Migalhas de Peso

As despesas com depreciação no fluxo de caixa e o Imposto de Renda

A respeito do tema, duas correntes se formaram. A primeira entende que a depreciação é considerada uma despesa que não exige um desembolso de caixa. E a segunda, admitia que as despesas com depreciação inexoravelmente afetam o pagamento de impostos.

29/5/2003

 

As despesas com depreciação no fluxo de caixa e as possíveis conseqüências que afetam o pagamento do Imposto de Renda

Marcelo Rayes*

No presente trabalho, iremos abordar a questão relacionada às despesas de depreciação e sua aplicabilidade no fluxo de caixa da empresa. Ao final, iremos abordar em quais possíveis condições a depreciação pode influir no pagamento dos impostos.

A respeito do tema, duas correntes se formaram. A primeira entende que a depreciação é considerada uma despesa que não exige um desembolso de caixa. Dessa forma, as despesas a título dessa conta não deveriam constar do orçamento de caixa, eis que, somente os pagamentos e recebimentos devem obrigatoriamente constar do respectivo fluxo.

Uma segunda corrente, ao contrário, admitia que as despesas com depreciação inexoravelmente afetam o pagamento de impostos, em razão do tratamento fiscal a ser dado nessa conta, e, por assim, devem constar do orçamento do caixa da empresa.

Em geral, as empresas têm o direito de lançar, a título de encargos, uma parcela do custo incorrido no ativo imobilizado, em face das receitas geradas com esse ativo. A depreciação pode ser definida como a perda de valor de algum ativo em decorrência do uso, da ação do tempo, da obsolescência tecnológica ou mesmo a redução no preço de mercado.

A depreciação (bem como outras despesas que não representam desembolso) possibilita que as empresas não paguem imposto indevido, o que, na medida, acaba reduzindo o lucro tributável. As tabelas abaixo poderão ilustrar, hipoteticamente, como a despesa com depreciação é capaz de reduzir o lucro, atuando como uma não-aplicação de recursos. Vejamos:

Demonstração do Resultado da Empresa X

Vendas $ 100.000

Menos: Devoluções de abatimentos 5.000

Vendas líquidas $ 95.000

Menos: Custo das mercadorias vendidas (CMV) 45.000

Lucro Bruto $ 50.000

Menos: Despesas

Gerais e Administrativas $ 20.000

Juros 4.000

Depreciação 6.000

Total $ 30.000

Lucro líquido antes do IR $ 20.000

Menos: Provisão para o IR (40%) 8.000

Lucro líquido após o IR $ 12.000

------------------

Demonstração do Resultado da Empresa X em Base de Caixa

Vendas Líquidas $ 95.000

Menos: Custo das mercadorias vendidas (CMV) 45.000

Lucro Bruto $ 50.000

Menos: Despesas

Gerais e Administrativas $ 20.000

Juros 4.000

Depreciação 0

Total $ 24.000

Fluxo de caixa antes do IR $ 26.000

Menos: Provisão para o IR (40%) 8.000

Fluxo de caixa provenientes das operações $ 18.000

---------------

O Regulamento do Imposto de Renda, em seu artigo 305 , deu o adequado tratamento fiscal às contas de depreciação. Como conta redutora do imposto a pagar, devem as despesas a esse título ser registradas periodicamente nas contas de custo ou despesa (depreciação encargo do período de apuração que terão como contrapartida contas de registro da depreciação acumulada, classificadas como contas retificadoras do ativo permanente).

A conta de depreciação pode acarretar a redução da base de cálculo do imposto sobre a renda. Como assinala Helfert , sob circunstâncias normais, a depreciação é uma despesa dedutível do imposto, embora seja apenas um ajuste contábil de despesas passadas.

É indiscutível que a conta de depreciação pode reduzir a base de cálculo do imposto de renda. Muito embora a depreciação colhe fatos passados, o fato de se ajustar contabilmente a redução já indica que a empresa deverá (num futuro próximo) desembolsar caixa para reinvestir em seu ativo parmente, pois o desgaste natural do ativo poderá ocasionar problemas de crescimento se não for reposto a tempo.

Uma dúvida ainda paira. Poderá a despesa de depreciação influir no dispêndio de caixa da empresa, acarretando problemas no fluxo de caixa para fins de pagamento de impostos ?

O próprio Helfert assinala de modo positivo. Para ele uma alta despesa de depreciação pode ser preferida pela organização, pois isso acarretará menos dispêndio de caixa para os impostos. Se a depreciação afetar o pagamento dos impostos, deve ela constar do orçamento de caixa.

Outra razão que nos levar a admitir que as contas de depreciação podem ter influência sobre o fluxo de caixa, está evidenciada na depreciação acumulada relativa às propriedades, plantas, e equipamentos contabilizados eis que isso pode sugerir que instalações envelhecidas estão na iminência de ser substituída por outras mais novas e usuais. Assim, um aumento dos saldos do caixa pode ser indício de atraso em um novo investimento e excesso de caixa. Poderá ocorrer algumas variações no fluxo, o que poderá decorrer de problemas de políticas de gestão de estoque ou crédito ao cliente.

Mas a concepção segundo a qual a conta de depreciação pode influenciar no fluxo de caixa da empresa não é pacífica.

Vezes há, e não são raras, que as organizações desprezam esse cálculo entendendo não haver relação unindo a conta de depreciação com o caixa, ou seja, sendo a depreciação uma despesa, ela não pode exigir desembolso como principal razão onde somente os pagamentos e recebimentos devem necessariamente constar do orçamento de caixa. Essa é uma idéia que vai de encontro ao afirmado por Helfert.

Para esse renomado consultor financeiro, "a escolha de métodos de depreciação, é feita facilmente pela provisão dada pela legislação do imposto de renda corrente, que permite o uso do método para a contabilidade e o demonstrativo e outro para o cálculo do imposto de renda. Recorde que isso não era possível para o custeio do estoque. Assim, uma empresa pode desfrutar dos melhores aspectos de ambos os conceitos de depreciação: depreciação mais lenta para informar o lucros mais altos e depreciação mais rápida para os impostos mais baixos".

Como salientado acima, no Brasil, a legislação do imposto de renda só prevê a adequação da taxa de depreciação mais lenta ou mais rápida desde que faça a prova dessa adequação quando vier a adotar uma taxa superior à usualmente admitida nas Instruções Normativas da Secretaria da Receita Federal, mediante laudo do Instituto Nacional de Tecnologia ou de outra entidade oficial de pesquisa científica ou tecnológica (RIR/99, art. 310, §§ 1º e 2º).

Pois bem. Com essas breves colocações já podemos admitir que a depreciação pode influenciar o fluxo de caixa, no momento do pagamento do imposto. Geralmente, as empresas fazem - ou deveriam fazer – um planejamento financeiro onde se procura realizar projeções sobre a previsão de vendas de seus produtos, para o departamento de marketing, investimentos na área industrial. São, no geral, previsões internas e também externas, quando se baseiam nas vendas da empresa e certos indicadores econômicos. É crucial que haja também um planejamento encima do orçamento de caixa, eis que isso possibilita o manejo das necessidades de caixa a curto prazo. Havendo excesso de caixa, poderá haver aplicações a curto prazo. Esse orçamento concede ao administrador uma clara visão da época em que ocorrerão recebimentos e pagamentos previstos num período determinado.

Agora, será que as despesas de depreciação podem de modo direto ter influência no fluxo de caixa da empresa se ela tiver créditos de impostos a recuperar ? Podemos dizer que, nessa hipótese, essa despesas com depreciação não só deixam de ter reflexos no caixa da empresa como também, poderão alargar o aspecto temporal no que toca a recuperação integral do valor do crédito no qual a empresa irá recuperar.

Isso porque, no exemplo que citamos acima, havendo uma depreciação de $ 6.000,00, haverá menos imposto a pagar em razão da dedução. Já no segundo exemplo, não haverá essa conta e, portanto, o quantum que a empresa notadamente apurar deverá ele mesmo ser recolhido a título de imposto. Mas, em ambos os casos, havendo impostos a recuperar, o fluxo de caixa da empresa citada no segundo exemplo só será afetado quando ela vier a "zerar" seu crédito de imposto. Igual tratamento será dado no primeiro exemplo, embora, nesse caso, ocorrerá o alargamento do tempo em razão da utilização da própria utilização da conta de depreciação. Mas é latente que, tanto num caso quanto noutro, o fluxo não irá se alterar de forma alguma, desde que a empresa esteja gozando do seu direito a recuperação do imposto.

No mais, o que estamos afirmando é nada mais do que aconselhar sempre um planejamento tributário, aliado, sempre que possível, ao planejamento financeiro, pela simples razão de que as empresas, ao se debruçarem sobre seus balanços ou sobre seus investimentos, deverão ficar atentas em todos os aspectos que mexam cash flow, pois os reflexos positivos no item "caixa" contribuirão para a empresa melhorar seus investimentos.

Aspectos assim analisados podem também contribuir para uma sensível melhoria no custo de capital empregado e nas decisões empresariais. Por exemplo, na melhoria do caixa, outros possíveis e rentosos investimentos poderão ser feitos, isso sem falar na melhora da liquidez da empresa, pois é sabido que os ativos líquidos da empresa, aqueles que podem ser convertidos em caixa, representam uma segurança imediata contra a inadimplência.

_______________

* do escritório Rayes, Fagundes & Oliveira Ramos Advogados Associados

 

 

 

 

______________

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

ITBI na integralização de bens imóveis e sua importância para o planejamento patrimonial

19/11/2024

Cláusulas restritivas nas doações de imóveis

19/11/2024

Estabilidade dos servidores públicos: O que é e vai ou não acabar?

19/11/2024

Quais cuidados devo observar ao comprar um negócio?

19/11/2024

O SCR - Sistema de Informações de Crédito e a negativação: Diferenciações fundamentais e repercussões no âmbito judicial

20/11/2024