Ainda que pouco explorados, reconhecidamente, os chamados “negócios processuais” são uma das principais inovações do atual CPC. Tal regramento, presente nos artigos 190 e 200, de modo bastante marcante, garante que todos os ônus, deveres, poderes e faculdades processuais podem ser objeto de negociação entre as partes.
Essa oportunidade pode ser celebrada antes e após o início do processo, ou seja, está autorizada a administração prévia de possíveis litígios, ainda que incertos e futuros. Nisso está o principal interesse das próximas linhas.
Para que ocorra esse acordo, basta o seguinte cuidado das partes: ao contratarem determinado objeto, simultaneamente, estarem dispostas a disciplinarem aspectos processuais. Desse modo, disposições de natureza processual acerca de um possível litígio, independentemente desse vir a existir ou não, irão, consensualmente, virar matéria pactuada naquela relação contratual. Evidentemente, tanto melhor, em momento de harmonia, exista liberdade para os contratantes, no sentido de adotarem mecanismo contratual capaz de definir procedimentos aplicáveis em um momento revestido de natural turbulência. É que, quando já estabelecido o litígio, naturalmente, a propensão ao consenso fica largamente prejudicada.
O negócio pré-processual, como não poderia deixar de ser, exatamente pelo momento prévio, dispensa a participação de um julgador. Não está legitimado, contudo, qualquer descuido com os seguintes requisitos: direito disponível, capacidade das partes e equilíbrio. Dizendo de outro modo, garantias processuais fundamentais, ligadas aos requisitos aqui nominados, não podem sofrer mácula. Respeitados tais limites, nada obsta a adequação antecipada do futuro processo, o qual fica, antecipadamente, gerenciável segundo o interesse dos contratantes.
Essa customização prévia do litígio futuro poderia versar sobre temores que envolvem um contrato comercial, ainda que esses sejam estranhos ao momento da contratação. Trata-se de uma tentativa das partes não ficarem excessivamente expostas a sorte de eventos momentâneos desestabilizadores. Tome-se, por exemplo, os efeitos de algumas das medidas adotadas para o desfecho da greve dos caminhoneiros. Ora, salvo grave engano, ninguém esperava uma medida governamental tão tóxica aos princípios constitucionais, dentre os quais, principalmente, ao da livre iniciativa, ao da liberdade de contratação, assim como ao da livre concorrência.
Indubitavelmente, os negócios processuais entabulados contratualmente não imunizariam os distúrbios provocados pela obrigatoriedade do uso da tabela de preços mínimos, mas, no mínimo, poderiam sinalizar meios mais seguros para eventuais discussões judiciais, como, por exemplo, a fixação de teto mínimo de multa adotável pelo julgador para hipóteses de descumprimento contratual (astreintes), a necessidade da diferença de valores ser consignada e ficar no aguardo de definição legal mais perene do que aquela entregue por uma medida provisória, o pacto acerca daquilo que pode ou não ser objeto de um processo, a disposição sobre supressão de recursos, dentre tantos outros pontos. E, na verdade, mesmo que possível o questionamento sobre o limite dos negócios jurídicos processuais, acaba sendo irrenunciável qualquer tentativa de prestigiar alguma forma de segurança, ainda que meramente procedimental, para relações que estão abertamente impactadas pelo imponderável.
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