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A reforma tributária e o exemplo do IVA europeu

Um dos temas que vem sendo objeto de discussões acirradas entre aqueles envolvidos na análise da proposta apresentada pelo governo federal de reforma tributária diz respeito à forma de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas operações realizadas entre Estados diferentes, as chamadas operações interestaduais. A pergunta que se faz é a que Estado cabe o imposto: o de origem ou de destino?

16/6/2003

 

A reforma tributária e o exemplo do IVA europeu

 

Gustavo G. de Oliveira*

Um dos temas que vem sendo objeto de discussões acirradas entre aqueles envolvidos na análise da proposta apresentada pelo governo federal de reforma tributária diz respeito à forma de cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas operações realizadas entre Estados diferentes, as chamadas operações interestaduais. A pergunta que se faz é a que Estado cabe o imposto: o de origem ou de destino?

 

No texto da proposta de reforma tributária, que altera dispositivos da Constituição Federal, existe menção expressa de reformulação do artigo 155 da Constituição, inserindo um novo inciso VI que trata especificamente das "operações e prestações interestaduais".

 

Esse novo inciso prevê, em linhas gerais, que a tributação do ICMS nas operações interestaduais seja cobrada pelo Estado de origem, salvo exceções previstas em lei complementar e exclusivamente nas operações de petróleo, incluindo seus derivados, e energia elétrica o imposto caberá integralmente ao Estado de destino.

 

Em um outro dispositivo, traz a previsão da tributação das operações envolvendo gás natural e seus derivados, e lubrificantes e combustíveis não derivados de petróleo, onde o imposto seria repartido entre os Estados de origem e destino, aplicando-se a regra das alíquotas interestaduais. No novo texto, saiu a previsão anterior desse tratamento ser aplicável apenas nas operações entre contribuintes do imposto.

 

De forma resumida, o que se pretende com o texto da reforma é ter como regra geral a cobrança no Estado de origem, com a aplicação das alíquotas interestaduais, sendo a diferença entre essa e a alíquota interna do Estado de destino devida a esse último, com as exceções acima mencionadas.

 

Se o País optasse pelo modelo de tributação no destino, o Estado que sairia como maior prejudicado em termos de arrecadação seria São Paulo, que provavelmente exigiria uma compensação por tal perda.

 

Esse mesmo dilema já foi vivido pelos países que hoje compõem a União Européia, quando tiveram que firmar regras comuns de tributação, tanto em relação às operações internas, realizadas entre os países membros, quanto externas, realizadas com países fora do bloco. Com efeito, esses países, por meio do Conselho das Comunidades Européias, adotaram a Sexta Directiva, em 17 de maio de 1977 (77/388/CEE), a qual teve por objetivo harmonizar as legislações dos Estados membros no que se refere aos impostos sobre o volume de negócios e o sistema comum do imposto sobre valor agregado (IVA).

 

Logo no início da atual redação da Sexta Directiva, nos "Considerandos", já foi relatado que "a determinação do lugar das operações tributárias provocou conflitos de competência entre os Estados membros (...), que, muito embora o lugar das prestações de serviço deva ser fixado, em princípio, no lugar onde o prestador de serviços tem a sede da sua atividade profissional. Convém, no entanto, fixar esse lugar no país do destinatário, designadamente no que se refere a algumas prestações de serviços efetuadas entre sujeitos passivos, cujo custo esteja incluído no preço dos bens".

 

Inicialmente os países da União Européia fixaram como a regra de tributação pelo IVA a cobrança no local de origem. Contudo, para evitar problemas de competência tributária, bem como uma guerra fiscal entre seus membros, foi estabelecido em 1991, por meio da Directiva no 91/680, um regime transitório fixando como regra geral a tributação no Estado de destino. Esse regime transitório foi fruto da constatação de que a regra da tributação na origem,até aquele momento, não vinha satisfazendo os objetivos da União Européia.

 

O princípio que norteou o sistema transitório europeu tem como alicerce a idéia de que quem realmente arca com o ônus financeiro do tributo é o consumidor, ou seja o destinatário do bem ou da prestação de serviço, sendo o imposto devido ao país membro onde esse estiver localizado. Isso se justificaria até para assegurar que aqueles que arcam realmente com o pagamento dos impostos é que deverão ser beneficiados com a sua arrecadação.

 

O regime europeu criado em 1991, para vigorar a partir de 1993 como transitório, parece ter tido o mesmo destino de uma conhecida contribuição "provisória" brasileira, pois perdura até o momento, sem grandes movimentos de alteração. Pelo contrário, o último texto aprovado no Conselho da União Européia sobre a matéria, que trata entre outras coisas de tributação do comércio eletrônico, manteve a aplicação do regime transitório.

 

Semelhanças a parte, devemos reconhecer que o atual sistema brasileiro de tributação, bem como o proposto pelo governo federal, que não são muito diferentes em essência, não atendem alguns objetivos primordiais, tais como a redução das desigualdades regionais, hoje flagrante no Brasil. Sabe-se que as realidades entre Brasil e Europa são um tanto quanto diferentes, mas talvez a experiência européia de tributação no destino, que parece realmente ter se mostrado mais vantajosa a ponto de permanecer vigente após anos de transitoriedade, sendo que o objetivo buscado pelos europeus é a arrecadação o quanto possível distribuída entre seus membros, deve ao menos ser objeto de reflexão por aqueles que no presente momento estão analisando as reformas que se pretendem fazer no nosso País.kicker: A experiência européia de tributação no destino deve ser objeto de reflexão no País.

 

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* Advogado tributarista do escritório Stroeter, Royster & Ohno Advogados (associados a Steel, Hector & Davis LLP)

 

 

 

 

 

 

 

 

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