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Comarcas da Bahia: Ibitiara

O dano com a desativação dessa Comarca repercute sobre outro município, Seabra.

26/2/2014

Ibitiara é um município, localizado na chapada diamantina, com extensão territorial aproximada de 2.500 quilômetros quadrados e população de 16.700 habitantes; Novo Horizonte é outro município, na mesma região, com extensão territorial de 609 quilômetros quadrados, população de 11.800 habitantes e que cresce economicamente com a produção de pedras preciosas; eles dois se juntam para formar a Comarca denominada de Ibitiara, que remonta ao século XIX, 1873, quando foi criada a Pretoria no antigo lugar Arraial de Remédios; em 13/5/62 foi instalada a unidade judiciária, através da junção dos dois municípios.

A lei de Organização Judiciária do Estado da Bahia enumera os requisitos para instalação das comarcas, mas, da mesma forma que as exigências para criação de municípios, não são obedecidos. Dentre as condições inserem-se extensão territorial, edifício do fórum, casas para residências de juiz, promotor e defensor público, cadeia pública em condições de segurança e higiene, instalação para alojamento de Destacamento da Polícia Militar e cargos criados mediante lei. Necessário ainda aforamento anual de 300 feitos de jurisdição contenciosa, colégio eleitoral, além de receita tributária.

Ibitiara preenche todos os requisitos e com vantagens inexistentes em muitas comarcas da Bahia, a exemplo do edifício do fórum em ótimas condições, casa para juiz, quase 2.000 processos, 13 servidores concursados que continuam na cidade onde residem. Essa enumeração torna-se despicienda, porquanto a unidade judiciária foi criada há mais de 50 anos e duas leis de organização judiciária que se seguiram, 1979 e 2007, mantiveram a Comarca; ademais, sempre funcionou dentro do padrão do Tribunal de Justiça, apesar de não contar com juiz, promotor e defensor, anormalidades que se tornaram comuns nas comarcas do interior.

Em outubro de 2011, o Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia, atendendo às ponderações da então Presidente da Corte resolveu desativar 50 comarcas, em torno de 20% do total, sob o fundamento de que não havia número mínimo de feitos ajuizados anualmente, além de insignificante arrecadação de custas judiciais. O argumento maior para a paralisação dos cartórios dos feitos cíveis e criminais nas sedes dessas 50 comarcas sustentou-se na baixa arrecadação, como se essa motivação fosse suficiente para sacrificar o direito de milhares de moradores.

A admitir-se essa justificativa para fechar comarcas, na área do Executivo, corre-se o perigo do rebaixamento de municípios em distritos.

Mas mesmo que se servisse desse fundamento para lacrar o fórum de uma unidade judiciária, Ibitiara não poderia ser desativada, porque a drástica medida não causou economia alguma para o Judiciário, mas, pelo contrário, provocou danos ao Estado e ao cidadão, porquanto as despesas continuam as mesmas, acrescidas pela falta de serviço e de arrecadação na Comarca. É que os servidores em número de 13, quantidade incomum nas comarcas da Bahia, continuam residindo no local para onde foram nomeados, em Ibitiara, enquanto os processos foram conduzidos para outro destino: Seabra.

A decisão de desativação das 50 comarcas foi tão apressada e desprovida de maiores estudos que, um mês depois, em novembro do mesmo ano, o Pleno do Tribunal reuniu mais uma vez, para reativar 07 das 50 unidades desativadas: Gentio do Ouro, Maraú, Palmeiras, Planalto, Santa Luzia, Tremendal e Capela do Alto Alegre, restando 43 comarcas desativadas.

Aliás, não se entende porque criar um município desprovido do juiz, representante do Poder Judiciário, apesar de a lei de Organização Judiciária da Bahia estabelecer que "a cada Município corresponde uma Comarca"; tem prefeito, Poder Executivo, vereadores, Poder Legislativo, mas falta o magistrado. A incompreensão torna-se mais acirrada quando se sabe que foram agregados dois municípios, instalados os Poderes Executivo e Legislativo em cada um deles, mas o Judiciário aproveita aos dois; ainda assim, de repente, suspende-se exatamente o Poder que ocupava espaço de um município para fornecer os serviços judiciários aos dois; permanece o Executivo e o Legislativo em cada um e o Judiciário, que satisfazia aos dois, é defenestrado.

Mas o dano com a desativação dessa Comarca repercute sobre outro município, Seabra; essa unidade judiciária funciona precariamente, porque sofre com a lotação de apenas dois juizes, quando deveria ter quatro, 27 servidores, quando deveria contar com 60, e isso desde o ano de 2007, conforme estabelece a lei de Organização Judiciária; e mais: Seabra tem um forum acanhado, mau conservado, população de mais de 41 mil habitantes, acrescido agora de mais 28.500 cidadãos, correspondentes aos municípios da Comarca desativada. Toda essa gente, das Comarcas de Seabra e de Ibitiara, não tem sequer um defensor público. Os dois juizes são responsáveis pela movimentação de 8.500 processos, acrescidos agora de quase dois mil, além de eventuais substituições.

Registre-se que o número ideal para cada magistrado situa-se em 1.000 processos.

A situação da Comarca de Seabra, que já funcionava precariamente, por absoluta falta de infraestrutura, agravou-se com a transferência de quase dois mil processos, que tramitavam nos cartórios dos feitos cíveis e criminais de Ibitiara. Avolumaram-se para os dois juizes outras atribuições, a exemplo da instalação de mais uma zona eleitoral, composta de 77 seções em um fórum que não dispõe de mínima condição para receber essa papelada e atividade do eleitoral. Imagine o sacrifício para os eleitores de Ibitiara e Novo Horizonte, alguns distritos com distância de mais de 100 quilômetros da nova sede eleitoral. A situação torna-se mais dramática quando se sabe que não há transporte regular entre os municípios de Ibitiara, Novo Horizonte e Seabra.

Está um caos o fórum de Seabra e a situação tende a piorar com a aproximação das eleições que serão realizadas se as goteiras do fórum não destruir o material eleitoral.

A população de Ibitiara, de Novo Horizonte e de Seabra sentem-se diminuidas com o descaso do Judiciário para sua cidadania.

Somente esse fato mostra-se suficiente para fazer funcionar a Comarca e a população dos três municípios reclamam das representações políticas ação, pois, do contrário, haverá significativa abstenção nas urnas eleitorais.

A transferência dos cartórios dos feitos cíveis e criminais da Comarca de Ibitiara para Seabra torna-se uma excrescência que a Corregedoria das Comarcas do Interior visualizou e tomou providências imediatas, apresentando, ao Presidente do Tribunal, Projeto de Resolução, através do ofício 82/13, no qual solicita-se a apreciação do Pleno da medida "a fim de que seja, o quanto antes, reativada a Comarca de Ibitiara, voltando a atender às comunidades a ela vinculadas".

E a Comissão Permanente de Reforma Judiciária, Administração e Regimento Interno sentiu o drama e ofereceu, em setembro/13, parecer à Proposta da Corregedoria no sentido de ativar a Comarca de Ibitiara. Referido Projeto de Resolução encontra-se na Presidência, aguardando inclusão na pauta para manifestação do Pleno do Tribunal de Justiça da Bahia, que, certamente, endossará o pedido da Corregedoria, aprovado pela Comissão e evitará o caos que ocorrerá por ocasião das eleições.

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* Antonio Pessoa Cardoso é desembargador aposentado do TJ/BA.

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