Um dos segredos do sucesso da vida empresarial consiste na manutenção de uma boa relação entre os sócios que conjuntamente se esforçam para o desenvolvimento dos interesses comuns da sociedade.
Entretanto, momentos de crise, sejam eles impulsionados por fatores econômicos externos e alheios ao controle da empresa ou, simplesmente, em razão da inerência do risco negocial, podem afetar essa boa relação entre os sócios, causando conflitos e nefastas decorrências para a empresa.
A quebra da harmonia societária, a rigor, leva à resolução da sociedade, que pode ocorrer pela via judicial, por arbitragem, ou, ainda, através de decisões internas da sociedade, tomadas pela maioria dos sócios.
Enquanto a primeira ou segunda vias acarretam todos os ônus de um processo, a terceira é a que permite uma solução mais abreviada e que oferece maior segurança jurídica, até porque, caso não seja cumprida, facilitará seu conhecimento pelo Poder Judiciário ou por um Painel Arbitral, caso assim esteja acertado pelas partes.
É cediço que em organizações societárias regidas e organizadas por bons instrumentos sociais, determinadas deliberações servem para agilizar e resolver problemas internos das empresas, evitando a necessidade de outros meios jurídicos, na maioria das vezes, morosos e complexos.
No entanto, não é a solução contratual que tem apresentando maior índice de utilização nos casos de desacordos societários, dado que grande parte dos instrumentos que regem as sociedades são silentes quanto a estas questões. Na prática, contratos de constituição ou alteração de sociedades, que deveriam ser elaborados por advogados, acabam sendo objeto de confecção por profissionais de outras áreas do conhecimento, que se aventuram na lavratura de instrumentos padronizados, como se coubessem e servissem para todos as espécies de negócios ou sócios.
Neste diapasão, a possibilidade de deliberação majoritária para exclusão extrajudicial de sócio, quando um ou mais sócios estiverem colocando em risco a continuidade da empresa, em decorrência de ato de inquestionável gravidade, apresenta-se como um bom exemplo de solução que se perfaz mediante alteração do contrato social.
Para operacionar essa exclusão há necessidade de previsão contratual, bem como a prévia convocação de todos os sócios, por edital ou por outro meio, para comparecimento em assembleia ou reunião específica, para deliberar acerca da expulsão. O não atendimento a estes requisitos viola o direito de defesa do sócio que será desagregado da sociedade. Resulta, assim, nesta oportunidade, na chance de defesa do sócio acusado, como tentativa de permanecer na empresa.
Ainda, seguindo os formalismos necessários, a assembleia ou reunião deverá ser presidida e secretariada por sócios escolhidos entre os presentes, na forma que dispuser o contrato social, podendo-se nomear secretario "ad hoc". O sócio poderá ser representado por outro sócio, ou por advogado, através de outorga de mandato com especificação dos atos autorizados. Será, também, lavrada em livro próprio a ata assinada pelos membros da mesa e pelos sócios participantes, ressaltando-se necessárias as assinaturas que confiram validade às deliberações. Após, cópia da ata autenticada pela mesa, pelos sócios ou administradores será apresentada a registro, conjuntamente com o instrumento de mandato, se for o caso.
Tais expedientes referem-se, exclusivamente, ao cumprimento de obrigação formal, de acordo com o artigo 1.085 do CC, uma vez que, antes mesmo da instalação de todo o ritual societário (constituição da mesa de trabalhos e etc.), os sócios majoritários já tomaram a decisão de expulsar o minoritário da sociedade.
A exclusão extrajudicial, destarte, apesar do excessivo rigor formal exigido, representa um instituto jurídico capaz de assegurar rapidez e agilidade para pôr fim às disputas instaladas pelo minoritário, oferecendo, principalmente, condições de preservar o fim social da empresa.
Contudo, não é só elevado grau de formalismo que complica e embaraça a elaboração e realização da expulsão extrajudicial, também o exagerado número de entraves perante o registro empresarial (Junta Comercial), dificultam a efetividade e validade do ato societário.
Como exemplo, pode-se mencionar o problema que surge a partir da análise jurídica acerca das quotas do sócio excluído. Ora, que fazer com essas quotas? Isto posto, além da possibilidade legal de sua liquidação, também existe a hipótese da aquisição dessas pela própria sociedade, colocando-as em tesouraria.
Especificamente, "quotas em tesouraria" é um tema que não está dispositivado no Código Civil e sua utilização depende de previsão supletiva das normas da Lei das Sociedades por Ações. Nada impede, todavia, sua implantação, desde que cumprida a referida exigência legal.
No entanto, por falta de acuidade técnica, não é esse o entendimento dos órgãos incumbidos da execução do registro empresarial, os quais costumam impedir a estipulação de "quotas em tesouraria" nas sociedades limitadas, sob o argumento de não haver dispositivo específico naquele tipo societário.
Com o devido respeito, porém, esta análise não é pertinente! Em primeiro lugar, porque refere-se a uma decisão de cunho exclusivo dos sócios, em segundo, por tratar-se de um procedimento há muito aceito e consolidado pelo direito societário e, em terceiro lugar, por ser um meio jurídico habilitado para equacionar uma situação circunstancial da sociedade, promovendo o desenvolvimento da atividade negocial.
De todo modo, já que o presente artigo aponta esta dificuldade na execução do registro societário, aproveita-se para sugerir uma solução, qual seja: que os órgãos de registro (incluindo o DREI) providenciem um estudo acerca do tema "quotas e tesouraria", posicionando-se de acordo com a Lei, doutrina e conforme as necessidades das empresas, em favor de seu desenvolvimento. Enfim, o que se pretende é banir definitivamente os entraves que só majoram o tão penoso "custo Brasil".
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*Armando Luiz Rovai é Doutor em Direito pela Puc/SP. Professor de D. Comercial da Puc/SP e Mackenzie. Ex- Presidente da Jucesp por 4 mandatos. Advogado em São Paulo.