Migalhas de Peso

Possível execução de saldo devedor ativo nas ações revisionais bancárias

O que deve ser levado ao crivo do Judiciário, sem dúvidas, são matérias com fito de equalizar a justiça entre os entes envolvidos, e não aspectos já tratados em seara contratual e que está bem definida.

29/5/2017

I - INTRODUÇÃO

Em todos meus escritos, defendo a flexibilidade dos procedimentos do Código de Processo Civil, fornecendo uma agilidade na prestação jurisdicional, facilitando o dia a dia de quem labora com a Justiça e consulentes.

O que deve ser levado ao crivo do Judiciário, sem dúvidas, são matérias com fito de equalizar a justiça entre os entes envolvidos, e não aspectos já tratados em seara contratual e que está bem definida, sem dúvidas ou afim. Veja que, se o contrato bancário faz lei entre as partes e estando o mesmo abalizado pelos parâmetros dos órgãos reguladores e judiciais, não há que ser intentada qualquer forma de revisão de tal contrato, exceto em casos pontuais ou não previstos em lei ou acordo de vontades.

Em outras palavras, a melhora da volumetria de processos existentes no Judiciário é um dever de todos, principalmente do Judiciário quanto a tratativa de alguns temas que são levados mensalmente ao seu crivo e, nesse aspecto, teço a preocupação quanto as ações revisionais de contratos bancários. Chamo efetivamente atenção para tal assunto, pois o número de ações discutindo tal matéria é assustador.

O ponto é, caso exista uma demanda revisional bancária e, após liquidação dos cálculos, os doutos peritos ou judiciário entenderem que resta saldo remanescente credor a Instituição Financeira (obedecendo as regras contratuais) e, em conjunto com as disposições do atual Código de Processo Civil, temos claramente que é possível via ordenamento jurídico que ocorra o cumprimento de sentença nos próprios autos, no caso de inadimplência concreta do ora autor da ação revisional.

Jamais pensamos em bloquear ou dificultar com o presente trabalho o acesso à justiça, mas sim, que ocorra aplicação de preceitos mínimos para legitimar tal tipo de ação. Necessário refletir sobre esse tema, por isso, trago o alerta.

Com o presente trabalho e sem prolongar nesse momento, possuímos justamente o intuito de trazer ganho de escala em julgamentos ao Poder Judiciário, que carece sem dúvidas de uma visão estruturada e, até mesmo, estratégica ou empresarial em seu modo de administrar os processos.


II – AÇÃO REVISIONAL BANCÁRIA

A ação revisional bancária, por si só, é a demanda proposta pelo consumidor / cliente (seja pessoa física ou jurídica) contra instituição financeira (sentido amplo), visando rever disposições ou cláusulas contratuais existentes em pacto financeiro, provocando o Poder Judiciário para manifestação ou equalização dos contratos no todo ou em parte.

Via de regra, entende-se para propositura de tal demanda que alguma clausula ou taxa está equivocada ou falta transparência no seu bojo, pedindo pronunciamento do Poder Judiciário sobre eventual equalização do contrato.

Esse tipo de ação, muito comum em nosso país e que atravanca o Judiciário (ainda mais na crise que passamos), é menos observada em países com economia consolidada (que passou por menos impactos do que a Brasileira) e, ainda, fruto da cultura social (menos litigiosidade e viés de cumprimento estrito e integral dos pactos celebrados). No que concerne as ações revisionais bancárias e temas financeiros, as matérias mais relevantes que são levadas ao seu crivo são: Capitalização de Juros, Juros Remuneratórios, Comissão de Permanência e o famoso VRG – Valor Residual Garantido.

Veja que, o nosso Judiciário já possui Jurisprudência consolidada (Tribunal Superior) em muitos casos, portanto, não deveríamos ter esse volume exacerbado de ações judiciais de revisão bancária que ainda ocorrem em nosso pais. Ademais, todas as Instituições Financeiras autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil seguem detidamente as Resoluções do referido Órgão Regulador (BACEN), que doutrina o mercado financeiro. Neste diapasão, os principais temas afetos as reclamações revisionais, também obedecem tais regras jurídicas e conceituais, sendo, portanto, legais.

Isto posto, observem que tais matérias supra elencadas que ensejam demandas revisionais são bem abordadas nos contratos celebrados de cunho financeiro, justamente para evitar questionamentos na seara judicial abordando alguma eventual ilegalidade ou contradição, entretanto, não é o que ocorre no dia a dia de quem labuta com contencioso bancário, em que pese uma tendência de queda na propositura de novas demandas afetas a tal tema, conforme já ressaltamos. Lembro que, o interesse não é limar a existência de novas ações revisionais bancárias, entretanto, trazer à baila do Judiciário somente processos em que ocorreu alguma inobservância nos contratos celebrados, e não pontos desnecessários ou outrora abalizados.

O Judiciário já possui entendimento sobre os principais temas afetos as ações revisionais bancárias, portanto, não existe razão para existir grande volumetria de ações revisionais, considerando o bom e regular pacto contratual celebrado em observância com os entendimentos em tela e BACEN. Melhorando a prestação e efetivada judicial, houve por parte do órgão regulador publicação do ordenamento - Resolução do Banco Central – BACEN de nº 3517/2007, a qual prevê a instituição e inclusão da “CET” nos contratos, que é o Custo Efetivo Total da operação contratada. Nela, o consumidor tem ciência do total financeiro que pagará por determinado contrato bancário, inexistindo razão para ingresso de demanda revisional.

Outrossim, para propositura de demanda revisional bancária, é necessário que exista a boa-fé do ente ativo (consumidor / cliente), para legitimar tal ingresso de nova ação judicial. Assim, relatamos a definição de Claudia Marques Lima, in Contratos no Código de Defesa do Consumidor, Ed. RT, 3ª ed. 1999, p.107, boa-fé significa:

“...uma atuação ‘refletida’, uma atuação refletindo, pensando no outro, no parceiro contratual, respeitando-o, respeitando seus interesses legítimos, suas expectativas razoáveis, seus direitos, agindo com lealdade, sem abuso, sem obstrução, sem causar lesão ou desvantagem excessiva, cooperando para atingir o bom fim das obrigações: o cumprimento do objetivo contratual e a realização dos interesses das partes...”.

Não podemos refutar a preocupação dos legisladores e processualistas em permitir ações judiciais com justo e razoável motivo, e assim, levar ao Poder Judiciário tão somente os casos em que mereça resposta do Estado em sentido maior e definitivo. Em contraponto, creio que casos contratados legitimamente, com ciência prévia dos detalhes do contrato e valores (respeitando normas do BACEN), são prejudiciais se levados a batuta do referido órgão para, eventualmente, ser perquirido pelo cliente / consumidor determinado “desconto ou alívio” financeiro pelo pagamento da contraprestação. Não é esse o papel que o judiciário deve ter, e sim, equalizar eventualmente situações conflitantes ou injustas, aplicando o Direito e Lei ao caso concreto, fazendo justiça em sentido lato.

III – EXECUÇÃO DE DÉBITO NA REVISIONAL

Para ingresso de ação revisional bancária, a parte autora deverá sempre observar o disposto no Artigo 330 do Código de Processo Civil, alertando principalmente no Parágrafo 2º, vejamos:

“...Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:

§ 2o Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.

Fato é que, após instrução processual da demanda revisional e, com trânsito em julgado da sentença, é iniciado muitas vezes o cumprimento de sentença (ilíquida), com perícia contábil e afim. Ocorre que, ao ser finalizado os cálculos e homologados pelo Douto Magistrado, percebe-se que ainda existe saldo credor para a Instituição Financeira e, nessa seara, alertamos que o Código de Processo Civil vigente (por economia processual e flexibilidade), permite a continuidade de referida execução / cumprimento de sentença, nos próprios autos da revisional abalizada pela Justiça. Tal autorização consta no artigo 523 do Código de Processo Civil, vejamos:

“...Art. 523. No caso de condenação em quantia certa, ou já fixada em liquidação, e no caso de decisão sobre parcela incontroversa, o cumprimento definitivo da sentença far-se-á a requerimento do exequente, sendo o executado intimado para pagar o débito, no prazo de 15 (quinze) dias, acrescido de custas, se houver...”.

Assim, o contexto do referido artigo é justamente abordar tal possibilidade de continuar o cumprimento de sentença pelo réu nos autos da demanda revisional (com saldo credor flagrado para o réu), bem como, reforçar a necessidade de otimizarmos cada vez mais as ações judiciais, auxiliando o Judiciário quanto a agilidade tão esperada.


IV – BIBLIOGRAFIA

MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor, Ed. RT, 3ª ed. 1999, p.107;

________________

*Douglas Belanda é advogado Corporativo em SP, sendo atualmente Secretário da Comissão de Departamento Jurídico da OAB/SP, Seccional de Pinheiros/SP.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

O SCR - Sistema de Informações de Crédito e a negativação: Diferenciações fundamentais e repercussões no âmbito judicial

20/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024