Sim, o Brasil deve abolir o financiamento privado de campanhas eleitorais e adotar exclusivamente o financiamento público.
A questão é que o financiamento privado de campanhas eleitorais perpetua o processo de transformação de poder econômico em poder político, além de cultivar a cultura do patrimonialismo no Brasil – em que há uma confusão entre o público e o privado no exercício das funções do Estado.
Entremeada na burocracia administrativa, não há como negar que a corrupção encontra o seu gene no financiamento privado de campanhas, fenômeno que se caracteriza como uma espécie de investimento para as sociedades empresariais. Eleitos por meio de financiamento privado, os políticos carregam, no mínimo, uma dívida moral em relação aos seus patrocinadores e, frequentemente, atuam para recompensar o investimento que lhes foi confiado.
Esta recompensa aos financiadores ocorre por intermédio de diferentes artifícios, muitos deles ilícitos, como a concessão de facilidades pouco republicanas para a conquista de contratos com a Administração Pública ou por meio da aprovação de normas jurídicas favoráveis a seus financiadores e desfavoráveis a seus concorrentes.
Não é difícil concluir que nenhuma sociedade empresarial é naturalmente altruísta a ponto de doar recursos a um candidato por mero apoio ideológico ou por compatibilidade de ideais. As sociedades empresariais têm como propósito principal a busca do lucro, o que, por si só, indica o objetivo maior do financiamento privado de campanhas políticas.
O financiamento exclusivamente público, por sua vez, visa a afastar esta prática, fazendo com que todos os candidatos e partidos dispendam quantias proporcionalmente equânimes em suas campanhas. Isso diminui o risco de que os candidatos sejam capturados pelo poder econômico de sociedades empresariais, purificando o sistema eleitoral de modo a trazer maior legitimidade democrática.
Sem dúvidas, a implementação do financiamento público possui alguns importantes desafios. O maior deles será encontrar uma fórmula ótima para a proporção de subsídio das diferentes campanhas. Ao mesmo tempo em que o repasse de recursos não pode servir como meio para evitar que novos candidatos e partidos surjam no cenário nacional, também é necessário que haja uma proporcionalidade justa entre a representatividade de um partido político e o montante recebido para o financiamento da campanha.
Outro desafio encontra-se na fiscalização dessas campanhas, que deve ser eficiente para evitar que, na prática, impere a regra do caixa-dois. Ou seja, para além de proibir legalmente o financiamento privado de campanhas, deve ser assegurado o enforcement desta norma, para que as campanhas não continuem a ser informalmente financiadas por sociedades empresariais.
O financiamento público de campanhas depende de um sistema rigoroso de controle e de absoluta transparência, de modo a permitir que qualquer cidadão ou órgão de controle encontre a respectiva fonte de custeio de cada despesa. Do mesmo modo, é necessário recrudescer as penalidades eleitorais àqueles que utilizarem recursos privados ilicitamente.
Em síntese, a reforma política deve incluir o financiamento público como método exclusivo de custeio das campanhas porque somente neste cenário é que se poderá prover a necessária independência do poder político em relação ao poder financeiro. Igualmente, a partir de uma fórmula justa de distribuição dos recursos públicos para financiamento das campanhas, o aspecto econômico não será mais determinante para a ascensão de um político, o que conferirá maior isonomia aos cidadãos e garantirá o efetivo exercício das liberdades políticas.
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