O problema envolvendo a questão previdenciária não data de hoje e não é uma situação restrita ao Brasil ou a países subdesenvolvidos. Grandes potências, como os EUA, têm ou já tiveram que enfrentar essas questões. O problema é que como invariavelmente a solução passa pelo aumento da idade para se aposentar, governantes e políticos vão fazendo pequenos ajustes ao longo dos anos, de modo a manchar pouco sua imagem com seu eleitorado.
Enfim, a homeopatia política parece doer mais que uma alopatia sugerida. E bem sabemos que no Brasil, passados alguns anos sem corrupção e resolvidas algumas questões de infraestrutura básica, poderíamos dar cabo ao problema da previdência sem grandes ajustes, fatores e planos previdenciários.
Mas no que consistia o pacote de discussão que se arrasta pelo menos desde o governo FHC? Vamos passar rapidamente pelos principais pontos, dando-lhe uma ideia das pretensões, quando apresentadas pelo então presidente Luiz Inácio.
-Paridade: equiparar benefícios de reajustes salariais para servidores da ativa e aposentados;
-Integralidade: recompor a regra de aposentadoria com proventos integrais para os servidores que estão na ativa;
-Taxação dos inativos: sem dúvida era o ponto mais polêmico da reforma, prevendo a incidência de Imposto de Renda para parte do grupo que hoje é isento da cobrança nas aposentadorias, de acordo com o teto;
-Novas regras para aposentadoria: estender a idade para aposentadoria, incidindo um fator de redução percentual para cada ano de antecipação de quem decidisse antecipar o fim da vida laboral;
-Estipulação de teto único: estabelecimento de um teto único de remuneração, sobre o qual poderiam ser acrescidos valores oriundos dos fundos de pensão;
-Redução das pensões: dependentes dos aposentados ficariam restritos a 70% do benefício do segurado.
Para 2016, temos mais um capítulo dessa história, incidindo sobre dois pontos que mudarão as regras de idade na aposentadoria, mudanças que são vistas como prioridade para o Governo. A primeira delas estabelecerá uma idade mínima obrigatória para que a pessoa possa se aposentar. A outra mudança é deixar móvel o fator 85/95.
Em apartada síntese, o fator 85/95 é uma equação criada em junho de 2015, que leva em conta a idade e o tempo de contribuição, sendo 85 o fator da mulher e 95 o do homem. Ou seja, uma mulher com 55 anos e 30 de contribuição pode se aposentar; para o homem o parâmetro seria de 60 anos e 35 de contribuição.
Mas o que muda? Tornando o fator móvel, o governo tem liberdade para adaptá-lo à medida em que a expectativa de vida do brasileiro aumenta, reduzindo o impacto que a previdência sofre (a pessoa passa mais de 20 anos aposentada, pesando para os cofres) com a ampliação da idade de aposentadoria.
De acordo com a regra, em 2026 o fator estará em 90/100. No meu caso, homem, se eu estivesse apto ao processo de aposentadoria, estaríamos falando de 65 anos e 35 de contribuição. Será que estou certo? Não fico absolutamente confortável para analisar a tecnicidade da norma, mas tenho dois pontos de vista relevantes sobre o assunto.
Do ponto de vista leigo médico, tenho a impressão de que doenças como Alzheimer podem ter seu desencadeamento a partir de uma redução na atividade intelectual, muitas vezes oriunda do processo de aposentação. NÃO É UMA QUESTÃO COMPROVADA e nem o único fator. Muito ainda há que ser estudado mas pode haver uma relação que me inclinaria a dizer: pode fazer sentido para a saúde manter o cidadão na ativa, laborando com toda a sua experiência.
Quem sabe para o futuro não seja criada uma regra de compensação para que as pessoas com mais de 60 anos exerçam suas atividades por pelo menos 4 dias na semana, ou 6 horas diárias. É a hipótese da hipótese, mas é uma.
Sob outro ponto de vista, agora com mais tecnicidade, amparado pelo jocoso nome que tomou a PEC da Bengala, a Emenda Constitucional 88, temos agora parte de nossos servidores podendo atuar no serviço público até os 75 anos. Uma pena, por exemplo, que tenhamos perdido no STF tão brilhantes ministros, como Sepúlveda Pertence. Mas o recado é claro: com 70 anos, não há senilidade ou enfermidade para o trabalho. Pelo contrário, são poços de sabedoria a serviço do Estado.
Enfim. Ainda viveremos muito sem ter estabilidade de planos de aposentadoria até que algum governante se disponha a uma mudança definitiva. Mas fato é que enquanto não mudarmos nosso posicionamento a respeito de obrigações cívicas, múnus público e corresponsabilidade, ficará difícil aceitar as mudanças propostas. E há uma razão maior que justifica nossa falta de propósito: o Estado não nos ampara com tudo aquilo que deveríamos ter de um estado com nossa carga tributária. Mas isso é outra discussão.
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*Leonardo Pereira é diretor acadêmico do IOB Concursos. Advogado graduado pela PUC de Minas Gerais, possui pós-graduação em Direito Público e em Direito Privado, ambas pelo Instituto Metodista Isabela Hendrix. Mestre em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos.