“Considerações Práticas sobre a Lei Federal n. 11.232, de 22/12/2005”
Silvânia Vieira*
A reforma tem por finalidade simplificar, racionalizar e, fundamentalmente, agilizar o cumprimento do que ficou decidido no processo de conhecimento.
Por força das mudanças ora introduzidas, não existe mais a execução de sentença por meio de um processo autônomo, como até agora ocorreu, com sérios prejuízos para o credor, entre eles, a demora causada pelos intermináveis recursos.
Com a nova lei, uma vez proferida a sentença contra a qual não caiba recurso com efeito suspensivo, terá início não mais um novo processo, mas, sim, uma nova fase processual de cumprimento daquilo que ficou decidido pelo juiz, denominada de fase de cumprimento de sentença.
Aqui, uma importante novidade: a sentença não é mais o ato pelo qual o juiz põe fim ao processo. A sentença, desde que não atacada por recurso com efeito suspensivo, deve ser cumprida como uma conseqüência lógica do processo de conhecimento. Cumprimento esse que pode ser de uma obrigação de fazer ou não fazer (art. 461, CPC), obrigação de entrega de coisa (art. 461-A, CPC), ou, a que agora nos interessa com a nova lei, obrigação de pagar.
Se a determinação do valor da condenação depender apenas de cálculo aritmético, o credor apresentará uma petição instruída com a memória do cálculo discriminado e atualizado nos limites fixados na sentença (art. 475-B).
A lei permite que o juiz se utilize do contador judicial quando a memória de cálculo aparentemente exceder os limites da decisão e, ainda, nos casos de assistência judiciária (art. 475-B, § 3º).
Se a sentença não determinar o valor da condenação, isto é, não for líquida, proceder-se-á à sua liquidação e nesse aspecto a nova lei não trouxe mudanças substanciais.
Exemplo de sentença ilíquida é a que condena ao ressarcimento dos danos sem especificar o valor, ou a que condena a restituir o equivalente à coisa devida, ou, ainda, a que condena em obrigação alternativa.
Uma das formas de se fixar o valor de uma condenação ilíquida é o arbitramento, desde que determinado pela sentença, convencionado pelas partes ou se o exigir a natureza do objeto da liquidação (art. 475-C). Nesse caso, o juiz nomeará um perito de sua confiança para a apresentação de um laudo sobre o qual as partes poderão se manifestar (art. 475-D e p. único).
Poderá ocorrer, também, a liquidação por artigos, se houver necessidade de se alegar e provar algum fato novo para se determinar o valor da condenação (art. 475-E). Nessa hipótese, aplicam-se as regras do procedimento comum, previsto no art. 272, CPC.
Tanto a liquidação por arbitramento quanto a liquidação por artigos, serão julgadas por decisão interlocutória e não mais por sentença (art. 475-H), o que significa que podem ser iniciadas na pendência de recurso (agravo de instrumento), a pedido do credor, processando-se em autos apartados, no juízo de origem.
A nova lei prevê a aplicação de multa de 10% sobre o valor da condenação, se o devedor não pagar, no prazo de 15 dias, o valor fixado na sentença ou na liquidação (art. 475-J).
A lei não determina a partir de quando começará o correr o prazo de 15 dias, mas, pelo que se depreende da leitura do art. 475-J, o prazo começará a correr a partir do dia em que a sentença se tornar exigível (e não do trânsito em julgado).
Como a norma é taxativa o juiz não poderá optar por outra medida e nem diminuir ou aumentar o valor da multa que será, sempre, de 10%.
Há quem entenda que o juiz poderá, no entanto, deixar de aplicar a multa, excepcionalmente, nos casos em que o cumprimento imediato da obrigação pelo devedor seja impossível ou lhe cause gravame excessivo e desproporcional, em decorrência de fato alheio à sua vontade, como por exemplo, na hipótese de que o valor da condenação supere o valor do patrimônio do devedor, ou na hipótese de que os bens estejam indisponíveis em razão de penhora em execução movida por terceiro. O ônus da prova é do devedor.
Também não incidirá a multa se for provida a apelação apresentada pelo devedor, o que é uma decorrência lógica do § 4º, do art. 475-J.
Não havendo pagamento, ocorrerá a penhora de bens, a pedido do credor, que indicará os bens penhoráveis independentemente da ordem prevista no art. 655, CPC.
Se o credor não indicar os bens que pretende ver penhorados, caberá ao oficial de justiça efetuar a penhora e proceder à avaliação, a exemplo do que já ocorre na Justiça do Trabalho.
Outra grande novidade é que, não havendo a nomeação pelo credor, não se transfere ao devedor o direito de nomear bens à penhora por ausência de disposição legal nesse sentido.
No prazo de 15 dias contados da intimação da penhora, o devedor poderá oferecer impugnação, sem efeito suspensivo, nos próprios autos (art. 475-J, § 1º, última parte c/c art. 475-M). Com isso deixam de existir os embargos à execução.
Ao contrário dos embargos que têm natureza jurídica de ação, a impugnação tem natureza de defesa, o que obriga a impugnação específica sob pena de preclusão.
A matéria objeto da impugnação não sofreu alteração e pode ser (art. 475-L): I - falta ou nulidade da citação, se o processo correu à revelia; II - inexigibilidade do título; III - penhora incorreta ou avaliação errônea; IV - ilegitimidade das partes; V - excesso de execução; VI - qualquer causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que superveniente à sentença.
Se o devedor se insurgir contra a indicação de bens feita pelo credor, pensamos que o juiz não está impedido de decidir a controvérsia a favor do devedor, com base no princípio da menor restrição possível, previsto no art. 620, do CPC, determinando que a penhora recaia sobre o bem indicado por este último.
Se a impugnação for apresentada com base em excesso de execução, nela deverá ser indicado, desde logo, o valor que o impugnante entende correto, sob pena de rejeição liminar (art. 475-L, § 2º).
A lei prevê, no entanto, a possibilidade de o juiz atribuir efeito suspensivo à impugnação, desde que relevantes os fundamentos e se o prosseguimento da execução puder causar ao devedor grave dano de difícil e incerta reparação (art. 475-M). Nessa hipótese, se o credor quiser prosseguir na execução, deverá oferecer caução suficiente e idônea, arbitrada pelo juiz e prestada nos próprios autos (art. 475-M, § 1º).
Contra a decisão que deferir ou não o efeito suspensivo cabe, a nosso ver, o agravo de instrumento tendo em vista se tratar de decisão interlocutória suscetível de causar lesão grave ou de difícil reparação.
Contra a decisão que resolver a impugnação, a lei determina que caberá recurso de agravo de instrumento, salvo quando a decisão extinguir a execução, hipótese em que, caberá apelação (art. 475-M, § 3º).
O art. 475-N traz o rol dos títulos executivos judiciais, que é taxativo, já que às partes não é permitida a criação de outros títulos executivos os quais podem ser criados somente por lei.
A lei trouxe uma novidade, introduzindo no rol dos títulos executivos judiciais, os acordos extrajudiciais de qualquer natureza que venham a ser homologados judicialmente (art. 475-N, V). São os casos de composição amigável, sem ação em curso, em que a lei faculta às partes, como medida de celeridade, se valerem do judiciário para homologar tais acordos. Feito isso, o acordo extrajudicial passa a ter força executiva, transmudando-se em titulo executivo judicial.
O art. 475-O trata da execução provisória antes prevista no art. 588, revogado pela nova lei.
O inciso I, do art. 475-O, determina que a execução provisória corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente que ficará obrigado a reparar os danos que o executado vier a sofrer, se reformada a sentença.
A execução ficará sem efeito nos casos em que o acórdão modificar ou anular a sentença objeto da execução. Se isso ocorrer, haverá a restituição das partes ao estado anterior, devendo ser liquidados, por arbitramento, eventuais prejuízos causados (art. 475-O, II).
Se a modificação ou anulação for parcial, somente nesta parte ficará sem efeito a execução (§ 1º, do art. 475-O).
Nos casos previstos no inciso III, do art. 475-O – levantamento de depósito em dinheiro, prática de atos que importem alienação de propriedade; prática de quaisquer atos que possam resultar em grave dano ao executado - o credor deverá prestar, nos próprios autos, caução suficiente e idônea a ser arbitrada pelo juiz.
Finalmente, cumpre observar que a nova lei proíbe a prolação de sentença ilíquida em dois casos em que se aplica o procedimento sumário: 1º) ressarcimento por danos causados em acidente de veículo de via terrestre; 2º) cobrança de seguro relativamente aos danos causados em acidente de veículo. Nestas duas hipóteses, o juiz deverá fixar de plano o valor devido.
Ressalte-se, por último, que o art. 475-R determina que as normas que regem o processo de execução de título extrajudicial serão aplicáveis, no que couber, ao cumprimento da sentença.
A nova lei entra em vigor no dia 23/6/06.
Em linhas gerais, estas são algumas das principais mudanças introduzidas pela Lei Federal n. 11.232/2005, no que tange à “nova execução de sentença”, com a finalidade de agilizar e tornar mais útil e eficaz o trâmite processual.
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*Advogado do escritório Penteado Mendonça Advocacia
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