Governança Corporativa I
Jorge Lobo*
Introdução
“Os códigos de governança corporativa estão proliferando... Contudo, os escândalos corporativos continuam surgindo... O que pode e deve ser feito”? (John Plender e Avinash Persaud)
Mas, têm-se indagado, com insistência: o que significa, para que serve, como vem sendo empregada a “Governança Corporativa”?
Governança corporativa é o conjunto de normas, consuetudinárias e escritas, de cunho jurídico e ético, que regulam os deveres de cuidado, diligência, lealdade, informação e não intervir em qualquer operação em que tiver interesse conflitante com o da companhia, e respectivas responsabilidades, e que disciplinam o exercício das funções, atribuições e poderes dos membros do conselho de administração, da diretoria executiva e do conselho fiscal e dos auditores externos, em especial de companhias de capital aberto, e o relacionamento entre si e com a própria sociedade, seus acionistas e o mercado em geral.
Surgida há mais de um século na Inglaterra, no alvorecer do capitalismo moderno nos países anglo-saxões e praticamente hibernada durante décadas, a governança corporativa reapareceu, com força e vigor, nas décadas de 70 e 80 do século XX e, nos últimos dez anos, passou a ser assunto do cotidiano de políticos, empresários, administradores de empresas, economistas, juristas, auditores e contadores, no país e no exterior, em virtude de gravíssimas crises e falências de empresas nacionais e multinacionais, provocadas por gestão temerária e ruinosa, fraudes contábeis, falsificação e deturpação de dados e documentos, manipulação de balanços, dilapidação de ativos patrimoniais, escândalos financeiros, etc.
Processos bilionários (em dólares americanos) de fusões e aquisições (F&A), que se multiplicaram na década de 90 do século passado e no limiar deste novo milênio, aliás em número crescente e deveras impressionante, estão invariavelmente repletos de “armadilhas”, das quais sobressaíram sempre o superfaturamento e superestimativas de sinergia, e, recentemente, falhas de governança corporativa, não detectadas por due diligence pré-aquisição, como ficou patente nos litígios Sunbeam/Coleman, MCI/WorldCom, Cendant e AOL/Time Warner.
A reiteração das falhas pré e pós-aquisição e a seqüência de quebras de mega-companhias transnacionais produziram uma pletora de obras sobre governança corporativa, redigidas, nos últimos vinte anos, por professores de direito, administradores de empresas e economistas, e, outrossim, uma série de “Códigos de Condutas”, por alguns vistos com ceticismo, porquanto imporiam um exercício apenas retórico e assaz burocrático de cumprimento de normas, pois “muitos códigos são exercícios cínicos de relações públicas” (John Plender e Avinash Persaud, no livro “A Reality Check on Business and Finance Ethics”), enquanto, para outros, as companhias “devem elevar seus padrões de governança corporativa e reconhecer que a ética nos negócios é a opção mais lucrativa” (Harvey Pitt, ex-presidente da SEC – Securities and Exchange Commission, in Capital Aberto, ano 5, nº 2).
No firme propósito de colaborar no debate, organizei o seguinte decálogo de “Princípios de Governança Corporativa”: eticidade; moralidade; ativismo societário; proteção ao acionista minoritário; tratamento eqüitativo; transparência e divulgação de informações; independência dos administradores; responsabilidade dos administradores; razoabilidade ou proporcionalidade e função social da empresa, e deles tratarei um por um nas próximas semanas.
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*Livre Docente em Direito Comercial pela UERJ
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