Migalhas de Peso

Canetadas do Judiciário trabalhista

Ao que parece, estas canetadas tem uma única finalidade: fomentar e retroalimentar esta exagerada judicialização, que entre outras funções, justifica cada vez mais uma Justiça obesa, com mais varas, com mais juízes, com mais servidores e, com mais prédios.

8/3/2019

Ainda que a reforma trabalhista tenha restringido o poder legislativo dos Tribunais do trabalho, continuamos a ser surpreendidos por sentenças que contrariam a legislação, inclusive na área de segurança e saúde no trabalho – SST, que se trata de matéria técnica.

Às vezes me pergunto, para que realizar uma perícia, se os Tribunais Superiores irão decidir em sentido contrário? Não faço referência às perícias controversas, às perícias tendenciosas e nem às perícias que manifestamente opinam contrariamente aos preceitos da legislação, mas aos trabalhos periciais que observam os fundamentos técnico-legais da SST e acabam sendo reformados em instâncias superiores.

A partir do momento que uma decisão judicial contraria o disposto na legislação, fica instaurada a insegurança jurídica, especialmente para as empresas, que não sabem qual norte seguir, se cumprem a legislação ou observam as sentenças judiciais.

Especificamente na área de SST, as canetadas são frequentes, a exemplo de: (i) periculosidade por inflamáveis, baseado no fato de que o veículo possui tanque adicional, (ii) insalubridade por frio em razão do trabalhador respirar ar frio (o ar inspirado é aquecido pelas vias respiratórias); (iii) periculosidade por inflamáveis em tubulações contendo inflamáveis (tubulações não possuem capitulação legal); (iv) periculosidade por inflamáveis para instrutor de frentista que realizava até seis abastecimentos mensais; (v) insalubridade por agentes biológicos pela higienização de sanitários de uso público ou coletivo de grande circulação, e a respectiva coleta de lixo ou por trocar fraldas de bebês; (vi) insalubridade por agentes biológicos de grau médio a porteiro de centro de saúde em razão do contato com pacientes portadores de doenças infectocontagiosas e, tantas outras situações que ocorrem.

Porém, os exemplos não estão restritos à área de SST. Em recente decisão do TST, foi permitido que os trabalhadores ingressassem com ações trabalhistas contra os empregadores na cidade em que residem, e não na cidade onde as empresas têm sede ou filial. A decisão foi polêmica, eis que exigirá deslocamento de advogados, dificultando a defesa judicial das empresas e aumentando seus gastos.

Segundo o artigo 651 da CLT, o trabalhador tem de ingressar com a ação no local em que prestou serviço, independentemente de ter sido contratado em outra localidade.

Numa flagrante flexibilização em favor do trabalhador, o TST interpretou criativamente o artigo 651 da CLT, comprometendo a igualdade processual entre as partes e, principalmente criando a incerteza para as empresas. Se há incerteza, as empresas não investem, se não há investimentos, não há empregos, simples assim.

Outra recente decisão do TRT da 2ª região, contrariando a reforma trabalhista, validou a instituição da contribuição sindical de toda a categoria por meio de assembleia, quando o art. 579 da CLT prescreve que tal contribuição está condicionada à autorização prévia e voluntária do empregado. O abuso chegou a tal ponto que obrigou o governo a editar a MP 873, de 1/3/19, determinando que o recolhimento da contribuição sindical será feito exclusivamente por meio de boleto bancário ou equivalente eletrônico.

Mais grave ainda é não se cumprir o combinado. Já dizia o adágio popular: "o combinado não é caro". A reforma trabalhista estabeleceu primazia do negociado sobre o legislado. No entanto, na maioria das vezes, os juízes trabalhistas anulam os acordos entre as partes, com base na Justiça social. Mais uma vez é instaurada a insegurança para os investidores.

Cada vez mais o Brasil está eivado de incertezas, especialmente no plano jurídico, deixando os investidores temerosos não somente quanto ao futuro, mas também quanto ao presente e ao passado. Investidores temerosos acarretam investimentos cancelados, contratos não assinados, projetos que não saem do papel e, consequentemente, empregos não são criados.

O próprio Judiciário trabalhista também tem se tornado fator de insegurança jurídica, na medida em que suas decisões não são uniformes e, muitas vezes destoam da lei, deixando os empresários reféns de uma situação sobre a qual não conseguem administrar.

Mais grave ainda é o viés ideológico interferindo na formação da convicção do magistrado, o que jamais poderia acontecer. Juiz não deve ter ideologia, suas convicções pessoais devem ficar fora da sala de julgamento.

Ao que parece, estas canetadas tem uma única finalidade: fomentar e retroalimentar esta exagerada judicialização, que entre outras funções, justifica cada vez mais uma Justiça obesa, com mais varas, com mais juízes, com mais servidores e, com mais prédios.

Enquanto se perdurar esta situação, empresários e investidores, inclusive externos, continuarão na defensiva, decidindo com bastante parcimônia e, em consequência, o desenvolvimento do país sofre os reflexos destas canetadas do Judiciário trabalhista.

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*Antonio Carlos Vendrame é diretor da Vendrame Consultores.

 

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