Os loteamentos ilegais de casas cercadas por muros, sob a popular denominação de "condomínios horizontais", repercutem com bastante força sobre o plano urbanístico do Distrito Federal, apresentando implicações sobre o bem-estar da coletividade em geral.
Na lição de um dos principais juristas do direito urbanístico, José Afonso da Silva1, esse tipo de loteamento cercado por muros juridicamente não existem, posto que "não há legislação que os ampare, constituem uma distorção e uma deformação de duas instituições jurídicas: do aproveitamento condominial do espaço e do loteamento ou do desmembramento. É mais uma técnica de especulação imobiliária, sem as limitações, as obrigações e os ônus que o Direito Urbanístico impõe aos arruadores e loteadores do solo".
Ocorre que não se pode ignorar o surgimento de novos anseios populares, que devem ser acompanhados pelas necessárias atualizações legislativas. Assim, o chamado "condomínio horizontal", que tecnicamente é melhor definido como "loteamento fechado", – nomenclatura que será utilizada a partir daqui – é justamente encarado pelos estudiosos como uma formação híbrida, e ainda não positivada na lei, envolvendo os dois tipos de empreendimentos distintos.
Então, sob o prisma da legalidade, tem-se a possibilidade de aplicação de dois institutos jurídicos a essa necessidade de expansão urbana.
O primeiro deles é tratado pelo direito como parcelamento do solo, visto em detalhes pela lei 6.766/79, e cuja finalidade é dividir uma grande gleba2 em diversos lotes aptos a serem usados para construção. A referida lei divide o parcelamento do solo em duas modalidades: loteamento e desmembramento.
No desmembramento, há divisão dos lotes sem a abertura ou extensão de ruas ou de novos espaços públicos. Já a característica do loteamento envolve dar origem a novas áreas, que são transferidas ao domínio público.
O segundo instituto mencionado trata-se da construção de edifícios em planos horizontais, sob a forma de condomínio, neste caso sendo regido pela lei 4.591/64 (Lei de Condomínios Edilícios e Incorporações).
A figura do condomínio edilício dá-se por meio da viabilização de diversas unidades sobre um mesmo lote, havendo, portanto, ausência de novas áreas públicas como acontece no loteamento, permanecendo as áreas todas privadas - parte exclusiva, e parte em regime comum.
A diferença primordial, portanto, entre condomínio e loteamento, é que neste se adquire somente a área referente ao lote criado, enquanto no condomínio será a fração ideal, que envolve não apenas a área de uso exclusivo, como também a de uso comum, como as ruas e os espaços de lazer.
Dessa forma, no cartório de registro de imóveis, cada um dos tipos de procedimentos – loteamento ou condomínio edilício – gozam de tratamentos diferenciados previstos em suas respectivas legislações.
Entretanto, apesar de juridicamente o loteamento, sob sua forma "fechada", conforme visto acima, não se confundir com a figura do condomínio previsto na lei 4.591/64, no plano fático essas figuras se assemelham, pois ambas exigem a união de interesses, assim como disponibilidade de espaços comuns, proporcionando melhores condições de conforto e segurança.
Assim, não havendo prejuízos ao meio ambiente, ao patrimônio tombado, assim como o acesso a bens públicos essenciais como rios, lagos e praias, resta ao poder público local e federal prover o sistema de regras que permitam sua coexistência segura com outros institutos urbanísticos já criados.
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1 Direito urbanístico brasileiro, 2a ed., Malheiros, p. 313-314
2 A gleba pode ser definida como a área primitiva de um terreno, que ainda não sofreu desmembramento ou loteamento.
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*Thiago Boaventura é advogado e sócio do escritório Boaventura, Coelho, Lyra & Jungmann - Advogados Associados. Especialista em direito imobiliário, com experiência na área de regularização fundiária, tendo sido chefe de assessoria do gabinete da extinta Secretaria de Regularização de Condomínios do DF.