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Resolução 23.396/13 do TSE: limitação do poder investigatório do MP

Após o protestos contra a PEC 37, surge um novo fato jurídico : a resolução do TSE que limita o poder investigatório do MP.

19/1/2014

Ainda se consegue enxergar a poeira deixada na estrada pelos defensores da PEC 37 que, em coro pelas ruas, apresentaram cartão vermelho para aqueles que pretendiam coibir o poder investigativo do Ministério Público. Quando se pensava que a situação já se encontrava consolidada, num repente, surge novo fato jurídico, agora proveniente do Tribunal Superior Eleitoral, que limitou os poderes da polícia e do Ministério Público Eleitoral para instaurar, de ofício, inquérito policial com a finalidade de apurar crimes eleitorais. Pela Resolução 23.396/13 (TSE) o "inquérito policial eleitoral somente será instaurado mediante determinação da Justiça Eleitoral, salvo a hipótese de prisão em flagrante".

Quer dizer, em caso de ocorrência de delitos da lei eleitoral, os delegados e promotores terão que pedir autorização à Justiça Eleitoral para instaurar inquéritos policiais para a correta apuração dos fatos. Há uma inversão nas regras constitucional e processual penal, que pregam exatamente o contrário. Não se pode alegar que o crime eleitoral seja diferenciado de qualquer outro ou que haja alguma recomendação legal que o exclua da regra geral. Mas a incoerência da resolução vai desde sua aplicação restrita às eleições de 2014, circunstância que, por si só, desconfigura a natureza permanente e prevalente da norma até sua revogação, até a obstrução das comportas democráticas asseguradas no regime constitucional brasileiro.

A Constituição Federal, com o espírito voltado para o alargamento das franquias democráticas, estabeleceu as funções do Ministério Público em seu artigo 129 e incisos, norma esta editada pelo poder constituinte originário e em plena vigência. Usa a seguinte expressão no caput: "São funções institucionais do Ministério Público". Trata-se do cumprimento de um dever distribuído a uma Instituição, uma obrigatoriedade de ação, com a consequente autoridade para realizar todos os atos necessários para desempenhar a contento a tarefa determinada. Quando o Poder Público, para a realização de sua missão, outorga poderes a uma instituição, transformando-a em longa manus, confere a ela todos os poderes inerentes para a realização das atribuições, desde o ato de iniciativa até o ato final visando a persecução dos objetivos. Dentre os poderes nomeados, ressaltam-se para a oportunidade, a função de promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei e requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial (incisos I e VIII).

Como absoluto titular da ação penal pública, o MP pode e deve investigar o fato em tese considerado criminoso, para que sejam satisfeitos os dois requisitos do oferecimento da denúncia: prova da existência do crime (materialidade delitiva) e indícios suficientes de autoria. Ora, ao autor da ação deve ser conferida a possibilidade de colher todos os elementos que possam embasar sua exordial (onus probandi incumbit ei qui dicit). E, ninguém melhor para elaborá-la estrategicamente do que o órgão responsável pela coleta investigativa.

O Ministério Público, assim como a Polícia e o próprio Judiciário, é também destinatário da notitia criminis e, qualquer pessoa do povo, na mais abrangente legitimidade, quando se tratar de ação penal pública, poderá provocar a iniciativa do parquet, fornecendo a ele por escrito as informações sobre o fato e autoria, segundo a regra do artigo 27 do CPP.

Tal fato, por si só, faz ver que a intenção do legislador processual foi a de conferir ao cidadão a oportunidade de levar o fato delituoso ao órgão ministerial que irá, de imediato, intentar a competente ação penal, desde que receba todas as informações necessárias para tanto. E o próprio Código Eleitoral, em seu artigo 356 § 2º, confere ao parquet o direito de requisitar diretamente de quaisquer autoridades ou funcionários os esclarecimentos necessários para a elucidação do fato considerado ilícito. Assim, sob este aspecto, os informes do particular substituem o procedimento investigativo policial. Sem falar ainda da Resolução de 2010 que permitia a requisição de inquérito policial pelo Ministério Público e Justiça Eleitoral, salvo as hipóteses de flagrante delito.

Ora, nesta linha de raciocínio e agora focando a Resolução questionada, no caso específico de notitia criminis levada a efeito pelo particular, com os elementos suficientes para poder exercer na esfera penal o jus persequendi in juditio, deverá o representante do Ministério Público agir prontamente e apresentar o libelo acusatório sem qualquer respaldo policial. Com tal estratégia livrar-se-á da desagradável situação imposta pela medida administrativa do Tribunal Eleitoral, que exerce uma opinio delicti confrontante com o texto processual penal. Faz lembrar a lei 4.611/65, embora com certa distância, que introduziu o arbitrário processo judicialiforme, pelo qual o juiz baixava a portaria inaugural da ação penal, fazendo as vezes de acusador e julgador, nos crimes de lesão e homicídio culposos.

Ora, a tendência do processo penal moderno é fazer com que o juiz se distancie com a margem de segurança necessária das investigações que nortearão uma ação penal, a não ser que seja chamado para decretar alguma medida cautelar específica para o caso. Daí que, com urgência, o próprio Tribunal Superior Eleitoral pode rever sua posição em pedido de reconsideração por parte do Procurador Geral da República, pois, caso contrário, inevitável será a ação por inconstitucionalidade perante o Supremo Tribunal Federal.

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* Eudes Quintino de Oliveira Júnior é promotor de Justiça aposentado, mestre em Direito Público, com doutorado e pós-doutorado em Ciências da Saúde. Advogado e reitor da Unorp - Centro Universitário do Norte Paulista.

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