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Honorários advocatícios são devidos nos cumprimentos de sentença nos Juizados Especiais

Enquanto nenhuma medida é tomada em âmbito nacional, necessária a devida discussão dialética entre as partes e o judiciário, fundamentando suas pretensões para conseguir readequar o entendimento hoje uníssono no Judiciário, e reformular a jurisprudência.

11/7/2018

O artigo 523 do CPC disciplina o cumprimento definitivo de sentença que condena alguém ao pagamento de quantia certa, fixando prazo de 15 dias para o pagamento voluntário pelo condenado, o qual nesse momento processual é denominado de devedor ou executado.

No §1° do artigo supracitado, são previstas penalidades para o caso de o executado não realizar o pagamento no prazo do caput, sendo a primeira o acréscimo de uma multa de 10% sobre débito total e atualizado, e a segunda outros 10% sobre o mesmo montante a título de honorários advocatícios.

Trata-se de procedimento e de penalidades já previstas no antigo CPC desde 2005, inclusive já consagradas no âmbito jurisprudencial, sendo como uma mera repetição e consolidação no atual código.

Por sua vez, a lei 9.099/95, que é quase uma codificação, estabelece os ritos e as peculiaridades dos procedimentos processuais nos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, e tem, em seu art. 52, a previsão de que a execução das sentenças proferidas no ambiente dos juizados cíveis e, regidas por essa lei, serão processadas nos mesmos autos e no mesmo juízo, aplicando-se, no que couber, o disposto no CPC, com algumas alterações taxativamente previstas no seu rol de incisos.

Analisando-se exaustivamente o curto rol taxativo de apenas nove alterações em relação ao procedimento de execução, ou cumprimento de sentença previsto no CPC vigente (2015), tem-se claro que nada dispõe sobre multa processual por atraso, tampouco acerca de honorários advocatícios. Ainda assim, fiando-se no art. 55 da lei 9.099/95, os juízes e as turmas recursais do país afastam parcialmente o § 1° do art. 523 do CPC, e determinam a incidência apenas da multa processual de 10%, negando a incidência de honorários na mesma proporção.

Alguns magistrados chegam a citar o enunciado 97 do Fórum Nacional de Juizados Especiais – FONAJE, que caminha no mesmo sentido, ao estabelecer uma suposta vedação a aplicação dos honorários advocatícios de dez por cento nos cumprimentos de sentença dos juizados. Um enunciado meramente argumentativo, sem critérios democráticos ou transparentes, e até mesmo sem a justificativa que possibilitasse o diálogo entre as partes, entre a decisão e um eventual recurso. Logo, também ausente qualquer força vinculante ou natureza jurisprudencial, pois elaborado previamente a discussões processuais, não havendo caso para ser julgado. Ou seja, um embasamento falacioso e vazio.

Ora, os honorários do advogado são totalmente compatíveis com o cumprimento de sentença nos juizados especiais. Isso porque, o art. 55 da lei dos juizados disciplina apenas o processo de conhecimento e a sua fase recursal, dispondo sobre a não condenação de honorários em decisão de mérito do juízo em 1° grau, expressamente a sentença, e exigindo a condenação de honorários em 2° grau, quando o recorrente for vencido.

Não há no supracitado dispositivo, qualquer menção a fase de execução ou cumprimento de sentença, porque não há necessidade, haja vista que a seção XV da lei, específica sobre a execução, já estabeleceu expressamente que o CPC se aplica às execuções dos juizados, apresentando um rol taxativo de exceções, sendo que nele não se encontra nenhuma menção a honorários.

Quando o legislador buscou evitar a incidência de honorários, o fez expressamente na fase de conhecimento em 1° grau conforme art. 55 da lei, e da mesma forma, quando estabeleceu diferenças na execução em relação ao previsto no código processual, também o fez expressamente, estabelecendo-as em rol taxativo do inciso I ao IX do art. 52.

Portanto, manifesto o cabimento e a incidência de honorários do advogado na fase de cumprimento de sentença, no caso de não ocorrer o pagamento voluntário no prazo legal de 15 dias.

Ademais, cabe destaque que a incidência de honorários na fase de cumprimento de sentença não colide com nenhum dos critérios orientadores dos processos nos juizados. Pelo contrário, reforça e aplica a economia processual e celeridade, pois evidente a prevalência da natureza coercitiva, e não sucumbencial, dos honorários do advogado previstos no § 1° do art. 523 do CPC. Tanto é que o único critério legal para sua incidência é o não pagamento no prazo estabelecido pela lei, não tendo que observar nem as porcentagens do § 2°, nem os critérios dos seus incisos, que nada mais são do que valoração da qualidade e do empenho do trabalho do advogado.

Desta forma, evidente que não há qualquer óbice legal, nem mesmo de princípios, à incidência dos honorários do advogado previstos no art. 523, § 1° do CPC nas execuções de sentença dos juizados especiais.

Diante da impossibilidade de, no âmbito dos juizados, interpor recurso ao STJ, que é o órgão competente para analisar a contrariedade ou a negativa de vigência à lei federal, necessário o questionamento ao STF.

No leque de possibilidades de questionamento ao Supremo, a mais adequada seria uma ação constitucional, nos mesmos moldes da ADPF 483, apresentada recentemente pela Ordem dos Advogados para conseguir que os juizados, em outro caso de desrespeito à legislação, observem a contagem de prazos em dias úteis conforme o art. 219 também do código de processo civil atualmente vigente.

Os juizados não podem se tornar um universo soberano, que não respondem à ordem vigente e às leis federais, e permanecerem impunes.

Por ora, enquanto nenhuma medida é tomada em âmbito nacional, necessária a devida discussão dialética entre as partes e o judiciário, fundamentando suas pretensões para conseguir readequar o entendimento hoje uníssono no judiciário, e reformular a jurisprudência.

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*Pablo Vianna Roland é pós-graduado em Direito Tributário e Processual pela PUC/PR.

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