A atuação dos contribuintes, no caso específico dos acordos interestaduais, que versam sobre ICMS, está restrita, praticamente, a providências relativas às situações já consolidadas. Uma das recentes evidências foi o STF suspender, por meio de medida cautelar concedida pela ministra Cármen Lúcia, cláusulas do convênio ICMS 52/17, com destaque à previsão de base dupla para apuração do ICMS, tanto na diferença entre alíquotas como no imposto devido por substituição tributária.
Importa lembrar que, apesar de São Paulo e Pernambuco não serem signatários do convênio ICMS 13/97, o aludido acordo foi firmado entre os demais estados. O STF julgou improcedente a ADIn 1851, ajuizada pela CNC, contra a cláusula segunda desse convênio, garantindo a sua constitucionalidade, ao tratar o fato gerador presumido como definitivo. Estimulados por essa decisão, os estados ampliaram, de forma significativa, os produtos enquadrados no regime de substituição tributária para frente nas operações interestaduais.
Interposto o RE 593849, por contribuinte de Minas Gerais, com repercussão geral reconhecida, o mesmo STF alterou seu entendimento sobre o regime de substituição tributária do ICMS. Decidiu a Suprema Corte que não há a definitividade do fato gerador presumido, cabendo a restituição do ICMS pago a mais no regime de substituição tributária para frente, se a base de cálculo efetiva da operação for inferior à presumida.
O que se observava, nesses casos e em muitos outros, é a atuação dos contribuintes na adiantada etapa das ações repressivas ou? como no caso do convênio 52/17? chamados para corrigir as aludidas cláusulas suspensas no âmbito da Comissão Técnica Permanente (COTEPE).
Por mais diligentes que sejam os contribuintes e seus representantes, não há tempo entre as conclusões das reuniões da COTEPE e do Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), para que os contribuintes possam expor suas razões relativas ao que vai ser deliberado pelo CONFAZ ou mesmo contribuir com os trabalhos que lhe antecedem na preparação de Convênios ou Protocolos com dispositivos mais apropriados e justos para os contribuintes, sem deixar de observar os interesses dos estados. Os acordos interestaduais para fixar obrigações acessórias e sobre substituição tributária são firmados, portanto, dentro de uma visão praticamente unilateral.
Segundo dados do site do CONFAZ, apenas nos últimos três anos, foram firmados 855 acordos interestaduais sobre ICMS, uma média de aproximadamente 23 acordos mensais, que incluem Substituição Tributária Interestadual, alterações, adesões, benefícios fiscais e um vasto número de obrigações acessórias.
É preciso que os contribuintes, por meio de especialistas indicados pelos seus órgãos representativos, possam selecionar, de acordo com a importância de cada matéria, as reuniões técnicas que precedem a do CONFAZ, acompanhando os estudos e a elaboração das normas que serão compreendidas nos acordos interestaduais. Com o passar do tempo, essas consultas e colaborações, recíprocas entre os representantes dos estados e dos contribuintes, passarão a ser naturais.
Além do mais, o grupo de especialistas, indicado pelos representantes dos contribuintes, poderia efetuar trabalhos técnicos que fundamentariam melhor as decisões do CONFAZ, a exemplo da compilação e avaliação periódica da Margem de Valor Agregado ou do preço final de venda a varejo de cada produto enquadrado no Regime de Substituição Tributária Interestadual (previsão constante da lei complementar 87/96, em seu art. 8º, §4º).
A voz dos contribuintes, ainda mais sem direito a voto, nos aludidos trabalhos antecedentes à deliberação dos acordos interestaduais não tem como mitigar a aplicação do Art. 5º, inciso XXXV da CF/88 , in verbis: "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Os acordos interestaduais continuarão a ser firmados e esperar que os estados? a exemplo de Santa Catarina?, de certa forma, abandonem o regime de substituição tributária em razão das últimas decisões do STF é uma avaliação amadora. Envolvidos na vital necessidade de receita, os governadores deverão percorrer novas trilhas para superar essas dificuldades, conforme o ocorrido no advento da Emenda Constitucional 3/93, ao introduzir o §7º no art. 150 da CF/88, quando não mais se sustentava o regime de substituição tributária, ao exigir o imposto antes da ocorrência do fato gerador.
As decisões recentes do STF são favoráveis à garantia dos direitos constitucionais dos contribuintes do ICMS. Todavia, além das oscilações na jurisprudência dessa Corte, é preciso considerar que estamos próximos de uma eleição presidencial com possíveis reflexos e modificações na estrutura e funcionamento dos órgãos que compõem os três poderes. Ao mesmo tempo, as recentes correções realizadas pelo Judiciário nas decisões do CONFAZ contribuem para demonstrar, aos governadores, a necessidade de criar uma relação institucional entre os órgãos representativos dos contribuintes e os grupos técnicos que elaboram, estudam e levam aos Secretários de Fazenda dos estados as conclusões sobre a viabilidade técnica e jurídica dos acordos a serem firmados no âmbito do CONFAZ.
Não é demais lembrar que os estudos sobre as propostas de reforma tributária passam, também, pelos técnicos que compõem os grupos da COTEPE. Uma relação institucional habitual, integrada e produtiva entre os contribuintes e os estados, no âmbito do CONFAZ, certamente poderá contribuir para um desenho do novo sistema tributário que atenda melhor aos interesses de toda a sociedade.
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*Ângelo Pitombo é advogado tributarista.