil existe desde os tempos mais remotos, pois surgiu com a vingança da sociedade, passou pela vingança privada (lei de Talião) até chegar a Roma antiga com a “Lex aquila’, onde verifica-se que a responsabilidade civil encontra supedâneo na teoria da culpa (responsabilidade civil subjetiva).

Hodiernamente, o Brasil adota no caso do erro médico, a responsabilidade civil subjetiva do profissional da saúde, ou seja, será necessário comprovar que houve dolo ou culpa do médico na sua atividade laborativa.

A responsabilidade civil do cirurgião plástico é a aplicação de pena indenizatória que obrigue o médico a reparar o dano moral e/ou patrimonial praticado contra seu paciente em razão de ato médico praticado com imprudência, negligência ou imperícia.

Nesse diapasão, não se espera que o médico venha a agir com dolo, portanto, será necessário comprovar a conduta negligente, imprudente ou imperita do mesmo, a fim de que venha a ser imputada a responsabilidade civil insculpida nos artigos 186 do Código Civil e artigo 14, § 4° do Código de Defesa do Consumidor, conforme descrito a seguir:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...) § 4º A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa.

Destarte, a negligência ocorreria quando o médico deixar de observar um dever de cuidado, ou seja, quando ele não toma todos os cuidados necessários ao bom desempenho das suas atividades, como, por exemplo: quando esquece uma tesoura cirurgia na barriga do paciente, pois não verificou no fechamento da intervenção cirúrgica a relação dos materiais utilizados na mesma.

Entretanto, a imprudência seria um agir de forma açodada, ou seja, seria um agir de forma precipitada, como, por exemplo: não pedir para o paciente assinar o Termo de Consentimento Informado (TCI) relativo à cirurgia que seria realizada, onde deveriam constar o método (procedimento) que seria adotado, assim como todos os riscos e implicações no pós-operatório e os cuidados que devem ser tomados pelo mesmo.

Dessa forma, a imperícia seria um agir sem a qualificação necessária para aquele ato, como por exemplo, uma cirurgia plástica realizada por um clínico geral, pois não possui a “residência médica” naquela especialidade e, portanto, não está habilitado para tal desiderato.

Outrosim, a responsabilidade civil subjetiva exige os seguintes requisitos: conduta (dolosa ou culposa), resultado danoso (indenização por danos materiais e morais) e o nexo causal (liame/vínculo entre a conduta e o resultado).

Contudo, a “teoria da culpa” evoluiu para a “teoria do risco”, ou seja, neste caso, a atividade econômica causa risco para o consumidor, onde o fornecedor do serviço será responsabilizado independentemente de culpa, bastando ser comprovado o nexo de causalidade entre a conduta (ação ou omissão e o resultado danoso, e, portanto, não importa a vontade do agente, mas o resultado ocorrido.

Em regra, os atos do médico desenvolve-se como sendo obrigação de meio, ou seja, o profissional da saúde deve utilizar todo o seu conhecimento e meios existente na medicina para tratar o paciente, sem vincular-se ao resultado de obter a cura.

Entretanto, com relação ao “cirurgião plástico” é mais complexo, tendo em vista que deve ser analisado se é caso de cirurgia plástica “estética” ou “reparadora”. Dessa forma, caso o cirurgião plástico esteja realizando uma cirurgia plástica “reparadora”, como por exemplo no caso de um acidente automobilístico ou queimadura decorrente de um grande incêndio, então será obrigação de meio, ou seja, será responsabilidade subjetiva e deve-se comprovar a culpa do médico , conforme elencado no artigo 951 do Código Civil, “in verbis”:

 Art. 951. O disposto nos arts. 948, 949 e 950 aplica-se ainda no caso de indenização devida por aquele que, no exercício de atividade profissional, por negligência, imprudência ou imperícia, causar a morte do paciente, agravar-lhe o mal, causar-lhe lesão, ou inabilitá-lo para o trabalho.

Contudo, caso seja uma questão de cirurgia estética, como, por exemplo, o que é noticiado, diariamente, na mídia, onde mulheres buscam um corpo escultural e procuram os cirurgiões para atender aos seus anseios e, estes possuirão uma responsabilidade objetiva, ou seja, deverão responder por uma obrigação objetiva, visto que estão obrigados a chegar ao resultado prometido. Portanto, neste caso estarão obrigados a indenizar pelo erro médico, independentemente de culpa.

Contudo, o advogado poderá defender o seu cliente que exerce uma atividade na área de saúde e que esteja respondendo a uma ação judicial, alegando as excludentes da ilicitude discriminadas no artigo 188 do Código Civil, assim como as elencadas no artigo 14, §3° do Código de Defesa do Consumidor, conforme disposto a seguir:

188. Não constituem atos ilícitos:

 I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

 II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.

 Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

§ 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

 I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Dessa forma, no caso do cirurgião plástico que tenha realizado uma cirurgia “estética (embelezadora)” e como é um caso de obrigação de resultado, ou seja, deve-se observar uma responsabilidade objetiva, então o advogado deve usar como defesa alegando culpa exclusiva do paciente (vítima) ou caso fortuito ou força maior, pois irá romper o nexo de causalidade entre o dano apontado e o serviço prestado pelo profissional da saúde.

Outrossim, a culpa exclusiva do paciente ocorre, por exemplo, quando ele não segue as recomendações médicas durante o pós-operatório ou presta informações equivocadas ao médico, como no caso de não possuir alergia a algum medicamento, quando na verdade a possui e, quando é aplicado o medicamento, então este ver a possui complicações no seu quando de saúde.

Porém, no caso de força maior seriam efeitos da natureza como terremotos e caso fortuito seriam eventos imprevisíveis, como a queima do aparelho durante a cirurgia e o paciente vem a falecer durante a intervenção cirúrgica.

Outrossim, pode-se alegar culpa de terceiros ou que o defeito não existe. É muito comum que após a cirurgia plástica, então a paciente diga que existe um defeito, quando na verdade ele não está presente. Entretanto, pode ocorrer que, apesar o médico ter utilizado produtos de qualidade, a fim de obter o resultado almejado, porém este possuía um vício oculto, ou seja, um vício redibitório de difícil percepção e o médico não poderá ser responsabilizado pelo dano causado, pois empregou todos os preceitos previstos no protocolo e agiu com perfeição e cautela, porém o fabricante irá ser chamado para responder pelo dano causado ao paciente.

RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ERRO MÉDICO. ART. 14 DO CDC. CIRURGIA PLÁSTICA. OBRIGAÇÃO DE RESULTADO. CASO FORTUITO. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE. 1. Os procedimentos cirúrgicos de fins meramente estéticos caracterizam verdadeira obrigação de resultado, pois neles o cirurgião assume verdadeiro compromisso pelo efeito embelezador prometido. 2. Nas obrigações de resultado, a responsabilidade do profissional da medicina permanece subjetiva. Cumpre ao médico, contudo, demonstrar que os eventos danosos decorreram de fatores externos e alheios à sua atuação durante a cirurgia. 3. Apesar de não prevista expressamente no CDC, a eximente de caso fortuito possui força liberatória e exclui a responsabilidade do cirurgião plástico, pois rompe o nexo de causalidade entre o dano apontado pelo paciente e o serviço prestado pelo profissional. 4. Age com cautela e conforme os ditames da boa-fé objetiva o médico que colhe a assinatura do paciente em ?termo de consentimento informado?, de maneira a alertá-lo acerca de eventuais problemas que possam surgir durante o pós-operatório. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (REsp 1180815/MG Rel. Min Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado 19/08/2010)

Entretanto, o advogado deve observar os seguintes pontos importantes:

I- A obrigação nas cirurgias meramente estéticas é de resultado, comprometendo-se o médico como efeito embelezador prometido.

II- Embora a obrigação seja de resultado, a responsabilidade do cirurgião plástico permanece subjetiva, com inversão do ônus da prova (responsabilidade com culpa presumida). Portanto, não é responsabilidade objetiva.

III- O caso fortuito e a força maior, apesar de não estarem expressamente previstos no CDC, podem ser invocados como causas excludentes de responsabilidade. STJ.4ªTurma. REsp985.888-SP, Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 16/2/2012.

Contudo, na questão relacionada ao cirurgião plástico que pratica uma cirurgia reparadora, então está sendo observada a responsabilidade objetiva, visto que ele possui obrigação de “meio” e não de “resultado” e, dessa forma, deverá utilizar a melhor técnica para atender o paciente.

Dessa forma, caso esteja sendo acusado de erro médico, então o advogado deverá dizer que não foi comprovada a negligência, imprudência e imperícia na conduta do médico durante a intervenção cirúrgica, assim afirmar que foi seguido o preconizado no protocolo médico para o caso em litígio, obviamente, caso seja esta a realidade dos fatos.

Portanto, o advogado deverá observar o caso jurídico e analisar qual o objetivo da cirurgia plástica, ou seja, o profissional da saúde estava realizando uma intervenção reparadora ou embelezadora e, a partir desse ponto, defender o médico, segundo as possibilidades apontadas acima. Entretanto, não se pode esquecer a importância do paciente assinar o Termo de Consentimento Informado (TCI), antes da intervenção cirúrgica, a fim de isentar o médico de responder por danos morais pela sua não apresentação, caso ocorra problemas relacionados ao erro médico.

___________

*Eduardo C. da Silva é advogado que atua em direto médico.

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