A partir de março de 2016, passaram os estudantes e operadores do Direito a contar com novo regramento para disciplinar o Processo Civil, qual seja, a Lei Federal 13.105/15 que instituiu o novo Código de Processo Civil. De uma forma direta ou indireta, o referido instrumento acaba sendo utilizado ainda que supletivamente às demais disposições específicas, tais como a Consolidação das Leis Trabalhista e o Processo Eleitoral.
Da análise da motivação do PL 166, proposto pelo Senador José Sarney em junho de 2010, ressai hialino a intenção do legislador. Trata-se da simplificação dos procedimentos e a efetiva prestação jurisdicional em menor tempo possível, fazendo, finalmente valer a previsão contida no art. 5º, LXXVIII da Constituição da República.
Contudo, após 5 (cinco) anos, vez datar o projeto de Lei no Senado Federal (PL de 166 de 2010) que culminou com o novo Código de Processo Civil de 2010, o que se vê é, de fato, a efetiva perda da oportunidade de se fazerem mudanças substanciais nas conduções processuais, visando, inclusive, a concreta entrega da prestação jurisdicional aos jurisdicionados em um tempo razoável.
É bem verdade que na nova redação se fizeram presentes alguns avanços interessantes sendo, muitos deles já adotados no âmbito juslaboral, tais como o incentivo à composição amigável para pôr fim às demandas judiciais e a utilização do BACENJUD para consultar e, também, afetar patrimônio (neste caso, dinheiro) dos devedores, possibilitando o posterior cumprimento da sentença.
Na contramão da mens legis, ficaram a alteração da contagem dos prazos processuais que, de acordo com o disposto no art. 219 agora se farão apenas em dias úteis, além das disposições que vedam o que vem sendo chamado de ‘decisão surpresa’, ou seja, o juiz não poderá decidir uma questão sem que seja oportunizado às partes se manifestarem (art. 10º do NCPC) ainda que seja matéria passível de ser decidida de ofício.
É de bom alvitre salientar que a celeuma decorrente do advento do novo CPC na rotina dos Tribunais brasileiros ainda precisa de certo tempo para que se faça visível e possa, inclusive, ser debatida (porque não combatida?), seja no tocante à sua aplicabilidade, seja com relação à sua efetividade, tal qual já ocorrido com as diversas alterações legislativas havidas ao longo do tempo, apresentando importante destaque para as próprias reformas pontuais ocorridas no antigo Código de Processo Civil, p.ex. a alteração trazida com a criação do instituto da repercussão geral através da Lei Federal 11.418/06.
Nesse diapasão, a Justiça do Trabalho, amplamente conhecida pela sua celeridade e efetividade, bem como pela sua efetiva e constante atuação disciplinando procedimentos com intuito de atualizar seu regramento básico (de 1943), se apressou para regulamentar a aplicação subsidiária das novas regras processuais civilistas.
Tal se deu através das edições das Instruções Normativas de números 39 e 40 pelo Tribunal Superior do Trabalho nos quais restou determinado, muitas vezes de forma expressa e taxativa, quais seriam os dispositivos aplicáveis ao processo do trabalho, trazendo novamente à lume a discussão da utilização supletiva do direito processual comum.
Vale destacar que o Tribunal Máximo Especializado cuidou de apontar a adoção de normas de Direito comum não disciplinadas pelo processo do Trabalho, tais como amicus curiae, ação rescisória, reclamação, tutelas provisórias, remessa necessária, cumprimento de sentença relacionado à obrigação de fazer, responsabilidade patrimonial, além de algumas disposições relacionadas à execução não disciplinadas expressamente pela CLT.
Também pretendeu o conspícuo Tribunal afastar a utilização de procedimentos e normas que estariam, a princípio, em colisão com outras normas celetistas e/ou princípios norteadores do direito do trabalho, tais como alteração de competência territorial, contagem de prazos processuais apenas em dias úteis, prazos para marcação de audiências (intervalos entre elas), adiamento de audiência (possibilidades), distribuição do ônus da prova.
Embora despiciendo, imperioso frisar que a própria norma celetista prevê, em seus arts. 769 e 889, em quais circunstâncias poderá a norma processual comum ser utilizada de forma subsidiárias às normas especificas constantes na CLT.
Depreende-se de uma perfunctória análise das aludidas disposições, afastadas as teses doutrinárias que classificam as lacunas do Direito (que, para Maria Helena Diniz seria em normativas, ontológicas e axiológicas), tem-se que para a utilização supletiva da norma comum, imperiosa será a (1) omissão da CLT, além da (2) compatibilização do regramento a ser utilizado com os princípios informadores do direito material e processual do trabalho.
E neste caminhar, não há como se adotar a utilização das normas processuais comum apenas observando o que fora disciplinado pelo novo Código de processo Civil em seu art. 15, "na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente".
Talvez até mesmo pela pressão manifesta para sua utilização no âmbito da Justiça do Trabalho, adoção esta inclusive expressa tal qual alhures citado, sua adoção como ferramenta subsidiária tem colecionado opositores fervorosos, tais como o Juiz Federal Jorge Luiz Souto Maior que chega, inclusive, a questionar a real motivação da reforma legislativa processual.
De acordo com o mencionado Magistrado, a reforma processual se iniciou com a instalação de uma Comissão de Juristas encabeçada pelo atual ministro Luiz Fux em 2009, se inserindo tal debate no contexto da reforma do judiciário, recomendada e financiada pelo Banco Mundial (a partir de 1994) que teve avanços importantes com as alterações constitucionais havidas em 2004.
Ele afirma de maneira categórica que a reforma do Judiciário proposta teria como principal finalidade a de impedir que o Direito, os juristas e os juízes constituíssem obstáculos à imposição da lógica de mercado neoliberal e, para ratificar seu entendimento, cita documentos técnicos do referido Banco Mundial.
O mencionado Juiz ainda tece duras críticas à tentativa de aproximar o Direito Processual Civil ao Direito Processual do Trabalho declarando, de início, sua impossibilidade vez que o direito material que é tutelado na Justiça do Trabalho se difere, e muito, daqueles resguardados pelo direito civil e, portanto, tutelados pela Justiça Comum.
Neste sentido, ele destaca que "o processo é instrumento de efetivação do direito material e se o direito material ao qual o processo civil está voltado é o direito civil, com uma lógica pretensamente liberal, é óbvio que o processo civil reflete esse sentimento". Para ele, "estudar o processo do trabalho a partir dessa raiz (liberal) é desconsiderar a própria razão de afastar o direito do trabalho do direito civil, negando vida concreta aos direitos trabalhistas" que, no entendimento do citado Magistrado, é eminentemente social.
Fazem coro com o multicitado Magistrado os doutrinadores Wagner Giglio, Cristóvão Piragibe Tostes Malta e Trueba Urbina que defendem veementemente a independência do Processo do Trabalho exatamente pelas suas particularidades, dentre elas a hipossuficiência de uma das partes (empregado) e a desnecessidade de o estado tutelar os direitos da outra parte (empregador que podem ser auto tutelados.
Por fim, tem-se que deste breve panorama das inovações trazidas pelo novo Código de Processo Civil e suas implicações ao processo do Trabalho, ressai evidente ser prematura qualquer conclusão, seja pela sua adoção supletiva, seja pela sua inadequação ao processo de trabalho. Assunto a seguir de perto em 2016....
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*Mariana Machado Pedroso é coordenadora da área trabalhista do escritório Chenut Oliveira Santiago Sociedade de Advogados.