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Divulgação do Ofício-Circular anual nº2 CVM/SEP com orientações gerais sobre procedimentos para os emissores de valores mobiliários

O documento é emitido anualmente com a finalidade de orientação dos emissores sobre os principais procedimentos a serem observados no envio de informações e sobre interpretações da CVM referentes a aspectos relevantes da legislação e regulamentação societária que devem ser considerados pelas companhias abertas.

6/4/2018

Em 28 de fevereiro de 2018, a Superintendência de Relações com Empresas (“SEP”) da CVM divulgou o Ofício-Circular CVM/SEP/Nº02/2018 (“Ofício-Circular de 2018”), documento este emitido anualmente com a finalidade de orientação dos emissores sobre os principais procedimentos a serem observados no envio de informações e sobre interpretações da c referentes a aspectos relevantes da legislação e regulamentação societária que devem ser considerados pelas companhias abertas. Com isso, a SEP visa incentivar a divulgação de informações societárias e de mercado de capitais nos moldes das melhores práticas de governança corporativa.

O Ofício-Circular de 2018 apresenta as seguintes principais informações, alterações e orientações sobre: (i) alterações recentes no Formulário de Referência (item 3.3.2 e Capítulo 10); (ii) inclusão de informações na proposta da administração sobre contratos de indenidade no contexto de assembleia que contenha na ordem do dia deliberação sobre a matéria (itens 3.4.2.a, 10.2.12.i e 10.2.13.k); (iii) o Informe sobre o Código Brasileiro de Governança Corporativa (“CBGC”) (item 3.3.6); (iv) procedimentos do voto a distância (item 7.1.6); (v) decisões recentes do Colegiado da CVM relacionadas a eleições de administradores em companhias alcançadas pela Lei das Estatais (item 7.1.5); (vi) o voto e conflito de interesses no momento da propositura de ação de responsabilidade e na votação sobre as contas da administração (item 7.1.7); (vii) vedação à negociação de valores mobiliários durante o curso de programa de aquisição ou alienação de ações pela própria companhia (item 7.9); (viii) reclamações envolvendo companhias abertas (item 8.1); e (ix) procedimentos para pedidos de interrupção ou suspensão do prazo de convocação de assembleia (item 8.4).

Dos pontos elencados acima, destacam-se os itens relacionados e comentados a seguir.

Dentre as principais informações que devem constar na proposta da administração de assembleia que contenha na ordem do dia deliberação sobre contrato de indenidade, destacam-se: a) motivo pelo qual a administração preferiu o contrato de indenidade ao invés de contrato de seguro de responsabilidade civil com cobertura similar (seguro D&O); b) valor cotado de prêmio do seguro D&O que preveja cobertura similar ao contrato de indenidade; c) se o contrato de indenidade inclui o pagamento ou reembolso de indenizações que os administradores forem obrigados a pagar quando responsabilizados por danos causados a terceiros ou à companhia por atos ilícitos dolosos ou por atos ilícitos praticados antes da celebração do contrato de indenidade; d) se o contrato de indenidade prevê o pagamento ou o reembolso de multas decorrentes de condenação em ação penal ou em processo administrativo ou obrigações pecuniárias suportadas por administradores em termos de compromisso firmados para encerrar processos administrativos; e) em caso de resposta positiva a qualquer dos dois itens anteriores, a administração deve informar porque acredita que essa proteção ao administrador é no melhor interesse da companhia; f) principais cláusulas contidas no compromisso de indenidade, incluindo o limite global ou anual da cobertura garantida aos beneficiários, quando aplicável, bem como o período de cobertura estabelecido no referido compromisso; e g) órgão da companhia competente para autorizar o pagamento ou o reembolso que os administradores fizerem jus e de que forma o órgão lidará com o conflito de interesses inerentes à decisão.

O Ofício-Circular de 2018 ainda ressalta que trata de recomendações da SEP, sendo que o tema se encontra sob análise da Superintendência de Desenvolvimento de Mercado (SDM) e passará pelo Colegiado.

Ressalvado o fato que a matéria está sob análise da SDM e será submetido ao Colegiado, importante observar que a área técnica sinalizou nesse Ofício-Circular que a prestação das garantias indicadas nos itens “c” e “d” acima poderá ser considerada violação ao dever de lealdade dos acionistas que aprovarem o contrato de indenidade, caso não seja comprovado o benefício desse contrato para a companhia. Dessa forma, caso um contrato de indenidade assegure o reembolso ou pagamento de multa por condenação em processo administrativo ou de pagamentos realizados por administradores em termos de compromisso firmados para encerrar processos administrativos, os acionistas que aprovaram acordo com essas características poderão ser questionados acerca das suas motivações ou penalizados. Outro aspecto interessante da manifestação da área técnica é o fato de a CVM perguntar como a companhia pretende endereçar as questões de conflito de interesses inerentes a esse tipo de contrato ao invés de determinar medidas específicas para tanto. De fato, ele vem em benefício dos administradores, os quais, como regra, são responsáveis por aprovar os desembolsos sob o contrato em favor de outros administradores e não se pode afastar a possibilidade de haver decisões tomadas por esprit de corps ou espírito de grupo. Essa flexibilidade é muito positiva para não onerar desnecessariamente as companhias, na medida em que algumas delas podem precisar de estruturas mais ou menos robustas em função de ter ou não controlador definido, conselho de administração predominantemente constituído por profissionais de mercado independentes ou por representantes do controlador, sistemas mais estruturados de controles internos, compliance e gestão de riscos, entre outros.

O Informe sobre o CBGC é obrigatório: (i) a partir de 01/01/2018, para companhias registradas na categoria A que, na data de publicação da Instrução CVM 586/17 (publicada no DOU em 9 de junho de 2017 e retificada no DOU em 10 de julho de 2017), tenham ao menos uma espécie ou classe de ação de sua emissão compreendida em algum dos seguintes índices gerais representativos de carteira de valores mobiliários: a) Índice Brasil 100 – IBrX-100; ou b) Índice Bovespa – IBOVESPA; e (ii) a partir de 01/01/2019, para demais emissores registrados na categoria A autorizados por entidade administradora de mercado à negociação de ações em bolsa de valores. O formulário estruturado para preenchimento do CBGC está atualmente em processo de elaboração. A SEP comunicará oportunamente aos emissores a disponibilização do formulário.

Em 13 de março de 2018, o Colegiado da CVM prorrogou o prazo para envio do Informe para 31 de outubro de 2018, uma vez que a B3 criará plataforma própria no Sistema ENET prevista para final do mês de agosto.

Ressalte-se que esta prorrogação é excepcional e aplicável apenas para o exercício de 2018, permanecendo válida, vigente e em vigor a disposição constante do parágrafo primeiro do artigo 29-A da Instrução CVM 480/09, segundo o qual o Informe deverá ser entregue em até sete meses contados da data de encerramento do exercício social.

No que se refere à questão do direito de voto e conflito de interesses, o Ofício-Circular de 2018 faz remissão ao julgamento do Colegiado da CVM de 28/11/2017 (Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/10556), que entendeu que o acionista que também seja administrador encontra-se, nos termos do art. 115, §1º, da lei nº 6.404/76, proibido de votar em relação à propositura de ação de responsabilidade contra si (art. 159 da lei nº 6.404/76). Nesse contexto, o fato de o acusado ter renunciado ao cargo de administração antes da realização da assembleia não altera a configuração do impedimento de voto, uma vez que os fatos ocorreram durante o período em que ele integrava a administração da companhia. Por outro lado, decidiu-se que o acionista-administrador pode votar na deliberação sobre a propositura de ação de responsabilidade contra outro administrador. Na mesma ocasião, o Colegiado reiterou o entendimento de que o acionista administrador também está proibido, nos termos do art. 115, §1º, da lei nº 6.404/76, de votar na deliberação relativa à tomada de suas contas, por intermédio de sociedade sob sua completa influência.

Essa decisão reflete o posicionamento da CVM já manifestado anteriormente no Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/10060, julgado em 10 de novembro de 2015, envolvendo o voto de sociedade controlada por Eike Batista na aprovação de contas da OGP (antiga OGX), companhia da qual ele era administrador e controlador indireto.

A questão que se coloca é no sentido de que a norma em comento, ao mesmo tempo em que busca proteger os acionistas minoritários de votos eventualmente proferidos pelo controlador em conflito de interesses, interpreta a vedação constante do art. 115, §1º, da lei nº 6.404/76, como aplicável, não só de forma direta, mas também indireta, o que representa afastar a personalidade jurídica do acionista direto.

Por fim, ressalte-se que o conceito de “completa influência”, cunhado pela CVM no Processo Administrativo Sancionador CVM nº RJ2014/10556, deve ser analisado de acordo com as particularidades do caso concreto, com vistas a que se adote a posição por permitir ou não o voto de determinado acionista em cada assembleia geral.

Nesse contexto, é muito importante que os acionistas administradores tracem estratégias de voto com muita cautela, previamente à realização de assembleias que contenham na ordem do dia deliberações sobre o assunto.

Nos termos da Instrução CVM nº 358/02 (art. 13, § 3º, II), é vedada a negociação com valores mobiliários de emissão da companhia pelos acionistas controladores e administradores, sempre que estiver em curso a aquisição ou a alienação de ações de emissão da companhia pela própria companhia (o que inclui suas controladas, coligadas ou outra sociedade sob controle comum), ou se tiver sido outorgada opção ou mandato para o mesmo fim. O Ofício-Circular de 2018 estabelece que a vedação à negociação deverá ser observada durante o prazo de vigência do programa. Ainda, nos termos da Instrução CVM nº 567/15, art. 6º, o prazo máximo para que a companhia negocie as próprias ações é de 18 meses contados da aprovação em assembleia ou reunião do conselho de administração.

O Ofício-Circular de 2018 amplia a vedação, uma vez que ela passaria a perdurar por todo o período em que vigorar o programa (máximo de 18 meses) e não apenas nos momentos em que a sociedade estiver efetuando as aquisições ou alienações. Segundo esse novo critério, nos casos de companhias que realizam programas sucessivos, os controladores e administradores estariam impedidos de negociar suas ações por períodos extremamente extensos ou mesmo indefinidamente. Será necessário explorar junto à SEP qual seu objetivo com essa nova orientação e o efetivo alcance que se pretende dar à restrição.

Maiores informações podem ser encontradas na íntegra do Ofício-Circular de 2018 disponível no site da CVM, cujo link segue abaixo:

https://goo.gl/tXBmYG

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*Ricardo Madrona é sócio do escritório Madrona Advogados.

*Nair V. Saldanha é sócia do escritório Madrona Advogados.

*Fernanda Tassinari é advogada do escritório Madrona Advogados.

*Lucas Budoya é advogado do escritório Madrona Advogados.

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