Dados produzidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) constatam uma realidade já conhecida pela maioria dos advogados: a justiça brasileira acontece mesmo é no primeiro grau de jurisdição. É ali o segmento mais sobrecarregado do Poder Judiciário.
O relatório informa que dos quase 100 milhões de processos que tramitaram no Judiciário brasileiro no ano de 2014, quase 92 milhões encontravam-se no primeiro grau, o que corresponde a 92% do total. Desse montante, cerca de 71 milhões de processos concentravam-se no primeiro grau da Justiça Estadual, o que revela onde realmente está o grande gargalo da coisa.
No segundo grau a situação é menos complicada. Em 2014, tramitaram cerca de 6,4 milhões de processos em segundo grau, dos quais quase 4 milhões correram no segundo grau da Justiça dos Estados.
Já a carga de trabalho (que representa a soma dos novos casos ao volume de processos já existentes) é mais ou menos a seguinte: cada magistrado de primeiro grau tem em suas mãos 6.442 processos e os de segundo grau 3.252, isto computando-se todo o Judiciário. Contando-se apenas a Justiça dos Estados, o quadro se agrava, os juízes de primeiro grau têm carga de trabalho de 7.398 processos e os de segundo grau 2.784.
Em resumo, o que isto mostra? Mostra aquilo que o título deste artigo sugere: a verdadeira justiça acontece mesmo é no primeiro grau de jurisdição.
Se de um lado está a incrível carga de trabalho suportada pelos juízes de primeiro grau, de outro está o incansável trabalho dos advogados que militam, essencialmente, nas primeiras instâncias forenses. Esse contingente de guerreiros é a mola que impulsiona todo o sistema. É das mãos desses insólitos combatentes que gira a pena que assina as petições iniciais que tornam reais os gritos dos excluídos, permitindo-os acreditar na existência de uma justiça acessível e possível. Não fossem os aguerridos advogados, dispostos a confrontar direitos e ideias, a sociedade certamente teria de encontrar outro modo de assegurar a paz social no momento de aplicar as leis. Certamente não resultaria em algo melhor, no máximo o mesmo.
Não seria ousado dizer que os advogados que atuam no primeiro grau de jurisdição representam o tecido mais externo, a epiderme judicial da sociedade. Reveste a camada mais exposta, renovando-a e protegendo-a constantemente.
Muitos advogados dedicados ao primeiro grau de jurisdição nem mesmo conhecem o Tribunal de Justiça e, possivelmente, não tiveram um processo sequer tramitando em qualquer palácio de justiça. E provavelmente nem o queiram ter. Não por descaso, desinteresse ou temor reverencial, mas por uma razão muito mais simples e genuína: aptidão e escolha de atuação. Nasceram para isto e é isto que querem fazer. Dedicaram-se, dia após dia, a compreender a difícil tarefa do que é atuar no primeiro grau de jurisdição, peticionando, com o olhar na lei e na jurisprudência, e contribuindo na realização de complexas audiências onde o que se busca é a verdade real dos fatos para dar ao juiz o adequado esteio à formulação da boa sentença. É ali que as coisas acontecem, nascem e terminam, onde a maior parte dos processos, como se viu, sequer chegará ao segundo grau, quiçá aos tribunais superiores.
Esses ilustres advogados de primeiro grau são o que se pode chamar de alicerce social. Merecem todo o respeito e reverência, tanto da sociedade quanto da justiça.
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