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Planejamento tributário e multa agravada

Discute-se atualmente no Conselho de Contribuintes se os tributos federais devidos nas operações realizadas com objetivo de planejamento tributário devem ou não ser exigidos com o acréscimo da multa agravada. Com efeito, enquanto nos casos normais de falta de recolhimento de tributo a multa a ser aplicada nos lançamentos de ofício é de 75%, nos casos de sonegação, fraude ou conluio a legislação prevê que a multa pela falta de recolhimento de tributo deve ser agravada para 150%.

17/8/2006


Planejamento tributário e multa agravada

João Francisco Bianco*

Discute-se atualmente no Conselho de Contribuintes se os tributos federais devidos nas operações realizadas com objetivo de planejamento tributário devem ou não ser exigidos com o acréscimo da multa agravada. Com efeito, enquanto nos casos normais de falta de recolhimento de tributo a multa a ser aplicada nos lançamentos de ofício é de 75%, nos casos de sonegação, fraude ou conluio a legislação prevê que a multa pela falta de recolhimento de tributo deve ser agravada para 150%.

A sonegação é definida (artigos <_st13a_metricconverter w:st="on" productid="71 a">71 a 73 da Lei nº 4.502/64 - clique aqui) como a “ação ou omissão dolosa, tendente a impedir o conhecimento por parte da autoridade fazendária da ocorrência do fato gerador do tributo”. A fraude, por sua vez, é definida como a “ação ou omissão dolosa tendente a impedir a ocorrência do fato gerador do tributo”. E o conluio é o “ajuste doloso entre duas ou mais pessoas, visando a obter qualquer dos efeitos próprios da sonegação ou da fraude”.

Como se vê, a fraude é o instituto que pode estar, em tese, mais diretamente relacionado com os casos de planejamento tributário. Isso porque a sonegação – que tem por objetivo ocultar da fiscalização os negócios jurídicos praticados - nitidamente não se aplica a esses casos, que são sempre realizados às claras e não escondidos.

Concentremos nossa atenção, então, no exame do conceito de fraude. Não é toda e qualquer ação praticada com o objetivo de impedir a ocorrência do fato gerador do tributo que pode ser qualificada como fraude. Se o contribuinte resgata uma aplicação financeira <_st13a_personname w:st="on" productid="em um CDB">em um CDB (tributada) para investir em uma caderneta de poupança (não tributada), está praticando uma ação tendente a impedir a incidência do imposto de renda na fonte sobre os juros pagos pelo CDB. Esse tipo de atitude não pode caracterizar fraude porque se trata de um ato normal de gestão, que se insere no âmbito da liberdade que o contribuinte tem para realizar ou não os negócios que podem ensejar a incidência de tributos.

O que caracteriza a fraude, portanto, do ponto de vista fiscal, é o dolo. Fraude, conforme legalmente definido, é a ação ou omissão dolosa tendente a impedir a ocorrência do fato gerador do tributo. O procedimento acima descrito não foi doloso. Logo, não pode ser caracterizado como fraudulento.

E o que vem a ser dolo? Existem no direito dois tipos de dolo: o dolo civil e o dolo penal. O dolo civil é o artifício enganoso, malicioso, de má fé, utilizado por uma pessoa para induzir alguém à prática de um ato em seu prejuízo, que jamais seria praticado caso a realidade fosse de seu pleno conhecimento. Já o dolo penal é definido como sendo a vontade ou a intenção do agente de praticar o ato definido como crime. É a plena consciência de que o ato praticado irá ocasionar o resultado delituoso.

Pois bem. Quando a lei fiscal define a fraude como o ato doloso, tendente a impedir a ocorrência do fato gerador do tributo, está se referindo ao dolo civil ou ao dolo penal?

Tenho para mim que o dolo de que trata esse dispositivo é exclusivamente o penal. Isso porque, embora a fraude e o dolo civil estejam muito próximos, pois as características da primeira - a malícia, o engano, a ação astuciosa de má fé - estão todas elas presentes no segundo, o fato é que ambos são institutos que não se confundem nem se complementam. Na verdade, fraude e dolo civil são duas espécies distintas do gênero defeitos dos negócios jurídicos, conforme previsto no artigo 138 do Código Civil.

Fraude dolosa (na acepção do direito civil), portanto, seria uma impropriedade técnica semelhante ao, por exemplo, mútuo comodante, pois mutuo e comodato são duas espécies independentes e autônomas do gênero empréstimo. Simplesmente esse instituto não existe. Assim, concluir pela existência da fraude dolosa é absurdo semelhante a sustentar a existência do mútuo comodante. Não existe a possibilidade da mistura de dois institutos diferentes para formar um terceiro ou para qualificar um deles.

Assim, a única conclusão possível é que o dolo presente na definição de fraude é aquele definido pelo direito penal. Necessariamente, portanto, a fraude fiscal é aquela caracterizada pela prática de uma ação ou omissão intencionalmente criminosa, tendente a impedir a ocorrência do fato gerador do tributo. É a falsificação de documento, é a emissão de nota fiscal espelhada ou calçada, é a adulteração de documentos contábeis, é a venda de mercadorias sem documentação fiscal, é o lançamento nos livros fiscais de documento inidôneo etc.

Desse modo, as operações de planejamento tributário - que não envolvam a prática de qualquer espécie de ação tipificada na lei penal como delituosa - não podem ser caracterizadas como fraude fiscal, não se justificando a aplicação da multa agravada de 150% pelo fisco federal. A mesma conclusão se impõe para as ações que envolvam a prática de qualquer ato simulado, pois a simulação é um ilícito civil e não penal.

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*Advogado do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados

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