A prerrogativa de participação efetiva no livre debate de disputa de hegemonia política, de expressão das ideias e conceitos e de constituição da esfera crítica de uma arena pública de confronto de projetos e propostas, é condição essencial para se poder afirmar a existência de um direito de participação política democrática representativa.
Imbricada nesse conceito, a propaganda eleitoral tem se desenvolvido largamente como um dos principais campos do reconhecimento da característica de direito fundamental das normas atinentes ao direito eleitoral. Contudo, essa expansão tem sido acompanhada por uma transposição do livre convencimento eleitoral em uma arena democrática para o controle judicial (com forte conotação moral) do que efetivamente pode ser veiculado em propagandas eleitorais.
Pode-se chegar a duas conclusões. A primeira delas é a constatação que, diante das crises políticas e institucionais que estão se sucedendo ao longo da história, as alternativas legislativas, regulatórias e jurisprudenciais sempre resultaram em repressão e diminuição das possibilidades de realização do direito à propaganda eleitoral.
Na mesma linha, a apreciação jurisdicional equivocada resulta em decisões que ignoram completamente toda a sistemática do que significa o direito eleitoral como modo de regulação da democracia representativa. A regulação que se empreende por esta via não atende a prestação positiva estatal em prol da liberdade e da igualdade, que caracterizam o fim verdadeiro da propaganda em um regime que se pauta pela autenticidade do voto e por debates políticos eleitorais robustos.
Em segundo lugar, encontra-se a conclusão de que essa forma de tratar a regulação implica em uma redução dessa igualdade, resultando em privilégio aos grupos políticos de maior poderio econômico e maior tradição, a pouca renovação dos eleitos e ao desincentivo à renovação dos quadros políticos – além de, ironicamente, ampliar as hipóteses de Caixa 2 e financiamento irregular da atividade política.
A construção da opinião pública somente se torna possível em um espaço qualificado de debate, no qual os personagens da discussão tenham acessos isonômicos aos meios de comunicação com o eleitorado e no qual possam expor plataformas, propostas e projetos políticos de forma livre e com os menores impedimentos possíveis. Isso porque a liberdade do convencimento é característica essencial a ser preservada no espaço público de desenvolvimento de ideias.
Pode-se afirmar, assim, que o Direito Eleitoral visa no desempenho de sua missão constitucional a regulação do exercício da democracia representativa. Por conta desse supraprincípio essencial decorre a igualdade de valor do voto, o voto secreto, a regulação da propaganda eleitoral, a exigência de determinados requisitos para ser candidato. Por outro lado, é esse supraprincípio que explica a razão das radicais formas de repressão ao convencimento ilícito, mediante abuso de poder simples e qualificado.
Nesse sentido, o que se visa a demonstrar é que justamente a maior liberdade de debate, de ampliação da esfera pública de conflito de ideias e de ampliação das possibilidades e instrumentos de expressão das ideias políticas e de propaganda eleitoral é que assegura a concretização do princípio da igualdade de oportunidades em matéria de disputa eleitoral.
Cumprir o projeto constitucional é uma das condições para que tenhamos condições de resgate da legitimidade do sistema representativo democrático, ao lado de outras reformas (partidária, financiamento de campanha, etc.). E cumprir com a liberdade de expressão e a liberdade de propaganda, é o primeiro e mais fundamental meio para se chegar aos objetivos traçados.
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