Porém, nem todas as funções podem ser desenvolvidas fora do ambiente da empresa, seja por limitação dos equipamentos utilizados, seja em razão da interação com clientes etc. Assim, é pouco provável que existirá teletrabalho para um caixa de supermercado, um operador de linha de montagem, um inspetor de qualidade ou um mecânico de manutenção. Na prática o teletrabalho ficará restrito a cargos administrativos.
Sob a ótica do empregado, quem se propõe a trabalhar no esquema de home office deve ser extremamente disciplinado e profissional. Disciplinado no sentido de não deixar que o ambiente doméstico interfira em suas atividades profissionais e vice-versa e, saber a hora de começar e parar o trabalho. Profissional quanto à forma de se vestir, bem como organizar o ambiente de trabalho, vez que soaria pouco profissional uma conversa com o cliente ser interrompida por latidos de um cão ou choro de uma criança.
Sob a ótica da empresa, o teletrabalho trará alguma economia relativa ao deslocamento dos empregados, refeições, cafés, postos de trabalho, manutenção de equipamentos, etc. No entanto, quem pensou que transferindo o trabalho para a residência do trabalhador se livraria das responsabilidades com o meio ambiente do trabalho se enganou. Ainda que de forma expressa e ostensiva a empresa instrua os empregados quanto às formas de evitar doenças e acidentes do trabalho, as figuras da insalubridade, periculosidade e aposentadoria especial continuarão a assombrar as corporações, a exemplo de trabalho ou atividade de:
• Operador de telemarketing com o uso de headset ajustado em alto volume com exposição a ruído acima dos limites de tolerância (insalubridade e aposentadoria especial);
• Qualquer empregado com exposição a temperaturas acima dos limites de tolerância (insalubridade e aposentadoria especial);
• Entregador de encomendas cuja atividade é desenvolvida à céu aberto com exposição ao ultravioleta do sol (insalubridade);
• Qualquer empregado numa edificação que contenha gerador alimentado por tanque de óleo diesel (periculosidade por força da OJ 385);
• Qualquer empregado que permaneça em área de risco pelo abastecimento de veículo (periculosidade);
• Qualquer empregado que conduza veículo com vibração de corpo inteiro superior ao limite de tolerância (insalubridade e aposentadoria especial).
Desta forma, os agentes nocivos à saúde e de risco acentuado, mesmo no ambiente doméstico, continuarão existindo e, caberá à empresa não somente a instrução sobre como evitar a doença ou acidente, como também a eliminação ou neutralização de tais agentes, sob pena do pagamento do adicional de insalubridade, adicional de periculosidade e recolhimento da contribuição do SAT suplementar (6, 9 ou 12% sobre a folha de pagamento).
Este será o maior desafio para as empresas, vez que se o controle do ambiente de trabalho é problemático, mais complexo ainda será o controle do ambiente doméstico do empregado. A exemplo do NTEP, onde a empresa necessita se municiar de informações sobre a vida social do empregado com finalidade de produzir contraprovas para descaracterizar eventuais nexos presumidos, o teletrabalho imporá um absoluto controle acerca do que o trabalhador faz e, onde faz, durante 24 horas por dia.
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*Antonio Carlos Vendrame é engenheiro de segurança do trabalho, perito judicial, professor com experiência nas áreas de segurança, saúde e meio ambiente e diretor da Vendrame Consultores.