Eficácia temporal dos créditos constituídos por meio de sentenças trabalhistas: o problema da decadência do direito de lançar contribuições previdenciárias
Henrique Silva de Oliveira*
O Superior Tribunal de Justiça está discutindo a constitucionalidade de tais dispositivos, por meio de controle difuso1. Em sentido idêntico, existem julgados do Órgão Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região2.
Cabe uma digressão. A contribuição previdenciária é lançada ordinariamente por homologação, ou seja, compete ao contribuinte, a cada dia dois do mês posterior ao da folha de salários, recolher as contribuições apuradas a partir da folha, nos termos do Decreto nº 3.048, de 6.5.1999 (clique aqui).
Assim, a sentença que, em uma reclamação trabalhista, reconhece o vínculo e condena a pagamento de verba remuneratória devida em decorrência de relação de trabalho (essa verba é fato gerador da contribuição previdenciária), opera de maneira atípica função administrativa de revisão do pagamento antecipado, como previsto no artigo 150 do Código Tributário Nacional.
Se na sentença se rejeita a pretensão indenizatória, opera-se ali a homologação expressa do lançamento, no sentido do § 4º do artigo 150 do Código Tributário Nacional, ao menos no que diz respeito à contribuição que, no documento de arrecadação da Previdência Social, se relaciona com aquele reclamante, naquele(s) específico(s) mês(meses) objeto de pronunciamento jurisdicional.
Se, por outro lado, acolher-se na sentença a pretensão do reclamante, inicia-se ali o procedimento para lançamento de ofício, nos termos do artigo 149, inciso V, do Código Tributário Nacional. Este procedimento somente se ultimará com a prolação de decisão sobre os cálculos, vale dizer, com a liquidação da sentença trabalhista, quando então estará “calculado o montante do tributo devido” (artigo 142 do Código Tributário Nacional).
Tais eventos devem ser cuidadosamente observados, em especial por ocasião ( i ) da impugnação dos cálculos, caso a liquidação se dê antes da execução (como é a praxe no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região); ( ii ) por ocasião dos embargos à execução das próprias verbas trabalhistas ou das contribuições previdenciárias, caso seja esta a primeira oportunidade dada à reclamada para manifestar-se sobre os cálculos; ( iii ) por ocasião da decisão, por parte do Juiz Trabalhista, sobre os cálculos, pois deverá observar, de ofício, a ocorrência da decadência do direito de lançar.
Merece atenção, ainda sobre a eficácia temporal das sentenças trabalhistas, a data da prolação da sentença ou da decisão sobre cálculos, tendo em vista a data em que a Justiça do Trabalho passou a ser competente para apurar e promover a execução de contribuições previdenciárias4 (16.12.1998, com a edição da Emenda Constitucional nº 20) e a data em que se tornaram obrigatórias tal apuração e execução das contribuições previdenciárias (26.10.2000, com a edição da Lei nº 10.035 - clique aqui). Os referidos marcos temporais podem servir de ponto de partida de exame mais detalhado sobre o contingenciamento, junto às empresas, de despesas com contribuições previdenciárias.
Por fim, deve-se fazer atenção ao seguinte. São freqüentes as lamúrias do Poder Executivo acerca do déficit orçamentário da previdência. No entanto, é solução absurda agredir-se (ainda mais) o Direito e a Constituição e onerar-se o setor privado, para fazer frente aos gastos inexplicáveis com uma administração tributária de baixa eficiência e com benefícios previdenciários iniquamente muito mais vantajosos para os egressos dos quadros públicos.
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1 Ver AgRg em REsp nº 616.348/MG, em que foi suscitado o incidente de inconstitucionalidade, ainda em discussão, com julgamento parcial, suspenso em 7.12.2005. Votaram quatro ministros a favor da tese de inconstitucionalidade do artigo 45 da Lei nº 8.212/91 – em razão do prazo de decadência do direito de lançar fixado pela Lei em 10 (dez) anos, contrário ao prazo de 5 (cinco) anos estabelecido pelo Código Tributário Nacional.
2 Por exemplo, Agravo de Petição nº 38/2004, Rel. Juiz Amaury Rodrigues Pinto Júnior, v.u., p. no DOMS em 13.10.2005, p. 39.
3 A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça consagrou tese de que “o exercício em que o crédito poderia ser constituído” (artigo 173, inciso I, do Código Tributário Nacional) é aquele em que ocorre a homologação tácita, ou seja, o exercício “até o qual” poderia haver a homologação expressa (artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional), no caso de tributos lançados por homologação. É a conhecida tese dos “cinco mais cinco”, que, contudo, não se aplica aos casos em que há apuração feita pelo contribuinte e há pagamento a menor. Seria o caso das reclamações trabalhistas e as contribuições previdenciárias ora em estudo. Por todos, veja-se o AgRg no AgRg no REsp nº 656.492-PR.
4 Compatibilizando as sentenças com o regime contábil de apuração por competência.
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* Advogado do escritório Trigueiro Fontes Advogados
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