Para começar vou logo dizendo que não me agrada a expressão: “work-life balance”, ou equilíbrio trabalho-vida. Como se trabalhar fosse incompatível com viver. A pessoa sairia, então, da própria vida, quase como numa experiência extracorpórea, pegaria seu carro e iria para o trabalho. Se bem que, pensando assim, consigo entender porque parece que já me deparei com alguns zumbis por aí.
Como acredito não ser possível dissociar o ser humano da própria vida, vou considerar dentro do conceito “vida” os aspectos profissionais e os aspectos individuais. Por aspectos individuais, incluirei tudo o que não fizer parte exclusivamente do trabalho: família, amigos, casa, saúde, cultura, lazer, religiosidade, dinheiro e cidadania (a ordem é aleatória).
Quando penso em todos esses aspectos ou dimensões da vida de alguém e quando volto para a ideia de equilíbrio, penso logo numa balança com “trabalho” de um lado e todos os outros aspectos individuais do outro. E naturalmente a balança da minha imaginação pende para o lado individual, porque está muito mais pesada desse lado. Se não for assim, terei que concluir que família, amigos, casa, saúde, cultura, lazer, religiosidade, dinheiro e cidadania juntos pesam menos que trabalho. Ou isso ou eu faltei às aulas de física.
Já quando olho ao meu redor e vejo as pessoas no mundo corporativo passando 10, 12 ou 14 horas por dia no trabalho, supondo que durmam pelo menos 6 horas, intuo que elas estão justamente tentando encaixar seus aspectos individuais em um intervalo entre 4 a 8 horas por dia, isso se já não gastaram boa parte desse tempo no trânsito.
Aí eu me pergunto: que equilíbrio é esse? Alguma coisa parece que não vai caber. Ou então vai ter de caber no fim de semana e nas férias. Complicado. Parece desequilibrado para você? Parece para mim também.
Se esta balança trabalho/individualidade não parece funcionar para as pessoas, como é que poderá funcionar para as companhias? Cansamos de ouvir que empresas são feitas de gente, material humano, os chamados talentos. Pois bem, se forem feitas de pessoas desequilibradas, com vidas que privilegiam só um aspecto em detrimento de tantos outros igualmente importantes (a meu ver), será que as empresas não estão também desequilibradas?
Olhe ao seu redor e me diga se não vê algumas pessoas que parecem estar sempre infinitamente ocupadas, que chegam cedo e parecem nunca ir embora, sempre andando apressadas, mal almoçam, não sorriem, certamente você conhece a figura. Toda empresa tem desses tipos. Será que eles nasceram lá nos armários das suas respectivas salas? É possível que seu único relacionamento seja com a tela do computador? Que vida é essa que se encerra entre quatro paredes numa sala de reuniões? O quanto esses indivíduos contribuem de fato com os objetivos da empresa se sua única dimensão parece ser a própria empresa?
Permitir-se o luxo de sair do trabalho – desligar-se de verdade – leva a que enfrentemos nossos desafios diários com uma perspectiva fresca, criativa e muito mais rica e, assim, nossas contribuições profissionais acabam sendo muito mais valiosas. Por isso defendo que as empresas deveriam buscar atrair e reter pessoas interessantes, felizes, realizadas plenamente e com vidas bem equilibradas.
O que eu quero dizer com isso, e aqui está a minha crítica à falta de equilíbrio que tanto se vê por aí, é que vida é um conceito muito amplo. Ela é plural e multifacetada. Tudo aquilo que a compõe contribui para sermos quem somos e nos torna únicos. Dar ao trabalho a sua devida importância, sem exageros, torna o viver muito mais leve e prazeroso. E o trabalhar também.
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*Christina Montenegro Bezerra é diretora no Brasil da Covidien e membro do grupo Jurídico de Saias.