Desde 2015, o Brasil conta com legislação que regulamenta o acesso (i) ao patrimônio genético oriundo das espécies nativas do país, bem como (ii) aos conhecimentos tradicionais associados (como, por exemplo, conhecimentos detidos por comunidades indígenas). A lei 13.123, de 20 de maio de 2015, complementada pelo decreto 8.772/16, ficou conhecida como Marco da Biodiversidade e, desde a sua promulgação, vem sendo objeto de regulamentação mais detalhada quanto a algumas das suas disposições.
Outros temas ainda estão pendentes de regulação. O Marco da Biodiversidade determina duas obrigações a serem cumpridas por todos que tenham acessado o patrimônio genético e/ou conhecimentos tradicionais brasileiros: (i) notificar tal acesso ao CGEN e (ii) repartir os benefícios econômicos obtidos com a exploração do recurso com as comunidades tradicionais associadas ou, na ausência de identificação destas, com um fundo instituído pelo Ministério do Meio Ambiente (Fundo Nacional para Repartição de Benefícios – FNRB). Uma das condições para que esta segunda obrigação seja imposta é que a utilização do recurso da biodiversidade agregue valor ao produto final.
Até recentemente, o setor de fragrâncias vinha discutindo a aplicação do critério de “agregação de valor” pelo insumo advindo de um componente da biodiversidade. De fato, em muitos casos, os insumos utilizados não são percebidos de forma relevante no produto acabado. O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen) já vinha tratando do assunto, como ocorrido na 17ª Reunião em Brasília dias 19 e 20 de junho.
Essa questão acaba de ser solucionada. Em 29/8/18, foi a publicada no Diário Oficial a Orientação Técnica CGEN/MMA 6, de 20/6/18, que esclarece o conceito de “agregação de valor ao produto” no segmento de fragrâncias.
De acordo com a nova normativa, “consideram-se ‘elementos principais de agregação de valor’ os ingredientes (...) que determinem a família olfativa predominante da fragrância utilizada no produto acabado”, de forma que o insumo oriundo do patrimônio genético seja usado na fórmula “exclusivamente para formação de seu cheiro”. Nos casos em que a família olfativa da fragrância do componente da biodiversidade é diferente daquela família olfativa do produto acabado, a utilização do insumo do patrimônio genético não é considerada como “agregadora de valor” e não gera a obrigação de repartir benefícios.
Exemplo de possível isenção seria o caso de um produto acabado cuja fragrância seja da família olfativa ‘A’, mas que, em sua composição, tenha utilizado vários componentes, dentre eles um oriundo da biodiversidade brasileira, da família ‘B’, como mero coadjuvante, não sendo predominante no cheiro do produto acabado.
Portanto, nos casos em que o cheiro final do produto percebido pelo consumidor não resulte de componente do patrimônio genético brasileiro, o fabricante não estará obrigado a repartir benefícios, seja diretamente com as comunidades tradicionais associadas ou por meio de recolhimento ao FNRB os montantes estabelecidos pela lei.
A tão esperada publicação da Orientação Técnica 6 trouxe mais clareza e segurança jurídica à indústria de cosméticos.
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