Na linha da definição de teses para garantir mais segurança jurídica às empresas, em 25 de maio de 2017, o Plenário do Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento de dois processos envolvendo transporte aéreo internacional de passageiros: um relativo a extravio de bagagem e outro, ao prazo prescricional de ação de responsabilidade civil decorrente de atraso de voo internacional. Em ambos os casos, a questão controvertida era a prevalência, nas relações de consumo, das convenções de Varsóvia e de Montreal ou do Código de Defesa do Consumidor.
Por maioria, decidiu-se pela prevalência das convenções internacionais, tendo sido fixada a seguinte tese: "nos termos do art. 178 da Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor.".
Caberá, agora, a todos os Tribunais de Justiça do país, em primeira e segunda instância, inclusive dos juizados especiais, decidir aplicando a tese firmada, seja em relação aos processos que estavam sobrestados, aguardando o julgamento do paradigma, seja em relação aos novos processos em tramitação.
Caso, contudo, os tribunais de origem decidam contrariamente à tese fixada, ou seja, caso apliquem o Código de Defesa do Consumidor aos casos de extravio de bagagem em voo internacional e às ações de responsabilidade civil referente a voo internacional, poderão as companhias aéreas ajuizar reclamação perante o Supremo Tribunal Federal para garantir a observância de acórdão de recurso extraordinário com repercussão geral reconhecida.
A possibilidade de utilização da reclamação para fazer cumprir tese de repercussão geral é uma inovação do Código de Processo Civil de 2015. Antes de sua vigência, não existia previsão legal para tanto, e a jurisprudência do STF era no sentido inadmitir as reclamações ajuizadas para este fim.
Entretanto, alguns requisitos devem ser observados, sendo o principal deles o esgotamento das instâncias ordinárias. O entendimento a respeito de quando haveria dito esgotamento ainda não foi pacificado pelo STF. Atualmente, a maior parte dos membros da Suprema Corte caminha no sentido de reconhecer haver o esgotamento das instâncias ordinárias quando o último recurso cabível é interposto: o agravo interno contra decisão que sobrestá ou nega seguimento a recurso extraordinário; ou, ainda, quando há juízo positivo de admissibilidade do recurso extraordinário.
Apesar da necessidade de esgotamento das instâncias ordinárias, a reclamação para garantia das teses fixadas em sede de repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal é meio processual eficaz e instrumento hábil a possibilitar a resolução de conflitos e a aplicação dos precedentes aos casos concretos, de forma mais simples e célere, revelando-se valiosa alternativa em relação ao recurso extraordinário. Com a tese do STF, define-se para as companhias aéreas a aplicação das convenções internacionais (e não do Código de Defesa do Consumidor) em questões envolvendo o transporte internacional de passageiros. Isso trará um cenário de segurança jurídica para as empresas. Nos casos de inobservância da tese pelos Tribunais, poderão as empresas socorrerem-se da reclamação.
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*André Macedo é sócio do BMA – Barbosa, Müssnich, Aragão e professor da Faculdade de Direito da UnB.
*Sarah Roriz de Freitas é advogada do BMA – Barbosa, Müssnich, Aragão.