Entre os princípios garantidores da imparcialidade e independência do magistrado está o do livre convencimento para julgar o processo, a partir da apreciação livre das provas, que serão utilizadas para fundamentar as decisões. Entre as variadas possibilidades probatórias, temos o usual laudo pericial. O CPC de 1973, em seu artigo 436 preceituava que "O magistrado não está adstrito ao laudo pericial". O CPC de 2015, por sua vez, não trouxe a mesma redação. Na versão atual, o magistrado apreciará a prova pericial e as demais constantes dos autos, fundamentando as razões da formação do seu convencimento, conforme preceituam os atuais artigos 479 e 371:
Art. 479. O juiz apreciará a prova pericial de acordo com o disposto no art. 371, indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito. (CPC/15)
Art. 371. O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento. (CPC/15)
No curso processual, a busca pela verdade dos fatos, por vezes, transcende o conhecimento material e processual do trabalho possuído pelo magistrado, podendo este se valer da produção de prova pericial realizada nos autos do processo.
É utilizado este tipo de prova quando for o juiz carecedor de conhecimento técnico especializado, para examinar as alegações trazidas aos autos, sem que reste prejudicada a correta instrução processual.
Assim é o entendimento de Sérgio Pinto Martins:
Faltando conhecimento especializado ao juiz, este indica um técnico que possa fazer o exame dos fatos objeto da causa, transmitindo esses conhecimentos ao magistrado por meio de um parecer. Eis a perícia.1
Noutros casos, "a caracterização e a classificação da insalubridade e da periculosidade, segundo as normas do Ministério do Trabalho, far-se-ão através de perícia a cargo de Médico do Trabalho ou Engenheiro do Trabalho", nos termos do artigo 195 da CLT, o qual obriga a realização de perícia técnica para apuração de eventual trabalho insalubre ou perigoso.
Após sua realização e considerando que o laudo pericial supre a carência procedimental do magistrado no que tange as normas técnicas de Saúde e Segurança Ocupacionais, via de regra o juiz se utiliza do documento elaborado pelo expert perito para fundamentar seu comando sentencial.
É, contudo, de bom alvitre ressaltar que o magistrado não está obrigado a utilizar o laudo pericial em suas decisões, em que pese forte tendência em aceitá-lo. Nesses casos, destaca-se a extrema importância da audiência de instrução e julgamento na Justiça do Trabalho e sua condução por parte do advogado. O ato é essencial para o deslinde de uma reclamação trabalhista, seja individual ou coletiva, pois é possível a produção de demais outras provas admitidas em direito, especialmente a testemunhal. Tamanha sua importância e, quando bem produzidas, os magistrados se utilizam das provas colhidas na assentada para fundamentar suas decisões que acabam indo de encontro às conclusões periciais.
No início do corrente ano, no mínimo 3 (três) decisões em Vara do Trabalho do Extremo Sul da Bahia afastaram o conhecimento do laudo pericial, tendo em vista as provas produzidas em audiência de instrução, servindo estas como fundamento para julgar improcedentes reclamações trabalhistas coletivas, ajuizadas por diferentes sindicatos representantes da categoria profissional.
Um dos processos (0000022-95.2016.5.05.0531) versa sobre a caracterização de periculosidade para os motoristas carreteiros que, "desempenhando suas atividades na empregadora, acompanhavam o abastecimento dos caminhões, permanecendo em área de risco", pugnando, via de consequência, pelo recebimento do adicional de periculosidade respectivo.
Foram juntados aos autos laudos periciais onde o expert nomeado pelo juízo concluiu pela existência de periculosidade no ambiente de trabalho, uma vez que estes permaneciam dentro da área de risco durante o abastecimento, enquadrando-os na alínea "q" do item 3 do anexo 2 da NR-16, editada pela portaria do MTE 3.214/78.
Por outro lado, a prova testemunhal produzida sustentou a tese das reclamadas no sentido de que o mero acompanhamento do abastecimento não é capaz de caracterizar o Ambiente Perigoso de Trabalho, servindo de fundamento para o magistrado em sua sentença:
A prova oral produzida demonstra que o abastecimento dos veículos da 10 R Transportes era feito pelos frentistas da SUZANO (tomadora de serviço), limitando-se os motoristas carreteiros da prestadora a conduzir o veículo até o local de serviço e aguardar o término do abastecimento em local afastado. Sendo assim, uma vez que este juízo não está vinculado ou limitado às conclusões da prova técnica, deixo de acolher os laudos periciais apresentados pelo autor, considerando que o empregado não efetuava diretamente o abastecimento dos veículos que operava. Ora, o fato de o empregado apenas acompanhar o abastecimento do veículo, torna indevido o benefício, já que a Norma Regulamentadora n° 16, no anexo 2, quadro 3, dispõe que: "é perigosa a atividade de operadores de bomba e de trabalhadores que estão frequentemente em área de risco", o que não se verificou no caso presente.
Em um segundo processo (0001419-68.2011.5.05.0531), o sindicato pleiteia, também, o pagamento do adicional de periculosidade, além de insalubridade para os operadores de máquinas florestais que acompanham abastecimento de seus veículos, além de, supostamente, realizar determinadas intervenções mecânicas, tendo o laudo pericial apontado pela caracterização da insalubridade de grau máximo nas atividades e no local de trabalho dos substituídos durante o período laboral.
A importância da audiência de instrução e julgamento se destaca novamente, pois foi produzida prova testemunhal com robustez suficiente para afastar o laudo pericial elaborado pelo expert do juízo, assim fundamentando o magistrado em sua sentença:
"Restou provado que a empregadora possuía equipe de manutenção para consertos e reparos nas máquinas, bem como comboísta no momento do abastecimento. [...] Sendo assim, para os operadores de máquinas florestais, uma vez que este juízo não está vinculado ou limitado às conclusões da prova técnica, não acolho o laudo pericial, considerando que os empregados/substituídos não efetuavam diretamente o abastecimento das máquinas que operava."
No mesmo caminhar concluiu:
Reconheço a validade do laudo pericial e no mérito afasto seus fundamentos para reconhecer a inexistência de insalubridade e periculosidade para os operadores de máquinas florestais e indefiro o pedido de adicional de periculosidade e insalubridade e seus consectários.
Pelo que se verifica da dinâmica processual trabalhista, mesmo diante de provas que podem ser consideradas contundentes ao seu desfavor, a audiência de instrução e julgamento se mostra decisiva para a persecução do objetivo da parte, nos casos apresentados, as empresas, que visam a improcedência das ações.
Temos, por fim, que uma análise detida do processo, bem como uma preparação estratégica por parte dos advogados junto aos seus clientes, são cruciais para alcançar o resultado desejado. Sun Tzu2 já dizia: Antes de te engajares num combate definitivo, é preciso que o tenhas previsto, e te preparado com muita antecipação.
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1 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: doutrina e prática forense – 29ª Ed. – São Paulo: Atlas, 2009. Pág. 342.
2 Sun Tzu foi um general, estrategista e filósofo chinês. Sun Tzu é mais conhecido por sua obra A Arte da Guerra, composta por 13 capítulos de estratégias militares.
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