Reforma Agrária: prioridade brasileira
Antônio Ribeiro Romanelli*
Dá-se ao tema – intencionalmente – conotação ideológica – de esquerda radical, como forma de inibir o debate livre e aberto das idéias e dos reais interesses nacionais. A técnica já tão conhecida é a de desqualificar seus defensores. A falta desse debate impede o conhecimento real dos aspectos puramente técnicos, econômicos e sociais.
As inúmeras dificuldades de implantação de uma Reforma Agrária começam por sua própria conceituação. No caso da situação fundiária de nossa Pátria, sugerimos um retrospecto de nossa História. É bom começar com a instituição das Sesmarias em Portugal. O País estava exaurido ao fim da guerra de Leão e Castelo, da qual participaram os proprietários de terras, com seus empregados, deixando ao abandono – no esforço de guerra, suas herdades e, portanto sem a necessária produção agrícola.
O País tinha fome. O Rei Dom Fernando, O Formoso, promulgou a lei de 26 de junho de 1375, cuja motivação foi a seguinte: "Todos os que tiverem herdades próprias, emprazadas, aforadas, ou por qualquer outro título, que sobre as mesmas lhes dê direito, sejam constrangidos a lavrá-las e semeá-las. Se por algum motivo legítimo não puderem lavrar todas, lavrem a parte que lhes parecer poder comodamente lavrar, a bem vistas e determinação dos que sobre este objeto tiverem intendência; e as mais façam-nas aproveitar por outrem pelo modo que lhes parecer mais vantajoso, de modo que TODAS VENHAM A SER APROVEITADAS".
Vê-se, que o espírito da lei era fazer com que todas as terras agrícolas fossem aproveitadas. Era o sistema das SESMARIAS. Assim, o sistema das sesmarias nos vem de Portugal, com uma diferença: em Portugal, foram adotadas como sistema legal, tendo como objetivo a ocupação efetiva das terras agrícolas, mas visando seu aproveitamento ótimo em termos de produção e de produtividade.
No Brasil, foram introduzidas após a "descoberta", também com o intuito de ocupação efetiva, mas visando a exteriorização do domínio da Coroa Portuguesa. Esse regime, tornado efetivo por várias Cartas Régias, se concretizava mediante concessões de grandes partidas de terras outorgadas pelos Capitães Gerais das Capitanias Hereditárias àqueles que lhes merecessem especial mercê.
Decreto do Príncipe Regente – posteriormente Imperador Pedro I - datado de 25 de novembro de 1808, estendeu aos estrangeiros residentes no Brasil, o direito de, também, receberem sesmarias. Em 17 de julho de 1822, mediante uma Resolução da Mesa do Desembargo do Rio de Janeiro, foram suspensas as concessões de sesmarias.
O conceito tradicional e arraigado do Direito de Propriedade leva a questão da Reforma Agrária para campo estreito de visão partindo-se de que a Propriedade é apenas um Direito, quando, em verdade, é um Direito/Dever.
Restringe-se esta forma de ver a um conceito da Propriedade, como um fim em si mesma e não como um recurso econômico (escasso e limitado), que deve ser usado, como determina a Constituição, mediante sua função social, o que lhe confere legitimidade.
Procura-se, como forma de distorção, confundir as noções de Reforma Agrária e Colonização, alegando que, antes de expropriar terras de fazendeiros, o Governo deveria usar as terras que lhe pertencem – sejam as devolutas, sejam as que lhe pertençam a qualquer título.
A pretexto de que a desapropriação exige grandes investimentos, governo anterior criou um modelo substitutivo de Reforma Agrária a que se deu o nome de Banco da Terra, pelo qual o Governo compra a terra e a vende, com subsídios, para os pequenos agricultores, através do PRONAF, mas as exigências e o custo do empréstimo, além, de substituir o conceito básico de Reforma Agrária, para adotar um grandioso Negócio Agrário, torna o modelo inviável para a maioria dos trabalhadores rurais e pequenos agricultores.
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*Diretor do Departamento de Direito Civil do
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