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Competição tributária internacional e os paraísos fiscais

Quando o primeiro relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi publicado em 1998, o tema da competição tributária lesiva foi considerado inovador do ponto de vista científico, porém extremamente preocupante para a saúde fiscal dos países. Depois de oito anos da edição do primeiro relatório, e da publicação de novo relatório de recomendações na reunião ministerial de 2000 – além, é claro, da emissão de dois outros relatórios, relativos aos progressos alcançados em 2001 e em 2004 –, pode-se dizer que intensas modificações no cenário do direito tributário internacional começaram a surtir seus primeiros efeitos.

8/2/2006


Competição tributária internacional e os paraísos fiscais


Celso Cláudio de Hildebrand e Grisi Filho*

Quando o primeiro relatório da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) foi publicado em 1998, o tema da competição tributária lesiva foi considerado inovador do ponto de vista científico, porém extremamente preocupante para a saúde fiscal dos países. Depois de oito anos da edição do primeiro relatório, e da publicação de novo relatório de recomendações na reunião ministerial de 2000 – além, é claro, da emissão de dois outros relatórios, relativos aos progressos alcançados em 2001 e em 2004 –, pode-se dizer que intensas modificações no cenário do direito tributário internacional começaram a surtir seus primeiros efeitos.

O principal objetivo dos membros da OCDE, quando tomaram a cabo tal iniciativa, era estabelecer um padrão de regras homogêneas para que os diversos países do globo fossem capazes de competir por investimentos internacionais em bases eqüitativas e justas. Fato esse que por si só encorajaria um ambiente saudável nos negócios internacionais, aumentado seu correspondente fluxo comercial, financeiro, e de pessoas.

Nesse sentido, o relatório de 1998 adotou certos critérios para determinar se dado regime tributário encampado por um país era prejudicial ou não à saúde da economia mundial. O primeiro critério baseia-se na verificação de como a alíquota de imposto sobre a renda se apresenta, isto é, se ela é extremamente baixa ou se há isenção total desse imposto. Outro critério é a observação da concessão de determinado regime fiscal a estrangeiros, eliminada a possibilidade da economia doméstica utilizar-se desse mesmo programa. O terceiro critério é a transparência, assim entendida como a existência de uma legislação societária, fiscal e bancária que não promova o sigilo absoluto das informações dos acionistas, bem como das companhias, no que tange aos seus documentos associativos, contábeis, fiscais e bancários. Por fim, um dos critérios mais interessantes para identificação de um regime fiscal prejudicial ao fluxo internacional dos investimentos é a falta de qualquer método de troca de informações e assistência mútua entre as autoridades dos países.

O relatório de 2000 da OCDE foi mais incisivo, identificando 47 regimes tributários preferenciais no mundo que geravam distorções econômicas, categorizando-os em 9 tipos de indústrias diferentes. Os 9 ramos de negócios que recebiam benesses de diferentes países para instalarem-se em seus territórios eram: (i) seguros, (ii) financiamentos e leasing, (iii) gerentes de fundos de investimento, (iv) bancos, (v) participações societárias, ou os conhecidos holding companies regimes, (vi) centros de distribuição, (vii) centros de serviços, ou os conhecidos outsourcing regimes, (viii) regimes de embarques destinados à exportação, e (ix) atividades variadas.

No que se refere aos paraísos fiscais, a OCDE lançou em seu relatório de 2001 uma lista das principais jurisdições ao redor do globo que agenciavam internacionalmente regimes fiscais para investidores estrangeiros. A lista foi inicialmente composta por 35 jurisdições, das quais a OCDE requereu providências imediatas para eliminação dos fatores que pudessem gerar distorções à economia mundial.

Interessante notar, no entanto, que, como forma de pressionar esses paraísos fiscais a ajustarem-se a uma política fiscal saudável, a OCDE criou um “selo” internacional, chamado de “uncooperative tax havens” (em vernáculo, paraísos fiscais não-cooperativos). O prazo para que tais jurisdições não sejam incluídas na lista de “uncooperative tax havens” esgotou-se em 31 de dezembro de 2005. Resta saber, agora, quais serão os países listados pela Organização e a extensão das correspondentes medidas de retaliação adotadas pela comunidade internacional.
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*Bacharel em Direito pela PUC-SP; LL.M. in International Taxation pela The University of Michigan Law School, Mestre em Direito Internacional pela Faculdade de Direito da USP e advogado em São Paulo e Nova York, é associado do escritório americano Fox Horan & Camerini LLP





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