Testemunha que litiga contra o mesmo empregador em ação com idêntico objeto é suspeita
Juliana Oliveira de Lima Rocha *
A prova testemunhal é uma das mais antigas formas de prova judiciária e no processo do trabalho este tipo de prova continua sendo o principal meio que as partes dispõem para comprovar suas alegações, já que de acordo com o princípio da primazia da realidade uma testemunha pode desconstituir uma prova documental.
As testemunhas têm o dever de reproduzir perante o Juiz a realidade que observaram, mas a fragilidade desse tipo de prova reside exatamente na possibilidade de essa realidade ser alterada em virtude de certas regras de conveniência da própria testemunha ou da parte que a apresentou em Juízo.
O impedimento e a suspeição surgiram para evitar que interesses desse tipo maculem a prova testemunhal sendo mantidas a lealdade e a probidade necessárias. Entre os considerados suspeitos estão incluídos os que têm interesse no litígio. Testemunha que tenha interesse na causa deve ser considerada aquela que de certa forma venha a se beneficiar, caso uma das partes seja vitoriosa na lide.
A origem dos litígios requer exatamente a existência de um conflito de interesses. No processo do trabalho, de uma parte temos o interesse do empregado em ver reconhecidos direitos que entende lhe serem devidos, do outro o interesse do empregador de que aquele pleito seja indeferido. São pedidos diametralmente opostos e que se encontram em conflito, gerando o litígio.
Ora, se o interesse do empregado é o do deferimento do seu pleito contra aquele empregador, resta evidente que ele (empregado) não tem isenção de ânimo para figurar como testemunha em processo com idêntico objeto, pois é claramente verificado que seu interesse se confunde com o da ação em que figura como testemunha.
Apesar de parecer óbvio, esse entendimento não vinha sendo compartilhado pela maioria dos tribunais, pois, com a edição da Súmula nº 357, de 19.12.1997, que não considera suspeita testemunha apenas por estar litigando contra o mesmo empregador, o entendimento era de que mesmo movendo ação com idêntico objeto a testemunha não seria suspeita.
Tal posicionamento feria diretamente o artigo 414, § 1º, do Código de Processo Civil, o qual dispõe que, sendo provado ou confessado os fatos que comprovam a suspeição ou o impedimento da testemunha, o Juiz dispensará seu depoimento ou, em sendo estritamente necessário, tomará o depoimento da testemunha como informante, atribuindo-lhe o valor que merecer.
Ocorre que não é o fato de estar litigando contra o mesmo empregador que torna a testemunha suspeita, mas o fato de ter interesse no litígio.
É claro que as testemunhas ao comparecerem em Juízo têm o dever de falar a verdade, mas pensar que isso é o que em regra acontece é utopia. Muitas vezes não é que a testemunha esteja mentindo, já que contra o falso testemunho existe pena prevista em lei, mas é o fato de que ela, ali, perante o Juízo, não está isenta de emoções e de interesses, o que torna seu testemunho frágil.
Não estamos tratando aqui, também, de troca de favores. Defendemos a tese de que a testemunha que tem seu próprio processo contra a empresa reclamada tem sim interesse no resultado da demanda em que participa como testemunha, não porque está trocando favores com a outra parte reclamante, mas sim porque é de seu interesse o reconhecimento do direito contra a empresa, mesmo que em ação estranha a sua.
Com o novo entendimento apresentado pelo Tribunal Superior do Trabalho, mais especificamente por sua Quarta Turma, fica a impressão de que estamos trilhando um caminho para que os casos sejam analisados com base em provas que representem melhor a realidade dos fatos, provas que serão produzidas com isenção de ânimo, visando unicamente a realização da Justiça.
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*Advogada do escritório Trigueiro Fontes Advogados