Migalhas de Peso

Constituinte exclusiva

O governo e especialmente o Presidente da República têm demonstrado interesse em promover uma reforma política por meio de uma constituinte exclusiva. Este fato, aliado ao crescimento das preferências manifestadas pelos eleitores nas últimas pesquisas de intenções de voto, é preocupante para quem pretende ver consolidado em nosso País o Estado Democrático de Direito, porque se trata do que pode ser um prenúncio de retrocesso nos mecanismos institucionais ainda frágeis de nossa democracia.

16/8/2006


Constituinte exclusiva

 

Hugo de Brito Machado*

 

O governo e especialmente o Presidente da República têm demonstrado interesse em promover uma reforma política por meio de uma Constituinte exclusiva. Este fato, aliado ao crescimento das preferências manifestadas pelos eleitores nas últimas pesquisas de intenções de voto, é preocupante para quem pretende ver consolidado <_st13a_personname productid="em nosso País" w:st="on">em nosso País o Estado Democrático de Direito, porque se trata do que pode ser um prenúncio de retrocesso nos mecanismos institucionais ainda frágeis de nossa democracia.

 

A proposta de instalação de uma Constituinte para fazer a reforma política pode albergar uma cilada perigosa. A idéia de reforma política certamente conta com o aplauso geral dos brasileiros e a idéia de constituinte exclusiva é também uma excelente idéia, certamente aplaudida por todos. Nas atuais circunstâncias, porém, tem um cheiro de golpe contra as instituições.

 

Como adverte Hugo de Brito Machado Segundo (Migalhas de peso - 8/8/2006 - "Nova Constituinte" - clique aqui), os que defendem a instalação de uma Constituinte para fazer a reforma política cometem um grave equívoco ao confundirem poder Constituinte com poder reformador. E o que é pior, apontam como nefastas para o País as Constituintes realizadas no âmbito do Congresso, que produziram as constituições de 1891, 1934, 1946 e 1988, sabidamente as democráticas.

 

Poder Constituinte não se confunde com poder reformador. O primeiro pertence ao povo, seu funcionamento pressupõe situação de anormalidade jurídica com a ruptura do ordenamento normativo, e tem existência transitória. Como o próprio nome indica, destina-se a constituir as instituições básicas do Estado. Executado o seu trabalho desaparece, ou entra em estado de letargia, passa a existir apenas potencialmente, se assim se pode dizer. Já o segundo, o poder reformador, é obra do primeiro e se submete ao regramento jurídico por ele estabelecido. No caso brasileiro o poder reformador está submetido às limitações estabelecidas na Constituição Federal e delas não se pode afastar seja a que pretexto for. Como a Constituição não prevê a instalação de Constituinte exclusiva, a idéia tem todas as conotações de violação da Constituição.

 

Por outro lado, se for admitida a instalação de uma assembléia Constituinte exclusiva para substituir o Congresso Nacional na sua tarefa de poder reformador da Constituição, quem fixará limites para as atribuições desse órgão excepcional? Não podemos esquecer os exemplos de governantes na América do Sul que, recentemente, utilizaram a convocação de Constituinte como forma de garantir sua permanência no poder. O Presidente da República pode estar preparando, a pretexto de realizar uma reforma política por quase todos desejada, estabelecer, sem atropelos porque sua reeleição a esta altura parece estar praticamente garantida, fórmula que permita a sua permanência no poder por mais alguns anos.

 

É verdade que teria sido melhor uma Constituinte exclusiva para elaborar a Constituição de 1988 e assim concluir a transição da ditadura militar para a democracia. Talvez tivéssemos hoje uma Constituição bem melhor. Mais apta a preservar os interesses da sociedade. Menos vulneráveis às emendas que infelizmente já desfiguraram a obra do Constituinte de 1988. E é verdade também que estamos precisando de uma reforma política. Mesmo assim não podemos admitir a ruptura da ordem jurídica para a instituição de uma assembléia Constituinte. Como adverte Hugo Segundo, o efeito colateral do remédio, no caso, talvez seja muito pior que a doença e termine por matar o doente. É preferível, portanto, o remédio convencional. A reforma política realizada pelo Congresso Nacional, que terá sua composição modificada na próxima eleição. Se não vier uma reforma tal como desejamos, poderemos ter outra. E outra. Sempre nos moldes previstos. Sem rupturas disfarçadas cujas conseqüências geralmente são imprevisíveis e quase sempre lamentáveis.

 

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*Professor Titular de Direito Tributário da UFC e Presidente do ICET - Instituto Cearense de Estudos Tributários







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