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Os créditos dos sócios na Lei de Falências

A nova Lei de Falências, em vigor há quase um ano, trouxe alterações fundamentais na classificação dos créditos dos sócios quando comparada ao decreto-lei de 1945, que cuidou da matéria por cerca de 50 anos. Dentre essas alterações, deve-se destacar duas em especial: a primeira é a criação da classe de créditos subordinados, em que se inserem os créditos dos acionistas (ou sócios) e a segunda, que deriva dessa primeira, consiste no fato de a nova lei não ter feito qualquer distinção entre acionistas controladores e não controladores para fins de tal classificação.

30/5/2006

 

Os créditos dos sócios na Lei de Falências

 

Arthur Bardawil Penteado*

 

A nova Lei de Falências, em vigor há quase um ano, trouxe alterações fundamentais na classificação dos créditos dos sócios quando comparada ao decreto-lei de 1945, que cuidou da matéria por cerca de 50 anos. Dentre essas alterações, deve-se destacar duas em especial: a primeira é a criação da classe de créditos subordinados, em que se inserem os créditos dos acionistas (ou sócios) e a segunda, que deriva dessa primeira, consiste no fato de a nova lei não ter feito qualquer distinção entre acionistas controladores e não controladores para fins de tal classificação.

 

Parece claro que essas duas alterações, introduzidas pela nova Lei de Falências no regime de classificação dos créditos de acionistas, poderão ter conseqüências adversas importantes para diversas instituições, tais como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e fundos de private equity, que, muitas vezes, promovem seus investimentos combinando aquisição de ações e concessão de mútuos, com ou sem garantia real.

 

Com relação à primeira alteração, há que se esclarecer que, muito embora a nova Lei de Falências, em seu artigo 83, tenha mantido a natureza do crédito (tributário, trabalhista, com garantia real e quirografário) como base para a classificação dos mesmos, ela criou uma nova categoria de créditos, qual seja, os créditos subordinados, dentre os quais encontram-se os chamados créditos dos sócios. A titularidade do crédito como elemento de classificação neste último caso denota, claramente, a subjetividade inserida na classificação.

 

Com a criação da nova categoria dos créditos subordinados, alterou-se o regime até então vigente para os créditos dos sócios, os quais, desconsiderados os créditos decorrentes de sua parcela no capital - que continuarão excluídos da massa -, eram tratados, no regime anterior, como quaisquer outros créditos, sem preferências ou distinções.

 

A nova Lei de Falências, com a disciplina dos créditos subordinados, equiparou créditos com garantia real e créditos quirografários, quando de titularidade dos sócios, para os levar, conjuntamente e sem distinções, ao último lugar na ordem de liquidação dos créditos contra a sociedade, depois de todos os demais créditos, inclusive os quirografários.

 

Em suma, a natureza do crédito passa a ser irrelevante quando se trata de crédito de acionista. Essa constatação não deve passar despercebida, haja vista sua influência nas futuras avaliações de novos investimentos.  

 

A nova disciplina dos créditos pode modificar profundamente toda a dinâmica de estrutura de capital das S.A.

 

Com efeito, não há como deixar de notar que a nova disciplina dos créditos subordinados pode modificar profundamente toda a dinâmica de estrutura de capital das sociedades anônimas. A viabilidade da participação minoritária em sociedades anônimas deverá ser objeto de reavaliação por parte de instituições que, no regime anterior, se propunham a fornecer capital tanto via aquisição de ações como via financiamentos.

 

O desestímulo à aquisição de participações minoritárias via aquisição de novas ações parece cristalino, demandando uma alteração legislativa, de caráter urgente, para a correção de tal impropriedade. Uma interpretação literal dos dispositivos legais atualmente vigentes pode ter conseqüências desastrosas sob a perspectiva de novos investimentos.

 

Com relação à segunda alteração, que está intrinsecamente ligada à primeira, deve-se apontar que a nova Lei de Falências não fez, com relação à classificação dos créditos, qualquer distinção dentre as duas espécies de acionistas das sociedades anônimas, isto é, não os distinguiu entre acionistas controladores e não-controladores.

 

Em vista disso, deve-se notar que a penalidade imposta aos acionistas não controladores no sentido de que seus créditos - sejam eles com garantia real ou quirografários - devem ser subordinados a todos os demais créditos, inclusive os quirografários, é injustificada. Parece-nos que, almejando coibir ações potencialmente fraudulentas de acionistas controladores, a nova Lei de Falências acabou por atingir acidentalmente todos os acionistas, sem qualquer distinção.

 

Nesse sentido, a despeito das poucas referências esparsas, foi insuficiente a atenção dada pela nova Lei de Falências à figura do acionista controlador e aos seus poderes e deveres com relação à condução dos negócios sociais.

 

Tal insuficiência de tratamento é de se espantar, uma vez que, desde nossa Lei de Sociedades por Ações de 1976, o papel inequívoco exercido pelos acionistas controladores nas sociedades anônimas tem sido amplamente reconhecido e disciplinado. Com efeito, seus deveres e responsabilidades são estabelecidos com todo o rigor e cuidado pela legislação de 1976, uma vez que tais agentes são, em última instância, um dos mais importantes determinadores da fortuna ou da ruína da empresa.

 

Conclui-se, portanto, que, a partir da entrada em vigor da nova Lei de Falências, a classificação dos créditos dos acionistas das sociedades anônimas sofreu alterações importantes, algumas delas, como visto, desmesuradas. Acreditamos que os dois pontos abordados acima deveriam ser objeto de maiores reflexões no âmbito do atual processo de revisão da nova legislação falimentar e, oxalá, alterados por meio de substitutivos aos projetos de lei atualmente em trâmite na Câmara dos Deputados ou mesmo por meio de projetos de lei específicos.

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Artigo publicado dia 23/5 no jornal valor econômico

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*Advogado do escritório Machado, Meyer, Sendacz e Opice Advogados









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