Das provas obtidas ilicitamente
- Porque a interpretação e a aplicação da lei não são feitas em conformidade ao interesse social?
Salvador Ceglia Neto*
Isso, obviamente se aplica inclusive ao Poder Judiciário, principal destinatário das críticas destas considerações.
Nos dias presentes, à conta das transformações sociais que se almeja para o País, diversas instituições estão sendo postas em xeque. Os Tribunais da República e dos Estados às voltas com o controle externo da magistratura; a advocacia acusada de desejar a procrastinação interminável dos processos judiciais e de ter elementos que se constituem importantes elos do crime organizado; o Ministério Público acusado de invadir a esfera de competência da Polícia e de obter provas ilicitamente, desperdiçando o dinheiro público.
Situada a crise em linhas gerais e pouco precisas, nas dimensões em que interessam para a breve análise deste artigo, no qual nos deteremos na questão atinente à obtenção ilícita de provas e as conseqüências trazidas por este procedimento, na interpretação que invariavelmente vem sendo dada pelos nossos Tribunais, em nome de um suposto “devido processo legal” e a também supostos “direitos e garantias individuais”, cláusulas pétreas também inseridas na Constituição da República.
Como este artigo é destinado majoritariamente a leigos tentaremos explicitar de forma simplificada os vícios éticos e contrários ao interesse social, que a nosso ver, embasam as referidas decisões.
Esclareça-se, de pronto, que cláusulas pétreas são aquelas consideradas imutáveis por meio de emendas constitucionais, só podendo sê-lo através da convocação de nova Assembléia Nacional Constituinte.
Saber distinguir que cláusulas são ou não pétreas é discussão interminável, importando interpretá-las harmonicamente, umas com as outras.
Para se avaliar a gravidade e o alcance do problema de que estamos tratando, basta lembrar que um Presidente da República e um séqüito de ministros e outros auxiliares deixaram de ser criminalmente condenados em razão das provas contra eles coligidas terem sido obtidas ilicitamente, razão pela qual o processo foi considerado nulo.
As justificativas para a desconsideração das referidas provas (ilícitas, porém verdadeiras, diga-se) são no sentido de “educar” os agentes públicos ou particulares que as obtiveram (muitas vezes com o patrocínio de recursos públicos) para que, nas próximas investigações, ajam dentro da lei e, de preferência, com prévia autorização judicial.
Ou seja, deixam-se culpados impunes, e qual a professora, na pré-escola, os Tribunais procuram ensinar, docemente, os agentes públicos a fazerem o seu dever de casa.
E o interesse público? Às favas, os interesses público e social, já que o devido processo legal deve ser obedecido e os agentes públicos levemente admoestados.
Só que o tecido social brasileiro está gravemente esgarçado; o crime organizado está fortemente infiltrado nas diversas camadas do poder e a sociedade, acuada, ainda se vê às voltas com demagógicos “movimentos antiterror”, que fazem frente a não menos demagógicos movimentos que distorcem o problema e as suas soluções.
Isso, em última análise, propicía, se não favorece, a que agentes públicos inescrupulosos façam acordos inconfessáveis com quem deveriam investigar, fiscalizar e propiciar meios a que fossem punidos, de forma a que, fingindo investigar com vigor e rigor, cometam, voluntariamente, arbitrariedades e ilegalidades com o fim de nulificar o processo e propiciar a absolvição ou a impunidade de culpados devidamente defendidos por advogados competentes.
O que deveria fazer a Justiça, então?
Agindo assim os Tribunais estariam exercendo o poder que lhes é delegado pelo POVO, em nome do interesse social, e não, muitas vezes, de supostas garantias de direitos individuais e interesses excusos e inconfessáveis, escondidos atrás de um enigmático, devido processo legal.
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* do escritório Ceglia Neto, Advogados
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