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As novas regras que impõem restrições para compensação de tributos federais (IN RFB 1.765/17 e lei 13.670/18) e seu descompasso com a ordem jurídica

Contribuintes de todo o país têm acionado o Poder Judiciário para mais uma vez buscarem o reconhecimento de seus direitos fundamentais.

13/7/2018

A compensação de tributos federais é prática amplamente utilizada pelos contribuintes, e realiza-se por meio da apresentação de um documento denominado PER/DComp (Pedido Eletrônico de Restituição, Ressarcimento ou Reembolso e Declaração de Compensação), preenchido pelo contribuinte e entregue eletronicamente à Receita Federal, via internet.

 

A compensação de tributos federais é disciplinada pela lei 9.430/96. Seu artigo 74 traz as regras gerais para a compensação e seu artigo 6°, inciso II, autoriza, especificamente, que os saldos negativos apurados em 31 de dezembro podem ser compensados com débitos dos mesmos ou de outros tributos, segundo as regras gerais.

 

De acordo com o artigo 74 da mencionada lei, os créditos tributários administrados pela Receita Federal, quando apurados pelo contribuinte e passíveis de restituição ou de ressarcimento, inclusive os que são objeto de decisão judicial com trânsito em julgado, , poderão ser utilizados na compensação de débitos próprios relativos a quaisquer tributos e contribuições administrados por aquele órgão.

 

Ainda segundo o mesmo dispositivo legal, a compensação é efetivada com a simples entrega, pelo sujeito passivo, da declaração na qual constarão informações relativas aos créditos utilizados e aos respectivos débitos compensados.

 

A compensação de tributos federais, portanto, independe de prévia autorização pelo órgão fazendário e realiza-se com a mera entrega da PER/DComp pelo contribuinte. Uma vez que o contribuinte tenha efetivamente entregado a PER/DComp, extingue-se o crédito tributário, ficando a compensação, contudo, sujeita a homologação. A Receita Federal tem um prazo de 5 anos para promover a homologação; caso não o faça, o crédito tributário fica extinto definitivamente.

 

Ocorre que, recentemente, temos observado tentativas de dificultar determinados tipos de compensação.

 

 

Em 2017, a Receita Federal publicou a IN RFB 1.765/17, que estabeleceu novas regras para a compensação dos créditos decorrentes de saldos negativos de IRPJ e CSLL.

 

Os denominados "saldos negativos" são créditos da pessoa jurídica, oriundos do valor pago à maior a título de IRPJ e CSLL, na modalidade lucro real, durante o ano, por meio das antecipações mensais obrigatórias, o que se verifica ao término de cada exercício fiscal. Esse valor excedente pode ser compensado com IRPJ e CSLL ou com outros tributos federais, por meio de PER/DComp.

 

A partir da publicação da IN RFB 1.765/17, para autorizar a compensação dos saldos negativos de IRPJ e de CSLL débitos desses tributos ou outros tributos federais, a Receita Federal passou a exigir que, previamente, tenha sido entregue a ECF – Escrituração Contábil-Fiscal. Isto significa dizer que, se a empresa quiser compensar débitos de tributos federais com créditos de saldos negativos de IRPJ ou de CSLL, tem que, primeiro, entregar a ECF.

 

A data prevista para a entrega da ECF é o último dia de julho do ano seguinte ao do período de referência correspondente, mas o direito de compensar o crédito (saldo negativo) surge a partir da sua apuração, em 31 de dezembro. No entanto, segundo as normas introduzidas pela IN RFB 1.765/17, a compensação do saldo negativo apurado só pode ser feita, para qualquer débito, após o último dia de julho do ano seguinte, se a entrega da ECF ocorrer no último dia do prazo. Se quiser fazer a compensação dos saldos negativos de IRPJ e CSLL antes do último dia de julho, a empresa precisa antecipar a entrega da ECF.

 

A vinculação da compensação dos saldos negativos de IRPJ e CSLL à efetiva entrega da ECF não é exigência da lei 9.430/96 e sua introdução por Instrução Normativa é inconstitucional, já que somente a lei em sentido estrito é que poderia estabelecer condicionamento dessa natureza.

 

Portanto, a Receita Federal, com as novas regras, atropela o princípio da legalidade.

 

Mas, além da limitação ilegalmente imposta pela Instrução Normativa da Receita Federal, houve uma recente alteração legislativa que afetou as compensações de quaisquer créditos tributários com os débitos das antecipações de IRPJ e CSLL.

 

A lei 13.670/18, alterou normas do artigo 74 da lei 9.430, de 1996, determinando que não podem ser objeto de compensação os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do IRPJ e da CSLL.

 

As empresas tributadas pelo lucro real anual, que devem recolher antecipações mensais de IRPJ por estimativa, ficaram impossibilitadas de promover a compensação das antecipações com créditos tributários de qualquer espécie (as empresas tributadas pelo lucro real trimestral e lucro presumido e arbitrado não foram afetadas, porque não recolhem antecipações mensais).

 

As pessoas jurídicas tributadas pelo Lucro Real podem optar, no início de cada ano civil, pelo lucro real anual ou pelo lucro real trimestral. A opção, que se estende para a CSLL, se realiza com o primeiro recolhimento desses tributos feito no ano.

 

Ao optar pelo lucro real trimestral, a pessoa jurídica apura o resultado no último dia de cada trimestre civil e, havendo lucro, recolhe o valor correspondente ao tributo apurado até o último dia útil do mês subsequente.

 

Neste caso, não há previsão de antecipações mensais. Por outro lado, optando pela tributação anual, a pessoa jurídica fica sujeita às antecipações mensais do imposto, calculadas por estimativa, e o ajuste fiscal é feito somente no final do ano, momento em que apura se houve lucro real ou prejuízo fiscal.

 

Sendo assim, o recolhimento mensal por estimativa consiste em uma forma de antecipação do IRPJ e da CSLL, feita somente pelas pessoas jurídicas optantes pelo Lucro Real anual. Seu cálculo tem por base a receita bruta da empresa.

 

Ocorre que a lei 13.670 foi publicada em 30 de maio de 2018, quando as opções pelo lucro real anual ou trimestral já tinham sido feitas, de forma irretratável, e as empresas que planejavam compensar seus débitos de antecipação com seus créditos tributários foram pegas de surpresa.

 

A lei 13.670, ao mudar as regras para a compensação de débitos referentes às antecipações mensais por estimativa, surpreendeu negativamente as pessoas jurídicas que têm créditos tributários a compensar e optaram pelo lucro real anual, contando com a possibilidade, anteriormente existente, de compensar os créditos de pagamentos feitos a maior ou indevidamente com os valores das antecipações de IRPJ e CSLL.

 

As consequências são funestas. Por exemplo, determinada pessoa jurídica que tenha apurado R$ 150.000,00 de antecipação por estimativa no mês de março de 2018 fica impossibilitada de compensar esse débito com um crédito de sua titularidade, relativo a qualquer outro tributo federal. Neste caso, ela estaria obrigada a desembolsar R$ 150.000,00 para a quitação da antecipação de IRPJ, mesmo sendo titular do direito ao crédito tributário decorrente do pagamento indevido ou a maior de tributos federais.

 

Se as pessoas jurídicas que optaram, em 2018, pela tributação do imposto sobre a renda anual soubessem, na época da opção, que, no decorrer do ano, ficariam proibidas de compensar os valores dos tributos recolhidos a maior ou indevidamente com o montante correspondente às antecipações mensais por estimativa, poderiam ter optado pelo lucro real trimestral, uma vez que, para este, nada mudou. No entanto, a alteração da opção, na data da publicação da lei 13.670, já não era mais possível.

 

Muito embora a nova regra seja específica, não atingindo as compensações de créditos com débitos de outros tributos federais, que não sejam aqueles correspondentes às antecipações por estimativa, do IRPJ e da CSLL, optantes pelo lucro real anual, a restrição ora imposta viola a Constituição, uma vez que fere a segurança jurídica, ao surpreender os contribuintes, exigindo deles desembolsos que não poderiam ser previstos no momento estipulado em lei para a opção.

 

Sendo assim, por afrontar a Constituição, o novo dispositivo legal pode ser questionado no Judiciário, ao menos em relação ao ano de 2018, a fim de garantir a compensação até o final do exercício e estabelecer a aplicação da nova regra apenas a partir de 2019.

 

Contribuintes de todo o país têm acionado o Poder Judiciário para mais uma vez buscarem o reconhecimento de seus direitos fundamentais, no bojo das tormentosas relações que envolvem o Fisco brasileiro e os contribuintes e já há notícias de medidas liminares deferidas em favor dos contribuintes.
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*Celia Murphy é advogada do escritório Fogaça, Moreti Advogados.









*Daniel Moreti é sócio do escritório Fogaça, Moreti Advogados.









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