Muito tem se falado sobre como será a modulação dos efeitos das normas alteradas – materiais e processuais – pela lei 13.467/17, a chamada reforma trabalhista.
Com relação às normas materiais, a tendência do TST, baseada em experiências anteriores, como a própria modulação dos efeitos da lei 13.429/17 (Lei da Terceirização), será aplicá-las apenas aos contratos de trabalho firmados depois da entrada em vigor da lei 13.467/17, já que o TST entendeu que os contratos de prestação de serviços que previam a terceirização de atividade-fim somente seriam lícitos se assinados depois de 31.03.2017.
Outro exemplo de tal tendência é a modulação dos efeitos da lei 12.740/12, que alterou o artigo 193, da CLT, para redefinir os critérios para caracterização das atividades ou operações perigosas, bem como, consequentemente, a base de cálculo do pagamento de adicional de periculosidade para eletricitários.
Em tal caso, o TST, por meio do item III da súmula 191, determinou que a alteração da base de cálculo do adicional de periculosidade do eletricitário atingiria "somente contrato de trabalho firmado a partir da sua vigência, de modo que, nesse caso, o cálculo será realizado exclusivamente sobre o salário básico, conforme determina o §1º do art. 193, da CLT".
Já com relação às normas processuais, o TST poderá seguir a tendência dos demais Tribunais Superiores de aplicação da teoria do isolamento dos atos processuais, positivada, inclusive, no artigo 14, do CPC, pelo qual "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada" ou inovar o seu entendimento – e forçar uma eventual análise do STF sobre o tema.
Valorizando a uniformização da jurisprudência e da integração dos sistemas, espera-se que o TST mantenha a tendência dos demais Tribunais, aplicando integralmente a teoria do isolamento dos atos processuais. De acordo com essa teoria, a lei nova não atinge os atos processuais já praticados, nem seus efeitos, mas se aplica aos atos processuais a praticar, sem limitações relativas às chamadas fases processuais1.
Especificamente com relação à questão dos honorários sucumbenciais, apesar da sua natureza híbrida, com repercussões materiais e processuais, é regida pelo princípio do tempus regit actum.
Nesse sentido, com relação à questão dos honorários sucumbenciais, o marco temporal para delimitar a incidência, ou não, dos dispositivos previstos na lei 13.467/17, deve ser a sentença. Nesse sentido, já se manifestou Araken de Assis:
"(...) A sentença definitiva, prolatada na forma do art. 487, I e II, é o campo de incidência usual do art. 85, caput: o juiz, ao acolher ou rejeitar o pedido, condenará o vencido – réu ou autor, conforme haja procedência ou improcedência do pedido – nos honorários advocatícios. O princípio da sucumbência fundamenta o provimento desse teor na sentença definitiva. Forma-se na sentença lato sensu, destarte, o capítulo acessório da sucumbência." (ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro. Parte Geral: institutos fundamentais. Vol. II, Tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015, p. 451)
Deve ser destacado, nesse sentido, que os honorários advocatícios não interferem no modo como a tutela jurisdicional será prestada no serviço. Trata-se, em verdade, de condenação imposta em face de situação diversa daquela discutida no mérito, com a respectiva formação do direito material pertencente ao advogado no momento da sentença:
"(...) Os honorários advocatícios não interferem no modo como a tutela jurisdicional será prestada no processo. Eles visam a remunerar o advogado por seu trabalho. É certo que da condenação em honorários depende a prestação de uma tutela jurisdicional integral, de modo que a necessidade do processo não reverta em dano àquele que utilizou esse instrumento para o reconhecimento de um direito. Trata-se, no entanto, de condenação imposta em face de situação diversa daquela discutida no mérito do processo, que se sujeita a fatos constitutivos distintos e dá azo à formação de outro direito material, pertencente ao advogado e não à parte. Em tal contexto, alterar a disciplina dos honorários advocatícios pode comprometer a compensação do dano que o processo impõe à parte que tem razão (...)" (LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Coords. Flávio Luiz Yarshell e Fábio Guidi Tabosa Pessoa. Direito intertemporal. Coleção Grandes Temas do Novo CPC - Coord. Geral. Fredie Didier Jr., V. 7. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 106)
Entendimento contrário poderia implicar na ausência de reconhecimento da natureza alimentar do instituto, prejudicando, em última análise, o direito dos advogados à remuneração pelo serviço prestado.
Ainda, Homero Batista, comentando justamente a lei 13.467/17, deixa claro que, ao ajuizar uma ação, a parte não tem o "direito adquirido" à tramitação de todo o processo com as regras que existiam à época da sua petição inicial. O processo é feito por fases e nem todas ocorrerão da mesma forma. Evidente, pois, já que, caso contrário, jamais seria possível alterar, de fato, uma lei:
"(...) 11. Os mesmos dilemas de auto aplicabilidade e irretroatividade serão vivenciados pelo processo do trabalho, mas neste caso já existe forte acervo conceitual e doutrinário que nos permite antever algumas soluções. De plano, deve ficar claro que, ao ajuizar uma ação, a parte não recebe o direito adquirido à tramitação de todo o périplo processual tal qual como ela queria ou tal como ela conhecia quando da redação da petição inicial. O processo é feito por fases e nem todas ocorrerão em todos os processos. Tome-se como exemplo a fase recursal. De um lado, a parte somente tem interesse no recurso se e quando sucumbir; logo, como ninguém entra no processo para perder, não se pode dizer que se soubesse que o recurso seria endurecido não teria aforado a ação. De outro lado, o recurso somente existe no momento em que houve a sucumbência. Neste caso, sim, a parte tem o direito de ver mantidos os trâmites recursais, quando já tomou ciência do julgado desfavorável, ou seja, a lei não pode retroagir para criar novos obstáculos ou restrições. Isso é bastante conhecido dos tribunais trabalhistas, que vivenciaram grandes mudanças no recurso de revista em 1998 e 2014, bem como no recurso ordinário em 2000, além das mudanças anuais do depósito recursal.
12. Diante dessas premissas, são autoaplicáveis no processo do trabalho: (...) (f) o sistema de despesas processuais e de sucumbência recíproca (arts. 789, 790, 790-B, 791-A e 844, § 2º); este item certamente será o mais debatido e, para muitos, o mais amargo; embora o trabalhador possa argumentar que não teria ajuizado a ação se soubesse que a lei aumentaria o rigor das despesas processuais e se soubesse do abalo sofrido pelo princípio da gratuidade do processo do trabalho, estes argumentos não são jurídicos; a parte não dá início ao processo para ser sucumbente, de modo que o vasto campo das despesas processuais somente tangencia o direito adquirido no momento da derrota; se o empregado falar à audiência em 11.11.2017 terá, sim, de dar as explicações exigidas pelo art. 844, § 2º, sob pena de ter de pagar as custas e não ter acesso aos benefícios da justiça gratuita, por ser norma processual autoaplicável, com ou sem isolamento de atos processuais, sendo imprestável o argumento de que, meses antes, no ajuizamento da ação, o arquivamento da audiência tinha outra disciplina; por muito mais motivo, a sentença de improcedência ou de procedência parcial disparará as custas e os honorários proporcionais, à luz da legislação vigente à data da prolação do julgado(...)"(Comentários à reforma trabalhista, Homero Batista Mateus da Silva, RT, 2017, p.201-202 - grifos).
E esse é o entendimento, também, do STF, conforme exarado pelo Ilmo. ministro Alexandre de Moraes no julgamento do ARE 1.014.675:
"AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS NO PROCESSO DO TRABALHO. ART. 791-A DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO, INTRODUZIDO PELA LEI 13.467/2017. INAPLICABILIDADE A PROCESSO JÁ SENTENCIADO. 1. A parte vencedora pede a fixação de honorários advocatícios na causa com base em direito superveniente – a Lei 13.467/2017, que promoveu a cognominada "reforma trabalhista". 2. O direito aos honorários advocatícios sucumbenciais surge no instante da prolação da sentença. Se tal crédito não era previsto no ordenamento jurídico nesse momento processual, não cabe sua estipulação com base em lei posterior, sob pena de ofensa ao princípio da irretroatividade da lei. 3. Agravo interno a que se nega provimento. (ARE 1014675 AgR, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 23/03/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG 11-04-2018 PUBLIC 12-04-2018)
Por fim, o tema já foi, também, analisado pelo E. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, São Paulo, que confirmou que a sentença, como ato processual que qualifica o nascedouro do direito à percepção dos honorários advocatícios, deve ser considerada o marco temporal para aplicação das regras fixadas pela lei 13.467/17, que inseriu o artigo 791-A, da CLT:
"Honorários advocatícios
Com entrada em vigor da Lei nº 13.467/2017, deve-se investigar a natureza jurídica dos honorários advocatícios e, depois, fixar as regras hermenêuticas de direito intertemporal.
Não se pode olvidar que a lei processual tem efeito imediato e geral, aplicando-se aos processos pendentes, respeitados o direito adquirido, ato jurídico perfeito e coisa julgada. Portanto, no que tange às regras processuais, as novas normas da Lei nº 13.467/2017 começam a ser aplicadas a partir da sua vigência (11.11.2017).
Todavia, impõe-se indagar se a natureza jurídica dos honorários advocatícios é meramente processual.
Frise-se que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça já se manifestou a respeito do tema, cristalizando a tese, com base na doutrina de Chiovenda, de que o arbitramento dos honorários não configura questão meramente processual, máxime ante os reflexos imediatos no direito substantivo da parte e do advogado. Nesse sentido:
(...)
Observa-se, portanto, que a sentença, como ato processual que qualifica o nascedouro do direito à percepção dos honorários advocatícios, deve ser considerada o marco temporal para a aplicação das regras fixadas pela Lei nº 13.467/2017, que inseriu o art. 791-A da CLT.
Assim, é no momento da prolação da sentença que se pode falar em direito adquirido ao sistema de despesas e de sucumbência segundo a lei em vigor. Interposto recurso, não há alteração as regras que foram fixadas no momento da prolação da sentença.
Enquanto a parte não for sucumbente em determinada pretensão, sobre ela não incidiu a norma acerca da sucumbência e, portanto, não há direito adquirido ao sistema de despesas da data propositura da ação.
De outro lado, fixada a sucumbência na sentença, a alteração da norma em momento posterior não afeta o direito adquirido da parte àquele sistema de sucumbência em vigor na data da prolação da sentença. Há, no caso, irretroatividade da norma, sob pena de vulneração do princípio da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI, da CF; art. 6º do Decreto-Lei nº 4.657/1942).
Esse foi, mutatis mutandis, o mesmo posicionamento do Superior Tribunal de Justiça ao aprovar o Enunciado Administrativo nº 07, acerca dos honorários advocatícios de sucumbência recursal, até então inexistentes no Processo Civil, in verbis: Enunciado administrativo n. 7: Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC.
Portanto, a hermenêutica que se propõe pretende cristalizar a seguinte ideia: se o capítulo acessório da sentença, referente aos honorários sucumbenciais, foi prolatado antes da vigência da Lei nº 13.467/2017 e em consonância com a Lei nº 5.584/1970, serão aplicadas as regras desse diploma legal, consubstanciada no item I da Súmula 219, com a redação dada pela Resolução 204/2016 do E. TST, até a ocorrência do trânsito em julgado. Por outro lado, nos casos de sentença proferida a partir do dia 11.11.2017, as normas da novel Lei nº 13.467/2017, que inseriu o art. 791-A da CLT, regerão a situação concreta.
Não se pode olvidar, ainda, que a posição em supramencionada reverbera os princípios do direito adquirido e da não surpresa.
Induvidosamente, a parte que não foi condenada em honorários advocatícios na sentença, em conformidade com as regras Lei nº 5.584/1970 e item I da Súmula 219 do TST supramencionada, possui direito adquirido à aplicação das normas existentes no momento da prolação do respectivo ato processual.
O art. 14 do CPC/2015, aplicável subsidiária e supletivamente ao Processo do Trabalho, aponta norma de direito intertemporal, com o escopo de proteger os atos praticados na vigência da codificação anterior:
Art.14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada.
Nesse diapasão, os direitos adquiridos, com verve material ou processual, devem ser respeitados pela nova lei, sob pena de violar-se enunciado precípuo da aplicação intertemporal do direito, consistente na regra de que a lei processual nova não retroagirá para atingir direito processual adquirido nos termos da lei revogada.
Dessa forma, as partes litigantes possuem a prerrogativa legal de verem subsumir-se à hipótese vertente a norma que amparava o instituto dos honorários advocatícios na data da prolação da sentença, com o fim de salvaguardar o direito adquirido.
Deve-se ressaltar que os honorários repercutem na esfera substantiva dos advogados, constituindo direito de natureza alimentar. Nascem contemporaneamente à sentença e não preexistem à propositura da demanda. Nesse mesmo sentido: (...)" (Processo RO nº 0000128-93.2015.5.02.0331, 17ª Turma do TRT2, Relatora Thaís Verrastro de Almeida, julgado em 07.12.2017)
Assim, espera-se que a Justiça do Trabalho, seguindo aquilo que já foi decidido pelo STF, bem como a teoria vigente no ordenamento jurídico, reconheça que as normas processuais devem ser aplicadas imediatamente para todos os processos que ainda não foram sentenciados, com especial atenção à questão dos honorários de sucumbência.
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1 ARAÚJO CINTRA, Antonio Carlos de; GRIONER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2007, p. 105
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ARAÚJO CINTRA, Antonio Carlos de; GRIONER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 23 ed. São Paulo: Malheiros, 2007
ASSIS, Araken de. Processo Civil Brasileiro. Parte Geral: institutos fundamentais. Vol. II, Tomo I. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2015
SILVA, Homero Batista Mateus; Comentários à reforma trabalhista, Homero Batista Mateus da Silva, RT, 2017
LOPES, Bruno Vasconcelos Carrilho. Coords. Flávio Luiz Yarshell e Fábio Guidi Tabosa Pessoa. Direito intertemporal. Coleção Grandes Temas do Novo CPC - Coord. Geral. Fredie Didier Jr., V. 7. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 106
Jurisprudência
ARE 1014675 AgR, Relator(a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, julgado em 23/03/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-070 DIVULG 11-04-2018 PUBLIC 12-04-2018
Processo RO nº 0000128-93.2015.5.02.0331, 17ª Turma do TRT2, Relatora Thaís Verrastro de Almeida, julgado em 07.12.2017
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