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Quando um lobby não funciona.... são necessários dois lobbys

Lei 9.514/97, art. 27, § 5º: a impossibilidade de serem exigidas outras garantias quando houver alienação fiduciária de bem imóvel. Tentativa de alteração por meio do PL 6.525/13.

24/11/2015

Como toda moeda tem dois lados, o mesmo ocorre com a lei 9.514/97.

Enquanto que de um lado ela pode significar um avanço do ordenamento, viabilizando novas relações negociais e - por que não -, uma maior estabilidade jurídica, de outro lado a lei representa uma ferramenta célere e eficiente para as instituições financeiras, no caso de eventual inadimplemento de operações de crédito, uma vez que prescinde da busca do Poder Judiciário para se fazer valer das garantias imobiliárias constituídas, bastando um rápido procedimento extrajudicial ou para a venda do bem, ou ainda para a consolidação da propriedade em prol do credor.

Essa lei é fruto de um verdadeiro lobby feito pelas instituições financeiras junto ao Congresso Nacional.

Todavia, a referida lei possui um dispositivo que não é a elas tão favorável. Nos termos de seu parágrafo 5º, do art. 27, é obrigatório que esse procedimento extrajudicial tenha como foco, ou melhor, que ele se limite, única e exclusivamente, ao bem imóvel alienado em garantia para a satisfação da obrigação quando ocorrer mora.

E onde estaria o prejuízo das instituições financeiras?

Duas são as situações: independentemente do montante que venha a ser atribuído ao bem, seja em leilão extrajudicial, ou ainda na consolidação da propriedade, haverá a extinção da obrigação.

Ou seja, em uma dívida de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) que tenha um bem que, por mais que seu valor fosse inicialmente superior a tal montante, no momento da consolidação equivalha a apenas 10% desse valor, haverá a extinção da obrigação, não podendo o credor buscar a diferença por meio de qualquer outro tipo de cobrança.

A segunda situação, mais comum nessa esfera negocial, consiste na constituição de outros tipos de garantia concomitantemente com a da alienação fiduciária de bem imóvel, para assegurar uma mesma obrigação.

Nessa situação, por mais que as outras garantias possam até mesmo ter uma maior liquidez – o que é o que mais agrada as instituições financeiras -, é imperativo que a satisfação da obrigação esteja vinculada ao próprio bem imóvel, sendo, nessa linha, até mesmo abusiva a constituição de outras garantias.

Exemplo dessas situações, que por vezes desagradam as instituições financeiras, vem ocorrendo dentro do Poder Judiciário nacional, com demandas que visam a consignação do pagamento da obrigação por meio do próprio bem imóvel alienado em garantia.

Nesse sentido, podem ser citados os processos nº 1325-36.2015.8.10.0129 e nº 1326-21.2015.8.10.0129 em trâmite no Poder Judiciário do MA, onde foi deferida liminar obstando a exigibilidade de outras garantias quando da consignação do bem objeto da alienação fiduciária.

Até aqui, estar-se-ia cumprindo a própria lei.

Só que as instituições financeiras “contra-atacam”. A partir de um novo lobby no Congresso, elas tentam alterar o referido dispositivo – e retirar esse imperativo do sistema -, como se observa pelo PL 6.525/13, que tramita perante a Câmara dos Deputados.

No relatório desse projeto, há afirmação expressa de que, atualmente, não é possível cumular a execução de outras garantias, no caso de se ter constituído em garantia alienação fiduciária de bens imóveis1.

E o que fazer frente a isso tudo?

Além de acompanhar de forma bem prudente esse PL – a fim de se verificar a pertinência dos motivos ensejadores dessa mudança -, deve-se respeitar o comando do dispositivo em questão e, no caso de não haver o cumprimento voluntário da obrigação, a satisfação desta estará limitada ao próprio bem alienado em garantia fiduciária.

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1 "... Para efeitos deste artigo, vejamos apenas a alienação fiduciária em garantia de imóveis. Originalmente criada pela Lei no 9.514, de 1997, para lastrear financiamentos imobiliários, esta garantia passou, com a Lei no 10.931, de 2004, a ser largamente utilizada em negociações empresariais em geral, muito por proteger o credor dos efeitos da recuperação judicial e falência do devedor. Ocorre que, ao estender esta garantia para obrigações em geral, o legislador não cuidou de excetuar para tais casos a regra do artigo 27, parágrafo 5o, da Lei no 9.514, de 1997, que estabelece que, declarada a inadimplência e executada a garantia, se no segundo leilão, o maior lance oferecido pelo imóvel não for igual ou superior ao valor do saldo devedor da dívida, considerar-se-á ela extinta. Ora, diferentemente do financiamento imobiliário, cuja dívida é atrelada ao bem imóvel financiado, nas operações empresariais isso não acontece. Muitas vezes é feita uma composição de garantias que, conjuntamente, lastreiam o total do débito.Imaginemos o caso de uma empresa que toma um empréstimo bancário e, em garantia, constitui 30% do valor da dívida com direitos creditórios (cedidos fiduciariamente), 20% em equipamentos industriais (alienados fiduciariamente) e 50% em imóvel (alienado fiduciariamente). Se ocorrer uma inadimplência e o credor optar por executar primeiro a alienação fiduciária do imóvel (que representa apenas 50% do débito), pela regra do artigo 27, parágrafo 5o, o devedor poderá ver sua dívida declarada extinta indevidamente. Teríamos, nesta situação, o enriquecimento ilícito do devedor.Para negócios diversos ao financiamento imobiliário, deve ser permitido ao credor executar cumulativamente as demais garantias. Há, portanto, imediata necessidade de aperfeiçoar esta falha legislativa...” grifo nosso

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*Márcio Casado é advogado da banca Márcio Casado & Advogados.

 

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