No âmbito da Agenda BC+ do Banco Central do Brasil, nos pilares SFN Mais Eficiente e Mais Cidadania Financeira, que têm como objetivos, entre outros, simplificar os procedimentos e regras do BC, ampliar a inclusão financeira da população e aprimorar o relacionamento e a transparência entre as instituições e seus clientes, o BC publicou, em 26 de março de 2018, os editais de consulta pública 61, 62 e 63, que tratam de alterações à regulação de meios de pagamento.
Também no último dia 26 de março, o BC publicou as circulares 3.885, 3.886 e 3.887, introduzindo diversas mudanças relevantes ao funcionamento dos arranjos de pagamento e das instituições de pagamento, as quais abordamos em uma série de artigos que publicamos recentemente.
Neste último artigo da série sobre as recentes mudanças e inovações nas regras de arranjos e instituições de pagamento, trazemos detalhes sobre as propostas de alteração à regulação de meios de pagamento submetidas pelo BC à consulta pública, como parte do pacote divulgado em 26 de março.
Edital 61/18 – Constituição de Comitê de Governança
O edital 61/18 submete à consulta pública proposta de instituição de Comitê de Governança em arranjos de pagamento. De acordo com a minuta de circular proposta, o Comitê de Governança seria obrigatório para arranjos de pagamento abertos e com valor total de transações nos últimos doze meses superior a R$20 bilhões. Vale ressaltar que tal volume mínimo é o mesmo que já obriga, atualmente, um arranjo de pagamento a tornar-se aberto, o que mostra uma maior preocupação do BC com os arranjos de pagamento que movimentam um grande volume financeiro.
Conforme proposta de Circular apresentada pelo Banco Central, tal Comitê de Governança deverá ser composto por um representante do instituidor do arranjo, um conselheiro independente e dois representantes de participantes de cada uma das modalidades de participação previstas no regulamento do arranjo. Entre as funções desse Comitê, estariam a elaboração de propostas, avaliações e manifestações sobre assuntos estratégicos do arranjo, tais como estrutura de preços, acesso e tratamento de informações sensíveis, participação, interoperabilidade e gerenciamento de riscos. Assim, o Comitê funcionaria como um fórum de debate, para que os participantes dos arranjos de pagamento de grande porte possam ter a oportunidade de se manifestar com relação a questões que tenham impacto em sua atuação e em seu modelo de negócio. Em última análise, o produto desses debates também facilitaria o acesso do BC aos problemas de ordem prática enfrentados pelos participantes da indústria, bem como o atendimento, pelo BC, a pleitos do mercado para adaptação da regulamentação, realizados com base nas demandas apuradas em tais Comitês.
A minuta de circular proposta pelo edital 61/18 busca criar mecanismos para assegurar uma participação mais igualitária dos participantes do arranjo e evitar conflitos de interesses. Nesse sentido, de acordo com tal minuta, os representantes dos participantes do arranjo não poderão pertencer ao mesmo grupo de controle do instituidor. Além disso, os representantes de participantes de cada uma das modalidades de participação do arranjo, que farão parte do Comitê do Governança, deverão ser escolhidos pelos próprios participantes da respectiva modalidade de participação, sendo que um deles deverá representar os participantes de grande porte e o outro os participantes de médio e pequeno portes. No entanto, ainda não está claro como se dará, na prática, tal nomeação pelos participantes.
Comentários e sugestões à proposta apresentada pelo BC poderão ser enviados até 21 de julho de 2018, tendo o BC ressaltado o interesse em receber do mercado sugestões de aprimoramento à proposta, especialmente a respeito da competência e composição do Comitê de Governança.
Edital 62/18 – Conversão dos Subcredenciadores em Credenciadores
O edital 62/18, por sua vez, trata da proposta de conversão obrigatória dos subcredenciadores em credenciadores, para aqueles subcredenciadores que tenham um total de transações, acumulado nos últimos doze meses, superior a R$ 500 milhões, considerando todos os arranjos em que atuam. O objetivo de tal regra é permitir uma supervisão pelo BC dos subcredenciadores que movimentam um grande volume financeiro.
Ao contrário dos emissores e credenciadores, os subcredenciadores não são instituições de pagamento nos termos da regulamentação do BC e não estão, portanto, sujeitos à autorização e supervisão de tal órgão regulador. Todavia, na visão do BC, os subcredenciadores com movimentações acima dos R$ 500 milhões têm um impacto relevante no mercado de credenciamento e podem agregar um risco significativo ao sistema.
Cabe ressaltar que a circular do BC 3.886/18 alterou a circular 3.682/13 para incluir a definição de subcredenciador como "participante do arranjo de pagamento que habilita usuário final recebedor para a aceitação de instrumento de pagamento emitido por instituição de pagamento ou por instituição financeira participante de um mesmo arranjo de pagamento, mas que não participa do processo de liquidação das transações de pagamento como credor perante o emissor". Além disso, com as alterações trazidas pela circular 3.886/18, a circular 3.682/13 passa a prever, de forma expressa, a necessidade de formalização da participação dos subcredenciadores nos arranjos de pagamento aos quais aderirem, bem como passa a exigir a participação de subcredenciadores na liquidação centralizada das transações de pagamento cursadas no âmbito dos arranjos de pagamento integrantes do SPB - Sistema de Pagamentos Brasileiro, que ocorre na CIP - Câmara Interbancária de Pagamentos. Apenas para subcredenciadores que tenham valor de transação inferior a R$ 500 milhões, nos últimos doze meses, a liquidação centralizada das obrigações perante os estabelecimentos comerciais é facultativa.
Assim, se editada a nova norma proposta pelo BC, aqueles subcredenciadores cujo valor total das transações, em uma janela de doze meses, seja superior a R$ 500 milhões, passam a estar obrigados, não apenas a liquidarem as suas operações por meio da sistemática de liquidação centralizada, o que já é exigido hoje, mas também a se tornar um credenciador.
Comentários e sugestões com relação ao edital 62/18 poderão ser enviados ao BC até 21 de maio de 2018.
Edital 63/18 – Alterações nas Regras de Interoperabilidade
Por fim, o edital 63/18 submete à consulta pública proposta de alteração ao artigo 30 da circular 3.682/13, que disciplina interoperabilidade entre arranjos de pagamento. O novo dispositivo proposto estabelece que a interoperabilidade entre arranjos de pagamento abertos (por exemplo, bandeiras Visa, MasterCard, American Express) e arranjos de pagamento fechados (dos quais são exemplos diversos arranjos que operam no comércio eletrônico) deve ocorrer por meio da participação no arranjo aberto.1
A proposta do BC elimina, assim, a possibilidade de um arranjo de pagamento aberto e um arranjo de pagamento fechado firmarem um acordo bilateral de interoperabilidade, para fins da transferência de recursos entre eles, que não envolva necessariamente uma participação.
Diante disso e tendo em vista as regras de participação hoje existentes, caso aprovada a nova norma proposta, o fluxo financeiro entre um arranjo aberto e um arranjo fechado dependeria de um contrato de participação entre tais arranjos, devendo então o arranjo fechado atender, na qualidade de participante, aos requisitos de participação definidos no regulamento do arranjo aberto. Vale ressaltar que as normas atuais não limitam as possíveis modalidades de participação, ficando a critério do instituidor do arranjo aberto defini-las em seu regulamento. No entanto, as regras de participação de um determinado arranjo estão sujeitas à aprovação do BC no âmbito de seu processo de autorização.
Entre as razões apresentadas pelo BC para a nova proposta de regulação, o regulador destacou uma preocupação com o uso inadequado em alguns casos do instituto da interoperabilidade, em detrimento da competição no mercado e do tratamento não discriminatório entre participantes dos arranjos de pagamento. Entretanto, é preciso levar em conta o dinamismo existente do mercado de meios de pagamento e a multiplicidade de interações entre arranjos de pagamento, inclusive entre arranjos abertos e fechados. Dessa maneira, uma preocupação que surge com uma restrição prévia e expressa é desta acabar por ter um efeito contrário àquele pretendido, tornando-se um obstáculo à competição e inovação.
Nesse sentido, o próprio BC ressalta no edital 63/18 seu especial interesse em receber comentários e sugestões sobre a necessidade de concretizar intervenção regulatória e os possíveis impactos que uma restrição da forma de interoperabilidade entre arranjo aberto e fechado traria. Os interessados em enviar contribuições à proposta do BC podem fazê-lo até 21 de junho de 2018.
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1 A definição de "interoperabilidade entre arranjos" encontra-se prevista na circular 3.682/13: "mecanismo que viabilize, por meio de regras, procedimentos e tecnologias compatíveis, o fluxo de recursos entre diferentes arranjos de pagamento".
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*Bruno Balduccini é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*José Luiz Homem de Mello é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Fernando Mirandez Del Nero Gomes é sócio do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Marcus Firmato é associado do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Marília de Cara é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Tatiana Mello Guazzelli é associada do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Joaquim Pedro G. de Mattos Arruda é associado do escritório Pinheiro Neto Advogados.
*Este artigo foi redigido meramente para fins de informação e debate, não devendo ser considerado uma opinião legal para qualquer operação ou negócio específico.
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