A organização do 57º Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho, promovido pela LTr, me formulou a seguinte indagação: "A Justiça do Trabalho deve tratar as partes de forma equânime ou deve ser protetiva ao trabalhador?"
Tentando encontrar a resposta, fui buscar inspiração na letra da música, Copo Vazio, de Gilberto Gil, 1974, gravada por Chico Buarque, que ora reproduzo (sem cantar, é claro):
É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar
É sempre bom lembrar
Que o ar sombrio de um rosto
Está cheio de um ar vazio
Vazio daquilo que no ar do copo
Ocupa um lugar
É sempre bom lembrar
Guardar de cor
Que o ar vazio de um rosto sombrio
Está cheio de dor
É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar
Que o ar no copo ocupa o lugar do vinho
Que o vinho busca ocupar o lugar da dor
Que a dor ocupa a metade da verdade
A verdadeira natureza interior
Uma metade cheia, uma metade vazia
Uma metade tristeza, uma metade alegria
A magia da verdade inteira, todo poderoso amor
A magia da verdade inteira, todo poderoso amor
É sempre bom lembrar
Que um copo vazio
Está cheio de ar
Só com a menção a essa letra já teria, quero crer, respondido a questão. Mas vale a pena explorar um pouco mais a clareza que ela nos fornece para relembrar o que, de fato, representa o Direito do Trabalho.
O que a letra da música nos lembra? Lembra que as coisas, os fatos, os atos, não são apenas aquilo que aparentam ser; são, também, o inverso daquilo que poderia estar no lugar que ocupam.
E o que isto tem a ver com o Direito? O inverso do nada, ou seja, tudo!
A norma jurídica, de fato, ocupa o lugar daquilo que não há: respeito; confiança; igualdade; liberdade; justiça.
Se esses valores fossem possíveis na realidade social sem necessidade de coerção não estariam consignados em direitos. A consagração de direitos, sobretudo quando pensamos em direitos fundamentais e direitos sociais, tem, portanto, a configuração de conquista para uma humanidade que ainda está longe do ideal da constituição de uma sociedade efetivamente justa e igualitária, na qual os direitos não serão mais necessários.
O maior problema, no entanto, que se contrapõe ao processo de evolução da própria constituição da condição humana, é o que se verifica quando se tenta, por argumentos retóricos, pautados por lógica individual e imediatista, evitar que mesmo os direitos sejam aplicados.
O célebre desabafo de Norberto Bobbio expressa bem o falso dilema em que se colocam os seres humanos ao não conceberem a essencialidade dos Direitos Humanos:
Deve-se recordar que o mais forte argumento adotado pelos reacionários de todos os países contra os direitos do homem, particularmente contra os direitos sociais, não é a sua falta de fundamento, mas a sua inexequibilidade. Quando se trata de enunciá-los, o acordo é obtido com relativa facilidade, independentemente do maior ou menor poder de convicção de seu fundamento absoluto; quando se trata de passar à ação, ainda que o fundamento seja inquestionável, começam as reservas e as oposições.1
É interessante verificar que na consagração da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, essa preocupação foi expressamente manifestada quando se deixou claro que a razão humana não poderia ser utilizada para criar obstáculos aos objetivos do pacto pós-guerra.
Conforme diz o artigo I, do referido Documento, "Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade."
Ou seja, a razão não deve ser utilizada para negar a essência do agir com relação aos outros com espírito de fraternidade.
Neste mesmo sentido, vários Documentos ligados aos Direitos Humanos, dos quais os direitos sociais e, consequentemente, o Direito do Trabalho, são essência, trazem ao final de suas disposições uma fórmula jurídica que busca impedir o advento de uma intervenção revisionista negativa, reacionária, dos juristas.
Na própria Declaração Universal, por exemplo, a fórmula aparece no artigo XXX, nos seguintes termos: "Nenhuma disposição da presente Declaração pode ser interpretada como o reconhecimento a qualquer Estado, grupo ou pessoa, do direito de exercer qualquer atividade ou praticar qualquer ato destinado à destruição de quaisquer dos direitos e liberdades aqui estabelecidos."
Preocupados com a resistência à aplicação dos Direitos Humanos, reconhecendo, sobretudo, a influência que possam exercer os poderes políticos e econômicos locais, foi que se estabeleceu nos tratados internacionais a necessidade de institucionalização de um Poder Judiciário independente, considerado, pois, peça fundamental para a efetiva aplicação dos direitos humanos e sociais. O acesso ao juiz, inclusive, se insere, ele próprio, como um direito fundamental.
Como adverte Antônio Augusto Cançado Trindade: "assume importância crucial a autonomia do Judiciário, a sua independência de qualquer tipo de influência executiva"2
E essa preocupação ainda mais se reforça com relação aos direitos sociais, visto sua contraposição direta a interesses econômicos imediatos e particulares.
No caso brasileiro, a história, bastante recente, vale lembrar, da formação do Direito do Trabalho está diretamente ligada à criação da Justiça do Trabalho, cuja preocupação fundamental foi a de superar as resistências que se tinham, e que ainda persistem, à implementação e à aplicação do Direito do Trabalho.
Historicamente, os direitos trabalhistas ocuparam o lugar daquilo que não há nas relações de trabalho, igualdade entre o empregador e aqueles que para este vendem a sua força de trabalho para sobreviver.
É sempre bom lembrar que a efetivação dos direitos sociais depende de ações concretas, não podendo ser afastada por figuras de retórica ditadas pela impossibilidade econômica, vez que se destinam a preservar valores humanos.
O direito do trabalho (direito social por excelência), organizando o modelo de produção capitalista, existe para:
- melhorar a condição social e econômica do trabalhador (cuja força de trabalho é utilizada para a produção de riquezas)
- garantir os direitos de personalidade do trabalhador, direitos não pelo trabalho, mas em face do trabalho: vida, saúde, intimidade, privacidade, honra, integridade moral e psíquica, convívio familiar, lazer, cidadania.
Esta compreensão principiológica é fundamental para que o Direto do Trabalho não se transforme em mera equação matemática.
E se o não agir da sociedade neste sentido é condenável, a não ação dos operadores (construtores) do Direito – especialmente, juízes, aos quais se conferiu garantias exatamente para suportar as pressões dos demais poderes – é imperdoável. Equipara-se a um crime contra a humanidade.
Afinal, já se aprendeu bem a lição do equívoco da noção jurídica de que qualquer conteúdo pode ser de direito. E com a consciência em torno dos nefastos efeitos para a humanidade desse pressuposto, chegou-se ao seu inverso. Assim, a integração dos princípios de proteção da dignidade humana à ordem jurídica ocupa o lugar onde se poderiam integrar interesses obscurantistas e autoritários, fazendo com que os coautores da ordem jurídica, juristas, advogados e magistrados, sejam obrigatoriamente atraídos para o compromisso quanto ao dever de agirem com relação aos outros com espírito de fraternidade. A inércia, a conivência, o comodismo e a indiferença frente aos problemas sociais e ao sofrimento alheio cedem lugar ao compromisso social em torno da essencialidade dos Direitos Humanos, que é, portanto, um dever dos profissionais do Direito.
Isso não quer dizer, em momento algum, que os juízes devam conferir direitos aos cidadãos que estes não possuam, mas que estejam efetivamente imbuídos no propósito de não permitir que os Direitos Humanos pereçam e essa preocupação não é restrita aos interesses dos trabalhadores, atingindo, isto sim, a todos, indistintamente, até mesmo aos empregadores, pessoas físicas, na condição de executados, pois a sanha de condenações como estratégia para se obter um efeito paralelo está se alastrando irrefletidamente. Outro dia, fiquei vencido, de forma isolada, em um julgamento que considerou que o mandado de segurança não seria o remédio adequado para um executado que, por conta de uma decisão judicial, se viu privado do seu Passaporte e da sua Carteira de Habilitação enquanto não apresentasse bens que pudessem garantir a execução. De forma mais dramática, lembre-se das diversas pessoas presas no Brasil sem respeito ao devido processo legal e de tantas outras que são mantidas presas mesmo após transcorrida a pena. Nada, mas nada mesmo, justifica o risco de se atingir o nível de arbitrariedade que, recentemente, vitimou brutalmente um jovem americano na Coreia do Norte por ter cometido o "crime" de retirar uma propaganda política de um poste.
Fato é que ao se pautar a questão dos limites da atuação dos juízes, sugerindo que a aplicação de direitos fundamentais constitui uma proteção indevida do cidadão, verifica-se a concretização da advertência feita na Declaração Universal de 1948, quanto aos riscos da utilização da razão para negar vigência aos Direitos Humanos.
Ora, quando, ainda que de forma velada, se atrai o tema da imparcialidade dos juízes como uma forma de oposição à aplicação dos Direitos Humanos, o que se tenta é fazer uso da razão exatamente para criar um obstáculo à efetivação dos Direitos Humanos. Estabelece-se um falso dilema, ou uma oposição fora de lugar.
A imparcialidade do juiz não ocupa o lugar da efetividade dos direitos, muito pelo contrário. A imparcialidade é a garantia dos cidadãos de que o juiz não se guiará senão pela ordem jurídica e pelo objetivo preciso de fazer valer o Direito.
Quando está em questão a aplicação de Direitos Humanos, a visualização necessária é a da essencialidade desses direitos, que os colocam em nível de superioridade a quaisquer outros, exatamente para que a humanidade não retroceda a momentos históricos em que a vida humana sucumbiu a interesses imediatistas, puramente econômicos, que geraram preconceitos, xenofobia e ódios.
A essencialidade dos direitos sociais e, consequentemente, do Direito do Trabalho, conforme consignado nos Tratados Internacionais e na Constituição Federal brasileira, é inconteste e negar isso não é ser imparcial e sim descumprir um dever funcional.
A própria pergunta formulada ocupa o lugar de uma investigação mais consistente e essencial, que é a do compromisso que todo juiz deve ter com a efetivação dos Direitos Humanos e dos direitos fundamentais, o que não está em oposição com sua imparcialidade, como, de forma equivocada, a pergunta faz sugerir.
Um juiz que reconhece a desigualdade material e até processual entre as partes em conflito, para conferir a cada uma as possibilidades de atuação na medida de suas potencialidades, e com isso permitir que o fato que gerou o dissídio lhe chegue por inteiro e não pela metade, está atuando em conformidade com a ordem jurídica e não o contrário, até porque o resultado final de sua atuação será o de aplicar o direito ao fato.
A pergunta, no entanto, ao pôr em contraposição imparcialidade e reconhecimento da desigualdade, sugere que o juiz do trabalho ao agir sem a venda nos olhos estaria protegendo o trabalhador, no sentido de lhe conferir direitos indevidos, mas o efeito desse questionamento impróprio é o da ineficácia concreta da ordem jurídica.
De fato, a não percepção da desigualdade das partes pelo juiz representa a assunção de um valor. O não agir, quando se está diante de um conflito em que se debate a aplicação de direitos fundamentais, é, em verdade, um ferimento do princípio da imparcialidade, vez que representa um ato que contribui para a ineficácia do direito, podendo ser visto, de certo modo, como uma atuação parcial em favor da parte que detém maior força econômica.
Pensem bem todos que estão aqui presentes e que lidam com o Direito do Trabalho e a prática processual. Se forem assumidos todos os pressupostos do Processo Civil clássico, que nem mesmo o atual CPC reconhece, toda atividade processual seria imputada ao reclamante. Assim, a inércia, ou seja, a ausência de impulso processual pelo juiz, só favoreceria à reclamada.
Fato é que a inércia e a indiferença do juiz, disfarçada em imparcialidade, ocupa o lugar da efetividade dos direitos fundamentais.
Aliás, se formos bem atentos, poderemos verificar que esse falso dilema, que reiteradamente se tenta fazer debruçar sobre os ombros dos juízes do trabalho, tem provocado uma atuação da Justiça do Trabalho, em diversas questões, oposta àquela que deve constituir o seu objetivo principal, que é o da aplicação concreta dos direitos trabalhistas.
O falso dilema tem provocado quase que uma atuação da Justiça do Trabalho protetiva dos empregadores em várias questões.
Quando se trata, por exemplo, da conciliação, fala-se que o objetivo do processo é a pacificação social, como se a solução de um processo, em acordo individual, pensado exclusivamente, nos limites dos interesses das partes em conflito, tivesse essa repercussão positiva na esfera social, sendo que, concretamente, o que pode haver é exatamente o contrário, ou seja, o aumento do conflito social quando a conciliação, representando renúncia a um direito por parte do trabalhador, assume o desrespeito à lei como prática possível e não punível por parte dos empregadores. Essa busca desenfreada pela conclusão de acordos, para a melhoria de dados estatísticos e a solução dos problemas estruturais da Justiça, tem provocado uma verdadeira avalanche de supressão de direitos reais dos trabalhadores. Para comprovar isso basta que se comparem os valores pagos em execução de sentença com aqueles que são pagos em acordos pelos mesmos objetos.
Na questão da prescrição, a interpretação do dispositivo constitucional foi a mais restritiva de direitos possível, negando-se, inclusive, a necessária correspondência que o instituto da prescrição mantém, na lógica sistêmica da Constituição, com o instituto da relação de emprego protegida contra a dispensa arbitrária.
Da mesma forma, quantos não são os procedimentos adotados que ainda sobrecarregam os reclamantes com o tal "ônus da prova do fato constitutivo", que há muito nem mesmo o processo civil empurra aos desfavorecidos economicamente? Procedimentos que, como se sabe, tantas vezes impedem que o reclamante consiga demonstrar nos autos a completa realidade dos fatos vividos durante a relação de emprego, valendo lembrar que por não se ter, até hoje, garantido ao trabalhador a proteção contra a dispensa arbitrária, as reclamações trabalhistas são, na quase totalidade, movidas por ex-empregados, havendo, portanto, um distanciamento considerável entre o momento do trâmite da reclamação e o da ocorrência dos fatos.
Lembre-se, ainda, da renitência que durante mais de duas décadas se teve para reconhecer a aplicação de direitos fundamentais à relação de emprego doméstico; a dificuldade que ainda se verifica para assumir a responsabilidade objetiva pelos acidentes do trabalho e os valores das indenizações.
Não se esqueça, sobretudo, do permissivo que a Justiça do Trabalho conferiu, desde 1993, para a terceirização, que provocou um enorme dano a milhões de trabalhadores brasileiros ao longo desse período, com baixos salários, elevados números de acidentes, trabalho em sobrejornada, invisibilidade e ausência reiterada do pagamento de verbas rescisórias e recolhimentos fundiários. Recorde-se, a propósito, da invenção jurídica pertinente à responsabilidade subsidiária, que, contrariando toda a lógica do Direito das Obrigações, tal qual regulada no Direito Civil e em diversos outros ramos jurídicos, constitui instrumento para punir o credor, com o agravante de que no caso do Direito do Trabalho esse credor é titular de direitos fundamentais.
Aliás, a prática judiciária trabalhista insiste em não reconhecer o desrespeito aos direitos trabalhistas como ato ilícito, que efetivamente é, pois os efeitos jurídicos que se atribuem à não aplicação dos direitos dos trabalhadores são apenas os que se expressam na própria lei, mesmo que praticada de forma reincidente, contrariando até mesmo a dinâmica dos demais ramos do direito, que punem o agressor da ordem jurídica, ainda mais quando age de maneira reiterada.
Por fim, importante fazer menção aos sucessivos ataques cometidos pela Justiça do Trabalho ao direito de greve, aplicando-se uma lei que desdiz a Constituição, chegando ao cúmulo de vislumbrar a aplicação de uma ação de índole possessória, do interdito proibitório, para coibir o exercício do direito de greve.
O passo necessário, portanto, seria o de se reconhecer que muito ainda há por fazer no Brasil para que se confira efetividade aos preceitos jurídicos constitucionais voltados às relações de trabalho.
Neste momento histórico preciso, a indagação formulada, dentro de um painel que se enuncia "A Justiça do Trabalho em tempos de crise", fazendo supor, inclusive, que a crise econômica é culpa dos juízes e juízas do trabalho ou que possa ser solucionada por estes se agirem em colaboração com os interesses do capital, aceitando, com naturalidade, o retrocesso social, nos esvazia a preocupação em torno da efetividade dos direitos e coloca no lugar uma falsa dicotomia.
Além disso, parece querer reforçar o estereótipo de que na Justiça do Trabalho o trabalhador sempre ganha, mesmo sem ter razão, e que seria a hora da Justiça do Trabalho tomar uma postura supostamente equilibrada e neutra, pautando-se pela racionalidade civil, quando se sabe que a proporção de processos em que os autores vencem é a mesma em todos os ramos do Judiciário, vez que é o autor quem propõe a ação e o faz após avaliar as potencialidades jurídicas de sua demanda.
Essa retórica, ademais, ocupa o lugar da realidade brasileira, que é uma realidade histórica marcada pela ineficácia da legislação do trabalho, pela desigualdade social e pelo sofrimento cotidiano das pessoas que dependem da venda da sua força de trabalho para sobreviver.
Neste momento histórico, em que uma reforma trabalhista que ofende a nossa inteligência e tenta impor a racionalidade econômica e privatista sobre a solidariedade e do compromisso com a defesa da dignidade humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o risco maior é o de que no lugar da defesa da independência e da preocupação social os juízes coloquem uma comprometedora aproximação com o poder econômico, sendo que mesmo a inércia e o comodismo representam um agir em sentido contrário, ou seja, uma concordância com o desmonte do projeto constitucional que a "reforma" representa.
Ainda que não tenha sido, obviamente, o propósito dos formuladores da pergunta, no contexto histórico vivido, em que a democracia está sendo afrontada, em que o princípio do não-retrocesso social e humano está sendo desafiado, fazendo aflorar o fantasma do escravismo, a indagação, sem ser devidamente esclarecida, pode colocar no lugar da busca conhecimento a intimidação, até porque deixa em aberto, perigosamente, um tipo de atuação jurisdicional que ocupa o lugar de um agir em sentido contrário, sendo que o que se exige, mais do que nunca, é o uso da razão e da consciência para reafirmar o compromisso com os princípios democráticos e com os preceitos do Estado Social de Direito.
É nesses momentos, em que as conveniências e o mascaramento de interesses pessoais, travestidos de preocupações políticas e econômicas, invadem o espaço e o patrimônio públicos, que ganham sentido concreto as garantias da magistratura, notadamente, a independência, para que se possa conferir efetividade aos valores humanos, cumprindo, pois, aos juízes, não ceder, não tergiversar e não temer, pois, como dizia Couture, no dia em que os juízes têm medo, nenhum cidadão pode dormir tranquilo.
E o tempo temido da ameaça concreta ao compromisso da humanidade consigo mesma se faz presente e resistir, com todas as forças, ao assombro da barbárie, que pode encontrar morada em nossas próprias mentes, é o desafio real e concreto que devemos encarar de frente.
Por isso, como advertiria Drummond,
Não serei o poeta de um mundo caduco
Também não cantarei o mundo futuro
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças
Entre eles, considero a enorme realidade
O presente é tão grande, não nos afastemos
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história,
Não direi os suspiros ao anoitecer, a paisagem vista da janela,
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida,
Não fugirei para as ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente
E, mais uma vez, o que a vida quer da gente é coragem.
Palestra proferida no Congresso Brasileiro de Direito do Trabalho, organizado pela LTr, no dia 20/06/17, em São Paulo/SP.
__________
1 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 1 ed. 12. tir. Tradução: Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p. 24.
2 CANÇADO TRINDADE, Antônio Augusto. “Direito Internacional e direito interno: sua interação na proteção dos Direitos Humanos”. Prefácio da obra: Instrumentos internacionais de proteção dos Direitos Humanos. São Paulo: Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado, 1997, p. 24., pp. 24-25.
__________
*Jorge Luiz Souto Maior é professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP.