A advocacia tem nítida ligação com os interesses da sociedade, assim como vem atrelada umbilicalmente aos novos fatos que vão surgindo e exigem a presença de um profissional da área jurídica, algumas vezes para fazer um aconselhamento, outras para exercer efetivamente o direito de defesa. A Constituição Federal, em seu artigo 133, de forma clara e abrangente, estabeleceu: "O advogado é indispensável à administração da Justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei".
Nos últimos tempos, com a constante atuação da operação Lava Jato, tornou-se comum a presença não só de advogados que exercem a defesa dos réus presos ou em liberdade, na costumeira praxe forense, como também de outros profissionais do Direito, que realizam o assessoramento e acompanhamento dos acusados que pretendem fazer a delação premiada.
É comum, pelo menos de acordo com as notícias veiculadas, que o réu, geralmente preso em razão de decretação de prisão preventiva, antevendo possível condenação, não em razão de postura desidiosa de seu defensor, mas sim pela pesada carga probatória que o atinge, desiste do advogado que o representava na lide penal e providencia a contratação de outro, especializado na colaboração premiada. Fica até mesmo desconfortável eticamente para o advogado que defendia o réu abandonar sua linha defensiva e passar a dialogar com o Ministério Público em busca de benefícios. Recomenda-se, portanto a escusa em razão da objeção de consciência.
Assim, dentre as inúmeras opções que se apresentam para aqueles que abraçaram a advocacia, surge mais um canal que possibilitará o exercício de defesa, não aquela proveniente do conflito de interesses entre a denúncia e a pretensão resistida, conforme determina a regra da dialética hegeliana, mas sim outra, ligada diretamente aos interesses do acusado que se apresenta como colaborador da Justiça.
Nesta função, que tem um âmbito restrito e limitado de atuação do profissional, não serão discutidas provas e nem mesmo argumentos defensivos no sentido de se pleitear a absolvição do acusado. Muito pelo contrário. O quadro apresentado, por si só, já recomenda a condenação. O advogado irá confabular com os representantes do Parquet sobre qual ou quais vantagens poderão ser concedidas ao seu cliente, tanto na concessão imediata de liberdade provisória com as mínimas ou suportáveis restrições legais, como também o quantum da redução da pena, sua modalidade de cumprimento, progressão, fixação da pena de multa e pena compensatória e até mesmo o perdão judicial. Além do que, conforme o caso, irá pleitear a inclusão de seu cliente no programa de proteção de delator, com as garantias previstas nos artigos 8º e 15 da lei 9.807/1999 e irá fiscalizar os termos da renúncia ao direito de autoincriminação e ao direito ao silêncio (nemo tenetur se detegere), nos termos do artigo 4º, § 14, da lei 12.850/2013 e, a todo tempo, em qualquer ato, deverá assistir seu cliente, segundo a regra do artigo 4º, § 15 da última lei citada.
Pode-se dizer como Rui Barbosa, ao responder uma consulta formulada por Evaristo de Morais: "A defesa não quer o panegírico da culpa ou do culpado. Sua função consiste em ser, ao lado do acusado, inocente ou criminoso, a voz dos seus direitos legais"1.
E é indiscutível que a extensão do benefício será condizente com a quantidade de informação ofertada e que tenha suporte probatório para alicerçar a proposta acusatória promovida com relação aos réus duplamente denunciados, tanto pelo Ministério Público, pela denúncia oficial, como pelo delator, no papel de colaborador. Pode-se até dizer que se trata de uma barganha que se faz com o acusador público, pois irá conferir a ele informações privilegiadas a respeito de uma conduta ilícita praticada por um grupo criminoso e, em compensação, receberá os dividendos processuais de seu arrependimento. Não há contraditório com relação ao procedimento e sim termos de ajustes de propostas até que seja selado um acordo consensual, submetendo-o, posteriormente, à homologação pelo Judiciário, justamente para resguardar os direitos do colaborador que, pela sua conduta, não pode ser considerado como cidadão de segunda categoria, já que se encontra no exercício de um direito legalmente consagrado.
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