As vantagens são inúmeras e, para citar apenas algumas, ressalto (I) a especialidade do julgador (no caso, dos árbitros, que podem ser escolhidos pelas partes, com base na sua expertise); e (II) a agilidade do procedimento, ao menos frente à morosidade do Poder Judiciário (embora essa diferença já tenha sido minimizada pelo processo digital e também pelas limitações recursais e aumento da verba de sucumbência, trazidos pelo novo Código de Processo Civil).
Mas há também mazelas a serem levadas em consideração em um procedimento arbitral. Uma delas são as elevadas custas, muitas vezes inferiores às de um processo judicial, pelo fato de este perdurar por anos, mas ainda assim consideráveis. Outra é o zelo, ou talvez, excesso de zelo dos árbitros ao enfrentarem questões de ordem pública, que acabam por onerar (ainda mais) o já custoso procedimento arbitral, em termos não só de valores, mas também de tempo, que sempre foi um grande diferencial positivo da arbitragem. É sobre esse zelo que pretendo tratar aqui.
Como sabido, a afronta a uma norma de ordem pública pode levar à declaração de nulidade dos atos praticados, seja em uma demanda judicial, seja no âmbito de uma arbitragem ou qualquer outro procedimento administrativo.
Tal respeito às normas de ordem pública e nulidade em caso de ofensa a ela datam da década de 1940. Essas questões foram introduzidas por Getúlio Vargas no decreto-lei 4.657, de 4 de setembro de 1942, então conhecido por Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, hoje Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Desde a sua promulgação, possivelmente dada à sua relevância, não sofreu qualquer alteração o artigo que trata da ineficácia dos atos (leis, sentenças ou manifestações de vontades) que ofendam a ordem pública (artigo 17).
Voltando ao nosso tema: questão de ordem pública em arbitragem justifica, sem sombra de dúvidas, a cautela dos árbitros ao abordar qualquer matéria que envolva ordem pública, bem como evitar a sua ofensa. Mas qual o limite entre o zelo e o comprometimento à celeridade do deslinde do procedimento arbitral, que afigura uma de suas grandes vantagens?
É claro que respeitar o princípio do contraditório, da ampla defesa, inclusive evitar o cerceamento de defesa, são atitudes esperadas e bem-vindas de um árbitro. Afinal, tais atitudes evitarão qualquer alegação de nulidade e uma consequente longa demanda judicial, questionando ofensa à ordem pública. Assim, mais uma vez terá sido prestigiada a celeridade da arbitragem.
O que se vê, muitas vezes, é um excesso de zelo, ao permitir a prática de atos que poderiam ser evitados ou encurtados, tudo sob o manto de evitar a ofensa à ordem pública. Manifestações em excesso das partes, prazo extra concedido, não decretação de preclusão da prática de atos ou mesmo perícia ou repetição de perícia são alguns exemplos de cautelas tomadas por alguns árbitros, que acabam por prolongar demasiadamente o procedimento arbitral (além de onerar financeiramente). A vedação da prática de quaisquer desses atos nem sempre configurará ofensa ao contraditório ou à outra norma de ordem pública. Aquele que a alega, na maior parte das vezes, está exercendo o seu "jus sperniandi" (direito de espernear, de reclamar), em um intuito desesperado de evitar uma condenação ou postergá-la.
Certamente que o conhecimento, a seriedade e até mesmo o bom senso dos árbitros são atributos suficientes e lhe dão amparo para abreviar o procedimento arbitral. Acontece que eles às vezes são levados por esse excesso de zelo, tentando evitar o risco de alegação de ofensa à ordem pública e a consequente nulidade em processo judicial da sentença arbitral, que possivelmente não seria acolhida pelo Poder Judiciário. Essa cautela tem por preço a prolongação da decisão e da condenação da parte.
Diante disso, fica a dúvida: excesso de zelo vale à pena?
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*Elisa Junqueira Figueiredo é sócia diretora do escritório Fernandes, Figueiredo, Françoso e Petros Advogados.