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Entram em vigor na próxima semana as novas regras para o licenciamento ambiental em Minas Gerais

A nova norma consolida várias alterações importantes promovidas na legislação ao longo dos últimos anos e revoga a DN COPAM 74/04 e outras 50 (cinquenta) normas esparsas que regulamentavam a matéria.

2/3/2018

Entrará em vigor no próximo dia 6 de março de 2018 a DN COPAM 217, publicada no dia 8/12/2017, que regulamenta a lei estadual 21.972/16 e faz alterações relevantes no processo de licenciamento e regularização ambiental no âmbito do Estado de Minas Gerais.

A nova norma consolida várias alterações importantes promovidas na legislação ao longo dos últimos anos e revoga a DN COPAM 74/04 e outras 50 (cinquenta) normas esparsas que regulamentavam a matéria. Dentre os aspectos e alterações trazidas pela norma vale destacar os seguintes:

Novas modalidades de licenciamento ambiental

A DN 217/17 estabelece que o licenciamento ambiental poderá ser realizado por meio de quatro modalidades de processo, a saber:

I - Licenciamento Ambiental Trifásico – LAT: licenciamento no qual a Licença Prévia - LP, a Licença de Instalação - LI e a Licença de Operação - LO da atividade ou do empreendimento são concedidas em etapas sucessivas;

II - Licenciamento Ambiental Concomitante – LAC: licenciamento no qual serão analisadas as mesmas etapas previstas no LAT, com a expedição concomitantemente de duas ou mais licenças (ex.: LP+LI, LI+LO, doravante denominada LAC2 ou LP+LI+LO, denominada LAC1);

III - Licenciamento Ambiental Simplificado – LAS: licenciamento realizado em uma única etapa por meio da apresentação do Relatório Ambiental Simplificado – RAS, contendo a descrição da atividade ou do empreendimento e as respectivas medidas de controle ambiental.

IV - Licenciamento Ambiental Simplificado por Cadastro – LAS/CADASTRO das informações relativas à atividade junto ao órgão ambiental.1

O licenciamento trifásico ("LAT"), com a necessidade, via de regra, de apresentação de EIA/RIMA e audiência pública, será cabível para os empreendimentos de maior porte e impacto ambiental (ex.: classes 5 e 6) e aqueles situados em locais com maior restrição ou vulnerabilidade ambiental (critério locacional).

Na medida em que os empreendimentos sejam enquadrados nas classes inferiores e situados em áreas de menor vulnerabilidade e proteção ambiental, haverá a possibilidade de concomitância das fases ("LAC1" ou "LAC2") ou licenciamento em fase única e com procedimentos mais simplificados (LAS e LAS/Cadastro).

Vale ressaltar que nos termos da revogada DN 74/04, o enquadramento do empreendimento ou atividade nas classes de 1 a 6 se dava apenas com base no porte e potencial poluidor. Entretanto, a nova DN prevê a adição do critério locacional para fins enquadramento, de forma que em razão do maior ou menor o grau de vulnerabilidade ambiental ou de proteção da área a ser afetada, a classe do empreendimento poderá ser majorada ou minorada.

A modalidade de licenciamento será definida com base no enquadramento da atividade ou empreendimento nas classes de 1 a 6, conforme tabelas 1 e 2 do Anexo Único da norma, conjugada ainda com o novo critério locacional (tabelas 3 e 4).

As tabelas 3 e 4 do Anexo Único da norma trazem a matriz de fixação da modalidade de licenciamento a ser considerada após a verificação do enquadramento do porte e potencial poluidor:

Por exemplo, com base nessa nova metodologia, um mesmo tipo de empreendimento da classe 2, a depender do local escolhido para sua instalação, poderá ser passível de:

a) LAS/Cadastro, procedimento simplificado e célere que substitui a Autorização Ambiental de Funcionamento – AAF;

b) LAS, com apresentação de relatório ambiental simplificado (RAS)2;

c) LAC1, Licença Ambiental concomitante (LP+LI+LO), via de regra, com apresentação de Relatório de Controle Ambiental e Plano de Controle Ambiental – RCA/PCA.

Assim, o critério locacional além de constituir importante variável a ser considerada para fins de definição da modalidade de licenciamento, constitui uma ferramenta de gestão ambiental, na medida em que incentiva os empreendedores a buscar locais com menor vulnerabilidade ambiental e menor grau de proteção legal para instalação de novos empreendimentos, pois assim fazendo o licenciamento tende a ser menos oneroso, simplificado e célere3. Em todo caso, vale ressaltar, as medidas adequadas de prevenção, mitigação, controle e compensação ambiental deverão ser implementadas e fielmente cumpridas, sob pena de responsabilização, civil (reparação do dano), administrativa (ex.: multas, suspensão de atividades, cassação da licença) e, conforme o caso, criminal.

Outro aspecto relevante é que a norma consolida a prática do órgão ambiental e exige, de forma expressa, que os estudos ambientais necessários à instrução dos pedidos de licenciamento ambiental deverão estar devidamente acompanhados de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, reforçando a responsabilidade dos subscritores dos estudos e relatórios ambientais, inclusive à luz do art. 69-A da lei de crimes ambientais4. De outro lado, ainda não está expressamente regulamentado o tipo de estudo ou informação a ser apresentada no caso de LAS/Cadastro.

Ainda em relação ao enquadramento da atividade/empreendimento e a modalidade de licenciamento ambiental a ser observada, é importante lembrar que o Anexo da norma trouxe atualização e alterações para diversas tipologias e códigos. Com a entrada em vigor da norma, várias atividades tiveram suas classes alteradas, outras passaram a ser dispensadas de licenciamento e outras agora estão sujeitas ao licenciamento ambiental, sendo necessário que os empreendedores verifiquem, caso a caso, a incidência e os impactos das novas regras ao seu empreendimento, inclusive para processos em curso ou para o procedimento de renovação das licenças.

Dispensa de renovação de licença de operação para determinadas atividades/empreendimentos

Outro aspecto bastante relevante que a norma traz refere-se à dispensa de renovação de licença de operação para as seguintes atividades:

I - E-01 Infraestrutura de transporte (todas as tipologias listadas sob o código E-01);

II - E-02-03-8 Linhas de transmissão de energia elétrica;

III - E-03-01-8 Barragem de saneamento ou perenização;

IV - E-05-01-1 Barragens ou bacias de amortecimento de cheias;

V - E-05-02-9 Diques de contenção de cheias de corpo d’água;

VI - E-03-02-6 Canalização e/ou retificação de curso d’água;

VII - E-04 Parcelamento do solo;

VIII - E-05-04-5 Transposição de águas entre bacias;

IX - E-03-05-0 Interceptores, emissários, elevatórias e reversão de esgoto;

X - E-05-06-0 Parques cemitérios;

XI - G-05 Infraestrutura de irrigação.

Este dispositivo legal se baseia na premissa de que certas intervenções e empreendimentos somente possuem (potenciais) impactos ambientais significativos na fase de instalação e, em alguns casos, até mesmo inexiste operação propriamente dita após a conclusão da obra (ex.: loteamentos, rodovias). Por conseguinte, os empreendimentos listados no rol acima não demandariam pelo procedimento de renovação da licença de operação.5

De todo modo, a norma prevê que a dispensa de renovação da LO não exime o empreendedor quanto à manutenção das obrigações de controle ambiental do empreendimento e, evidentemente, quanto ao cumprimento da legislação ambiental, durante a sua existência / operação (art. 12 da DN 217/17).

Informações complementares

A norma reforça prazos e procedimentos que visam o bom andamento do processo administrativo de licenciamento ambiental e a necessidade de atendimento tempestivo e completo por parte do empreendedor quanto aos pedidos de informações complementares formulados pelo órgão ambiental.

O art. 26 estabelece que o pedido de complementação ("informações complementares") deve ser feito ao empreendedor em sua completude uma única vez no processo de licenciamento, justamente, visando otimizar o andamento do processo administrativo e o fluxo das informações.

Com isso, no que tange às equipes do órgão ambiental, a norma acaba por exigir uma melhor organização e integração na avaliação do empreendimento (vistorias, análise de estudos e relatórios, avaliação jurídica, etc), evitando-se que análises parciais ou fragmentadas gerem informações complementares e, fatalmente, retrabalho. Por parte do empreendedor, exige-se o atendimento completo e tempestivo do pedido de informações complementares, dentro do prazo máximo de 60 (sessenta) dias, contados do recebimento da respectiva notificação, sob pena de arquivamento do pedido de licença.

Será admitida prorrogação justificada do prazo de 60 dias por igual período e, excepcionalmente, o prazo concedido pelo órgão poderá ser maior quando o estudo/relatório ambiental solicitado demandar mais tempo para sua conclusão.

Das condicionantes

Em relação ao regramento pertinente às condicionantes, a DN 217/17 do COPAM houve por bem consolidar alguns conceitos e diretrizes importantes para a sua definição e cumprimento.

Nesse ponto, vale destacar o disposto no art. 27 e 28 que, em observância às boas práticas e desideratos da legislação ambiental e, ainda, em consonância com o que dispõe a portaria interministerial MMA-MJ-MC-MS 60/15, fixa as premissas, limites e diretrizes para que o órgão ambiental estabeleça as condicionantes.

Notadamente, a norma exige a observância dos princípios da motivação (técnica e jurídica) e da proporcionalidade e, ainda, determina expressamente que a condicionante, ao estabelecer medidas de prevenção, mitigação, controle ou compensação de impacto ambiental, deve conter relação direta com os impactos devidamente identificados nos estudos ambientais, conforme se verifica nos termos do supracitado art. 28:

Art. 28. As condicionantes ambientais devem ser acompanhadas de fundamentação técnica por parte do órgão ambiental, que aponte a relação direta com os impactos ambientais da atividade ou empreendimento identificados nos estudos requeridos no processo de licenciamento ambiental, considerando os meios físico, biótico e socioeconômico, bem como ser proporcionais à magnitude desses impactos.

Tal disposição normativa constitui importante subsídio para a definição clara dos objetivos das condicionantes e para delineamento dos limites legais da sua fixação. Especialmente, a norma auxilia na coibição de abusos na imposição de obrigações não relacionadas ao impacto causado pelo empreendimento; obrigações desproporcionais à parcela de contribuição do empreendimento/atividade e pretensões (não legítimas) de transferência de responsabilidades ou de ônus decorrentes da deficiência de infraestrutura ou de serviços públicos ao empreendedor.

Das disposições finais e transitórias

A norma, que entrará em vigor no próximo dia 06/03/2018, estabeleceu uma vacatio legis de aproximadamente três meses desde a sua publicação para que os órgãos, entidades vinculadas e partes interessadas tomem conhecimento e se ajustem às novas regras e procedimentos. De todo modo, algumas regras de transição e disposições finais da norma devem ser cuidadosamente avaliadas no caso concreto pelos interessados, a saber:

- Fim do Protocolo Integrado: A norma prevê o fim do protocolo integrado que poderia ser feito em qualquer unidade do órgão ambiental (art. 35) e encaminhado para a unidade responsável pelo licenciamento. A partir do dia 06/03/2018, o protocolo de quaisquer documentos e/ou informações atinentes aos processos de regularização ambiental deverá ocorrer junto a unidade do SISEMA responsável pelo tramite do processo em questão, sendo admitido o protocolo através de postagem pelos Correios.

- Incidência da norma aos processos em andamento: As alterações do porte e do potencial poluidor/degradador promovidas pela DN 217/17 implicam na incidência imediata das normas pertinentes à nova classificação nos processos em andamento sem decisão final e, alteração da modalidade do licenciamento, caso o empreendedor não requeira até dia 05 de abril de 2018, a continuidade do processo na modalidade já orientada ou formalizada. Para os empreendimentos licenciados até a entrada em vigor desta Deliberação Normativa, as normas pertinentes à nova classificação incidirão quando da renovação das licenças.

- Validade e Conversão das AAFs: As Autorizações Ambientais de Funcionamento – AAF emitidas serão convertidas em Licenças Ambientais Simplificadas – LAS, desde que apresentada toda a documentação exigida pelo órgão ambiental licenciador. Todavia, a não apresentação da documentação necessária para a conversão da AAF em LAS não prejudicará a validade da AAF emitida.

Em suma, a norma regulamenta as alterações legais promovidas no licenciamento ambiental estadual nos anos de 2016 e 2017, que estavam pendentes de implementação, revoga uma série de normas esparsas do próprio COPAM, consolidando e facilitando a consulta e a análise da legislação pertinente ao licenciamento ambiental, bem como incorpora importantes conceitos e boas práticas, tal como ressaltado acima.

Entretanto, o destaque desta nova regulamentação é a implementação do critério locacional como fator de definição da modalidade de licenciamento e dos estudos ambientais exigíveis. Ainda que os fatores locacionais previstos na tabela 4 possam ser aprimorados, a regulamentação incorpora importante ferramenta de gestão e de fomento de boas práticas, especialmente porque incentiva a avaliação prévia criteriosa e a escolha de áreas com menor vulnerabilidade ambiental para instalação e operação de novos empreendimentos, pois essa escolha (evidentemente, quando inexistir rigidez locacional para o projeto) trará impactos claros e objetivos ao empreendedor desde o início do licenciamento ambiental. Ademais, tal regra reforça a necessidade e a importância de maior conhecimento e de gestão estratégica do território sob o ponto de vista econômico e ambiental e, ainda, sinaliza avanço, ainda que tímido, na integração do licenciamento ambiental com outro importante instrumento de política ambiental, qual seja, o zoneamento ecológico econômico – ZEE, previsto no art. 9º da lei federal 6.938/81 (Política Nacional de Meio Ambiente) e regulamentado no decreto federal 4.297/02.
_______________________

1
Não será admitido o licenciamento ambiental na modalidade LAS/Cadastro para as atividades enquadradas nas classes 1 ou 2 listadas no art. 19 da DN 217, tais como aterros sanitários e mineração (exceto areia, cascalho, brita e água mineral).

2 Os termos de referência para o RAS já foram disponibilizados pela SEMAD no site: <clique aqui>.

3 Para apoiar tal análise pelos empreendedores e agentes do órgão ambiental, a SEMAD lançou nesse último dia 26.02.2018 a Plataforma Infraestrutura de Dados Espaciais (IDE-Sisema) – ferramenta formada por um sistema de informações geográficas, via internet, com as características espaciais do território onde pretende implantar um novo empreendimento. Disponível em <clique aqui>.

4 "Art. 69-A. Elaborar ou apresentar, no licenciamento, concessão florestal ou qualquer outro procedimento administrativo, estudo, laudo ou relatório ambiental total ou parcialmente falso ou enganoso, inclusive por omissão: Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.
§1º Se o crime é culposo: Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos.
§2º A pena é aumentada de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se há dano significativo ao meio ambiente, em decorrência do uso da informação falsa, incompleta ou enganosa"

5
Este dispositivo foi bastante discutido durante a sessão de julgamento realizada perante a Câmara Normativa e Recursal do Conselho Estadual de Política Ambiental de Minas Gerais (CNR-COPAM) no dia 25/10/2017, inclusive quanto à possibilidade jurídica de se dispensar a renovação de licença de operação (LO) para todas as tipologias inseridas no rol do art. 12. A redação do art. 12 que institui essa dispensa foi aprovada de forma não unânime pelo Conselho, com votos 5 contrários e uma abstenção por parte do representante do Ministério Público Estadual.
_________________________

*Leonardo P. Lamego
é sócio coordenador da área ambiental e minerária do escritório Azevedo Sette Advogados.


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