Como sabemos, a lei 13.467/17 (reforma trabalhista), instituiu ao processo do trabalho a figura dos honorários sucumbenciais, modelo que até então, pelo menos nas relações de emprego, era vilipendiado pela doutrina jus laboral.1 Tal introdução acabou por alterar todo paradigma doutrinário e jurisprudencial até então existente, o que nos alçou, novamente, as subjetividades das interpretações sobre a nova legislação, não somente na aplicação da nova sistemática, que a priori nos parece simples, mas também sobre seus ensejos mais complexos, como a amplitude de seus reflexos em toda cadeia processual.
Chegamos a este epílogo, de uma forma que nos parece tão logica quando óbvia. A reforma trabalhista não extinguiu a possibilidade de prestação de assistência judiciária gratuita ao empregado pelo seu sindicato profissional, nesse caso, os honorários estipulados em eventual sentença judicial continuariam sendo denominados de assistenciais e ao sindicato reverteriam, permanecendo inclusive a exigibilidade de credenciais sindicais para sua aplicação.
Ocorre que, em 4 de outubro de 2018, sobreveio ao ordenamento jurídico a lei 13.725, que revogou o art. 16, da lei 5.584/70, que assim dispunha: “Os honorários do advogado pagos pelo vencido reverterão em favor do sindicato assistente.”
Destarte, não mais nos cabe buscar exegeses sobre a coexistência dos dois institutos (sucumbenciais e assistenciais), mas sim, sobre a própria subsistência dos honorários assistenciais. Isto porque, a partir desta normativa exposta, cai por terra, o ultimo pilar que ainda distinguia os honorários assistenciais dos sucumbenciais na justiça jus laboral, que era o seu destino, antes revertidos ao sindicado e doravante revertidos ao advogado.
Cabe referir que a lei 13.725/18 também trouxe alterações ao Estatuto da Advocacia e a OAB (lei 8.906/94), mais precisamente ao seu art. 22, ao qual restaram acrescidos mais dois incisos, in verbis:
§ 6º O disposto neste artigo aplica-se aos honorários assistenciais, compreendidos como os fixados em ações coletivas propostas por entidades de classe em substituição processual, sem prejuízo aos honorários convencionais.
§ 7º Os honorários convencionados com entidades de classe para atuação em substituição processual poderão prever a faculdade de indicar os beneficiários que, ao optarem por adquirir os direitos, assumirão as obrigações decorrentes do contrato originário a partir do momento em que este foi celebrado, sem a necessidade de mais formalidades.” (NR)
Os dispositivos inseridos no bojo do EOAB, objetivaram em suma, viabilizar o recebimento cumulativo, pelos advogados de sindicatos e associações dos honorários contratuais e de assistenciais, para isto o projeto teve que alterar o Estatuto da Advocacia e revogar o art. 16 da lei 5.584/70.
Contudo, entendemos que, pelos termos positivados na lei, esta cumulação ficará restrita as situações em que as entidades de classe atuarem em substituição processual. Ou seja, é possível que o sindicato, atuando em substituição processual, venha a cumular verba honoraria contratual (art. 22 EOAB) e verba honoraria assistencial, sendo que a verba assistencial não mais se destinará ao sindicato, e sim ao advogado patrono da ação.
Sobre a cumulação dos honorários contratuais e assistenciais nas lides em que o sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador atua como assistente judicial a que se refere a lei 1.060, de 5 de fevereiro de 1950, em nosso sentir, continua a não caber quaisquer cumulações de verbas honorarias. Isto porque, nem o advogado dativo,4 nem o advogado com credencial sindical,5 e tampouco o defensor público,6 estariam autorizados a convencionar honorários contratuais. Nosso entendimento é de que este procedimento seria incompatível com o princípio da gratuidade. A consequência lógica é que o reclamante não pode se valer da assistência judiciária e ainda assim contratar o pagamento de honorários com seu procurador.
Desta forma, permitir que o procurador daquele que litiga sob o amparo do benefício da assistência judiciária gratuita receba, além dos honorários assistenciais, também honorários contratuais, desvirtua a finalidade da norma, no sentido de que a assistência judiciária é gratuita ao assistido (5º, inc. LXXIV da CF) e o próprio instituto da assistência judiciária trabalhista, pois o trabalhador não pode ser hipossuficiente perante o estado e possuir recursos perante seu patrono.
Superada estas diminutas divagações acerca das cumulações —inevitáveis para uma compreensão mais profusa do instituto — nos parece forçoso concluir que ante a supressão do art. 16 da lei 5.584/70, não há mais qualquer diferença pragmática entre a verba honoraria sucumbencial e a verba honoraria assistencial, isto porque, já derivavam basicamente da mesma causa: a sucumbência (a súmula 219 do TST nunca afastou a natureza jurídica sucumbencial dos honorários assistenciais, apenas estabeleceu que os mesmos não decorreriam da pura e simples sucumbência, criando assim um mecanismo que podemos chamar de sucumbência qualificada). Doravante, as verbas passam a ter também, os mesmos destinos (advogados).
Assim, a partir da lei 13.725/18, nas lides em que as entidades de classe atuarem em substituição processual, restar-se-á autorizado que advogados de sindicatos e associações possam receber, cumulativamente, os honorários contratados com a entidade que representam e os honorários de sucumbência assistenciais, devidos pela parte vencida ao vencedor da causa. Já nas lides em que o sindicato da categoria profissional a que pertencer o trabalhador atuar como assistente judicial, se deferido os honorários assistenciais como espécie, em sobreposição pela figura sucumbencial pura, restará vedada ainda, nesta hipótese, a pactuação de honorários contratuais.
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1 Nas lides que não derivem de relação de emprego, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários advocatícios da sucumbência já se submetia à disciplina do CPC, inteligência da Súmula 219, IV do TST.
2 SILVEIRA, Kleber Correa da. DA NÃO CUMULAÇÃO ENTRE HONORÁRIOS ASSISTENCIAIS E HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS: UMA ANÁLISE APÓS A LEI 13.467/17. LTr Suplemento Trabalhista. São Paulo, v. 54, n. 034, p. 181-182, maio. 2018.
3 A cumulação ora referida, por obvio trata-se da cumulação no mesmo polo processual, vez que não haverá óbice de que honorários sucumbenciais e assistenciais coexistam no mesmo processo, aliás, doravante esperasse que tal hipótese tornar-se-á comum as lides trabalhistas.
4 Se o advogado aceitou o encardo não seria possível a cobrança por força da própria Lei 10.060/50, que em seu Art. 15, arrola motivos para recusa.
5 AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NA JUSTIÇA DO TRABALHO. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO. CUMULAÇÃO INDEVIDA DE HONORÁRIOS DE ASSISTÊNCIA SINDICAL E HONORÁRIOS CONTRATUAIS. 1. Não se dá provimento a agravo regimental que não desconstitui os fundamentos da decisão agravada. 2. No caso em apreciação, o Tribunal Regional entendeu não ser devida cumulação dos honorários de assistência sindical (15%) e honorários contratuais (30%), vinculados ao êxito da demanda. Adotou como fundamento a premissa de que, se o trabalhador procura o sindicato em busca de assistência judiciária gratuita, não é razoável que o advogado contratado pela entidade sindical cobre do hipossuficiente quaisquer valores. 3. Assim, a condenação em honorários assistenciais, com fundamento na Lei n° 5.584/70, ao eleger como um de seus requisitos a hipossuficiência, não justifica a cumulação com honorários contratuais, porque incompatível com a legislação trabalhista, sem perder de vista a boa-fé que deve nortear a relação entre advogado e cliente. 4. Esclareça-se que o art. 22 da Lei n° 8.906/94, tido como violado, sequer cogita de cumulação de honorários assistenciais e contratuais, de modo a tornar inviável a revisão pretendida. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgR-AIRR - 75740-58.2007.5.09.0093. Relator Ministro: Walmir Oliveira da Costa, Data de Julgamento: 26/09/2012, 1a Turma, Data de Publicação: DEJT 28/09/2012). (Grifo nosso).
6 LC 80/94 Art. 46. Além das proibições decorrentes do exercício de cargo público, aos membros da Defensoria Pública da União é vedado:
[...]
III - receber, a qualquer título e sob qualquer pretexto, honorários, percentagens ou custas processuais, em razão de suas atribuições;
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*Kleber Correa da Silveira é analista jurídico no escritório Andrade Maia Advogados. Membro-pesquisador do Grupo de Pesquisa – O Direito do Trabalho e Mundo Contemporâneo da UFRGS cadastrado junto ao CNPq. Membro da RENAPEDTS - Rede Nacional de Pesquisa em Direito do Trabalho e Previdência Social.