É difícil dizer se o ministro da Saúde, o engenheiro Ricardo Barros, não conseguiu ainda se acertar na pasta porque não é do ramo ou porque está mal assessorado. Suas aparições na mídia, até com razoável destaque, têm sido motivadas por ideias, intenções, interpretações, percepções e projetos que, não raro, estão distantes da realidade do país. As duas últimas, a de que o cidadão imagina doenças e a possível liberação de um plano de saúde popular pela ANS, foram simplesmente torpedeadas por especialistas. E com justa razão, diga-se de passagem.
Dia desses, baseado em percepções totalmente equivocadas, o ministro Barros afirmou que a maioria dos pacientes procura atendimento na rede pública de saúde apenas porque “imagina” estar doente. Para ele, o brasileiro somente acha que teve bom atendimento médico se este lhe pedir exames ou prescrever medicamentos. “É cultura do brasileiro”, afirmou o ministro. Em sua avaliação, este "hábito" estaria gerando gastos desnecessários ao SUS. Diante de tal afirmação, é possível inferir que o ministro foi vítima de um lapso de memória, pois é inadmissível que ele não saiba que quem pede exames laboratoriais e de imagens e prescreve remédios é o médico e não o paciente. E o médico somente toma estas atitudes se houver indícios ou evidências que justifiquem a necessidade. Não foi por outro motivo que representantes de entidades médicas vieram a público contestar o comentário infeliz do ministro.
Depois dessa, o ministro Barros veio com outra, anunciou que a ANS poderá liberar uma nova modalidade de plano de saúde, de menor preço, com restrições de serviços e atendimento se comparado aos que atualmente são oferecidos no mercado. De acordo com o ministro, este “novo” plano de saúde poderia aliviar a demanda que hoje pressiona o atendimento do SUS. Impossível acreditar nesta ideia! Será que o ministro esquece em que níveis anda o percentual de desemprego no país? E o da inflação? Ninguém abandonou o “seu” plano de saúde e hoje recorre ao SUS por livre e espontânea vontade, mas sim porque foi obrigado, empurrado por uma situação difícil. O ministro tem obrigação de considerar este cenário antes de propor um projeto absurdo e totalmente fora do contexto. Será que ele não foi notificado, ao menos por sua assessoria, que nos últimos 12 meses os planos de saúde perderam nada menos do que 1,5 milhão de clientes? As entidades de proteção ao consumidor cumprem o seu papel ao afirmar que irão à Justiça se esta ideia descabida for levada adiante.
Ao invés de criticar o brasileiro que procura o SUS ou, então, propor um plano de saúde privado para afastá-lo do SUS, o ministro da Saúde tem a obrigação de buscar caminhos para fortalecer o SUS, para que este possa prestar atendimento de qualidade a todos os cidadãos que forem procurá-lo por qualquer razão de saúde. Jamais, sob qualquer circunstância, o ministro da Saúde deve esquecer que o cidadão que procura o SUS é igual ao que possui um plano privado de saúde, ou seja, é contribuinte e tem direitos assegurados pela CF.
Nunca é demais lembrar que o esgotamento do SUS, que passa pela falta de recursos e problemas graves de gestão, não começou hoje, é histórico. Governos entraram, governos saíram e nada, absolutamente nada de eficaz foi feito para reverter este quadro. A solução para este problema, que é indiscutivelmente grave, não está em responsabilizar o cidadão e nem jogá-lo no colo da iniciativa privada com um produto de péssima qualidade, mas sim em fortalecer o SUS, com investimentos, fiscalização séria e rigorosa e punição efetiva para todos aqueles responsáveis por possíveis desvios. O brasileiro não merece o tratamento que recebe do Estado e nem da iniciativa privada, sobretudo no que tange à saúde.
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