O presente ensaio abordará um dos temas que acometeu a comunidade jurídica de incertezas e insegurança jurídica: a contagem de prazos no âmbito dos Juizados Especiais.
Com o advento do NCPC, houve a modificação da regra da contagem dos prazos processuais, computando-se apenas os dias úteis.
Diante de tal inovação, foram iniciados diversos debates acerca da aplicação desta nova regra nos juizados especiais.
O microssistema composto pelas leis que instituíram os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Juizados Especiais Federais e Juizados da Fazenda Pública, não contém qualquer regra acerca da contagem de prazos processuais, razão pela qual incontroversa era a aplicação do CPC quanto a este tema.
Ocorre que, assim que o CPC/15 passou a viger, diversas Autoridades e Instituições se posicionaram acerca da aplicação ou não da contagem dos prazos em dias úteis para os juizados.
A ministra do STJ e atual corregedora nacional de Justiça, Nancy Andrighi, posicionou-se apoiando a nota técnica 1/16 publicada pelo FONAJE (Fórum Nacional de Juizados Especiais), entendendo que a regra contida no artigo 2191, do NCPC não se aplicaria aos Juizados Especiais, pois atenta aos princípios fundamentais dos processos analisados pelos Juizados Especiais, como a simplicidade, a economia processual e celeridade.
A mencionada nota técnica ainda fez alusão ao fato de que se o legislador entendesse pela aplicação da contagem de prazos em dias úteis nos juizados, teria feito previsão expressa no código como o fez para disciplinar outras matérias.
Todavia, não há como imaginar que esta fora a intenção do legislador. Ao não mencionar a aplicação da regra da contagem de prazo nos juizados especiais, no próprio artigo 219 ou nas regras de disposição transitória, não o fez, pois, por não haver previsão expressa nas leis que disciplinam os juizados, a regra de contagem de prazos observaria o CPC, até mesmo pelo que diz o artigo 2º da lei 9.099/95.
Neste sentido, posicionou-se o ENFAN (Escola de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados) em evento realizado em meados no último ano para discutir o NCPC, publicando o enunciado 45, estabelecendo que "a contagem dos prazos em dias úteis (art. 219 do CPC/15) aplica-se aos sistemas dos juizados especiais".
Também adotou esta posição a Turma de Uniformização de Jurisprudência dos Juizados Especiais do Distrito Federal.
Por fim, o Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE), na jornada XXXIX, tratou de solucionar a polêmica, publicando o Enunciado 165, que estabeleceu que nos Juizados Especiais Cíveis os prazos são contados de forma contínua.
Mesmo com a estabilização da polêmica, são cabíveis são as seguintes indagações: Enunciados sem eficácia normativa são válidos para dirimirem a questão? Não se aplicando a regra de contagem de prazos prevista no CPC/15, aplicar-se-á a regra de contagem prevista em qual diploma processual?
A lei 9.099/95 é clara ao aduzir que as lacunas serão colmatadas sob as diretrizes do CPC. Não cabe aos enunciados informativos suprimirem tal lacuna, ainda que se sustente tal possibilidade com base nos princípios basilares dos juizados especiais.
Há quem sustente que a regra da contagem de prazos incidente sobre os Juizados decorre da lei 9.957/00, responsável pela introdução do procedimento sumaríssimo no Direito do Trabalho. Os argumentos são bastante válidos, pois tal diploma legislativo possui a mesma carga principiológica norteadora da lei que criou os Juizados Especiais.
Enfim, não há consenso acerca do tema e o método utilizado para resolução do impasse não é o formalmente mais adequado (enunciado sem força normativa), porém, ao menos os operadores do Direito terão alguma segurança jurídica para diligente atuação.
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1 Art. 219. Na contagem de prazo em dias, estabelecido por lei ou pelo juiz, computar-se-ão somente os dias úteis.
Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se somente aos prazos processuais.
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*Renan Pires é advogado do escritório Pires & Gonçalves - Advogados Associados.