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Breves Notas sobre Tutela Provisória em matéria recursal no Novo CPC

Cabe ao relator apreciar pedido de tutela provisória em matéria recursal.

8/9/2016

Desde as reformas operadas no CPC de 73, a partir da década de 90, as medidas de urgência em matéria recursal passaram a assumir importância maior. De fato, com a mudança no art. 558, do CPC de 73, por força da lei 9.139/95, reconhecendo a possibilidade de concessão de efeito suspensivo ao recurso de agravo sempre que houvesse perigo de lesão grave e de difícil reparação e fundamento relevante, novas possibilidades surgiram. A par da concessão de efeito suspensivo, propriamente dito, a doutrina passou a falar em efeito ativo (ou suspensivo ativo), quando a mera suspensão da eficácia da decisão recorrida não era suficiente para remediar os males decorrentes da passagem do tempo1. Esse “efeito ativo”, para certa parcela da doutrina, era uma forma de antecipação de tutela, aplicada ao âmbito recursal2. Falava, assim, em antecipação de tutela recursal, expressão que acabou consagrada no antigo art. 527 (com a redação dada pela lei 10.352/01). Mas, se era possível antecipar a tutela recursal, isto seria em tese admissível não só na hipótese de urgência (art. 273, I, CPC/73), mas, também, na de evidência (art. 273, II, CPC/73). Esses, enfim, são apenas alguns dos pontos que vinham sendo objeto de consideração durante a vigência do CPC de 73, a respeito do tema ora em apreço. Há vários outros, como, por exemplo, o da concessão de efeito suspensivo em recurso especial e recurso extraordinário3.

O fato é que o tema, enriquecido pelas discussões havidas no direito anterior, ganha novas nuances no CPC de 2015. Vamos a um rápido e panorâmico exame dos principais aspectos. Em primeiro lugar, observamos que cabe ao relator apreciar pedido de tutela provisória em matéria recursal. É conforme está disposto no art. 932, II, CPC, e não difere, na essência, do que dispunha o art. 527, III, do CPC/73, especificamente em matéria de agravo de instrumento. Vejamos, então, no que consiste esta tutela provisória no âmbito recursal.

Em primeiro lugar, observamos que cabe ao relator apreciar pedido de tutela provisória em matéria recursal. É conforme está disposto no art. 932, II, CPC, e não difere, na essência, do que dispunha o art. 527, III, do CPC/73, especificamente em matéria de agravo de instrumento. Vejamos, então, no que consiste esta tutela provisória no âmbito recursal.

Comecemos lembrando que o art. 995, CPC, após estabelecer que os recursos, como regra, não possuem efeito suspensivo, prevê, no parágrafo único, a possibilidade de o relator suspender a eficácia da decisão por “risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação” e estiver demonstrada a “probabilidade de provimento do recurso”. Ocorre que, como já se percebeu, desde o direito anterior, a simples suspensão da eficácia da decisão recorrida nem sempre é suficiente. De fato, a suspensão é completamente inócua quando se tem a necessidade de alguma providência ativa. Imagine-se que o autor da demanda pleiteia uma medida em caráter liminar, o juiz de primeiro grau a denega e o autor, em seguida, agrava de instrumento. Supondo que ele precise dessa medida com urgência, pleitear efeito suspensivo em nada lhe ajudará. Ele precisará que o Tribunal, antes mesmo de julgar o agravo, lhe antecipe os resultados decorrentes do futuro e eventual provimento do recurso interposto. Em suma, ele precisará que o Tribunal (na pessoa do relator, conforme art. 932, II) lhe conceda uma antecipação da tutela pleiteada via recurso, ou seja, uma antecipação de tutela recursal.

A justificativa para a concessão de tal medida pode ser buscada em várias fontes. A mais imediata é a do mencionado art. 932, II, que fala em concessão de tutela provisória, o que envolve naturalmente a tutela antecipada. Podemos, também, buscar fundamento no princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional4 ou no da isonomia5. Podemos, ainda, explicar através da aplicação sistemática da tutela provisória. Afinal, a tutela provisória projeta efeitos sobre o sistema como um todo, om que se tornou ainda mais evidente à luz do NCPC, que trata da tutela provisória na sua Parte Geral. Não seria coerente permitir a antecipação da tutela final e negar admissibilidade à antecipação de tutela recursal6.

Mas, há outros normativos a serem considerados. Em matéria de apelação, o § 4.º do art.1.012, CPC, após estipular as situações em que a apelação, excepcionalmente, não terá efeito suspensivo, estabelece a possibilidade de esta ser concedida pelo relator se “o apelante demonstrar a probabilidade de provimento do recurso ou se, sendo relevante a fundamentação, houver risco de dano grave ou de difícil reparação”. O dispositivo legal deve ser lido não apenas como abrindo ensejo à concessão de efeito suspensivo, mas, também, quando necessária uma providência ativa, antecipação de tutela recursal.

Os requisitos ali previstos, porém, acabam por evocar outra espécie de tutela provisória prevista no atual CPC, de forma separada da tutela antecipada. Trata-se da tutela da evidência, que é tratada como espécie distinta de tutela provisória satisfativa não urgente. Com efeito, o relator poderá atuar de imediato e monocraticamente nos casos de relevância da fundamentação acompanhada de risco de dano grave ou de difícil reparação (tutela da urgência) ou quando o apelante “demonstrar a probabilidade do provimento do recurso” (tutela da evidência, pois aí não se sujeita à demonstração de periculum in mora)7. Realmente, se a tutela provisória repercute no sistema como um todo, isto pode se dar não apenas na sua vertente da tutela de urgência, mas, também, na tutela da evidência do art. 311, nas hipóteses ali compendiadas, sendo certo que, em uma delas o sistema autoriza o relator até mesmo a dar provimento ao recurso, o que, à primeira vista, tornaria despicienda a tutela da evidência8.

Além desses dispositivos é de se notar que o art. 1.019, I, ao tratar do agravo de instrumento, fala na possibilidade de concessão de antecipação de tutela recursal9. Embora o texto ali só se refira à tutela antecipada recursal, a leitura sistemática do Diploma Legal em questão nos leva a concluir pela possibilidade de concessão de tutela da evidência, quando este for o caso.

Finalmente, o § 1.º, do art. 1.026, tratando da possibilidade de o juiz suspender a eficácia da decisão objeto de embargos de declaração, também repete os mesmos termos empregados no § 4.º, do art. 1.012, já mencionado acima. Mais uma vez, a repetição da palavra probabilidade desvinculada da urgência sugere o cabimento da tutela da evidência10.

Em suma, devemos ter presente que a tutela provisória não tem aplicabilidade apenas no decorrer do procedimento em primeiro grau, mas é norma geral aplicável ao sistema processual, motivo pelo qual se torna irrecusável a sua utilização no âmbito recursal.
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1 Ver, por todos, Eduardo Talamini, A Nova Disciplina do Agravo e os Princípios Constitucionais do Processo, RePro 80, out.dez./1995.

2 Veja-se, por exemplo, William dos Santos Ferreira, Breves Reflexões Acerca da Tutela Antecipada no Âmbito Recursal, in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos, coord. Eduardo Pellegrini de Arruda Alvim, Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: RT, 2000, p. 654-693; e Roberto Armelin, Notas sobre a antecipação de tutela em segundo grau de jurisdição, in Aspectos Polêmicos da Antecipação de Tutela, coord. Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: RT, 1997, p. 431-454, especialmente p. 450.

3 Que envolvia interessante discussão sobre a competência para a concessão da medida cautelar para a obtenção do efeito suspensivo, tema que gerou as Súmulas 634 e 635, STF.

4 Como já falava Eduardo Talamini ao defender a concessão de efeito ativo ao agravo de instrumento, ou a incoação de mandado de segurança para esse propósito (A Nova Disciplina do Agravo e os Princípios Constitucionais do Processo, RePro 80, out.dez./1995). Com efeito, não reconhecer a possibilidade de concessão urgente de providência ativa significaria relegar o processo à inutilidade, contrariando a efetividade inerente à garantia da inafastabilidade do controle jurisdicional.

5 É como diz Sandro Gilbert Martins, em comentário ao art. 995, no Código de Processo Civil Comentado, coord. José Sebastião Fagundes Cunha, São Paulo: RT, 2016, p. 1.360.

6 William dos Santos Ferreira já havia desenvolvido esse argumento ao tratar da possibilidade de antecipação de tutela recursal, ainda na vigência do Código anterior (Breves Reflexões Acerca da Tutela Antecipada no Âmbito Recursal, in Aspectos Polêmicos e Atuais dos Recursos, coord. Eduardo Pellegrini de Arruda Alvim, Nelson Nery Jr. e Teresa Arruda Alvim Wambier, São Paulo: RT, 2000, p. 654-693, especialmente p. 669/670).

7 Essa é a leitura que faz, por exemplo, André Vasconcelos Roque (“Uma tutela nada evidente: a tutela da evidência recursal”, publicado no site Jota em 21.12.2015).

8 Referimo-nos ao inciso V, do art. 932, que apresenta parcial correspondência com hipótese prevista no art. 311, como muito bem observou André Vasconcelos Roque no mencionado artigo “Uma tutela nada evidente: a tutela da evidência recursal”.

9 A esse respeito, ver também nota 19 ao art. 1.019 dos Comentários ao Código de Processo Civil, de Nelson Nery Jr. e Rosa Maria de Andrade Nery, São Paulo: RT, 2015.

10 Também admitindo a tutela de urgência, inclusive antecipatória, e tutela da evidência no âmbito recursal, ver Teresa Arruda Alvim Wambier, Maria Lucia Lins Conceição, Leonardo Ferres da Silva Ribeiro e Rogerio Licastro Torres de Mello, em nota ao art. 995, nos Primeiros Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo: RT, 2.ª ed., 2016.
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*Carlos Augusto de Assis é membro do Grupo de Tutelas Provisórias do CEAPRO - Centro de Estudos Avançados de Processo.


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